O prefeito eleito Rafael Greca de Macedo (PMN) afirmou que não vai realizar a 35ª edição da Oficina de Música de Curitiba, marcada para o próximo mês de janeiro.
Em entrevista coletiva durante a sua diplomação, na última segunda-feira (21), Greca disse que a área da Saúde é a prioridade em sua gestão e assim o tradicional será cancelamento por falta de dinheiro. “Enquanto a saúde correr riscos não haverá música”, justificou o prefeito. Nesta terça-feira (20), a assessoria do prefeito confirmou que não há dinheiro e o evento está cancelado.
O custo total da Oficina de Música de 2017 estava estipulado em R$ 1,7 milhão. Em razão de um contrato de gestão com a prefeitura, quem organiza é o Instituto Curitiba de Arte e Cultura (ICAC).
Na quarta-feira passada (14), a Secretaria Municipal de Finanças repassou ao ICAC R$ 420 mil para a pré-produção do evento, verba que cobriria o custo de passagens, alimentação, hospedagem dos convidados e parte da estrutura da Oficina.
Faltaria cerca R$ 900 mil, já previstos no orçamento de 2017, para completar o evento.
Para o maestro Osvaldo Colarusso, primeiro regente da Orquestra Sinfônica do Paraná, com o cancelamento “a credibilidade do evento ficará irremediavelmente comprometida”.
O maestro afirma que existe “uma artificial disputa entre saúde e cultura” na justificativa do cancelamento. “Lamento dizer, mas cultura é educação, e educação é também algo prioritário”.
“Jogando para a torcida”
Pós-doutor em administração municipal e professor do mestrado e doutorado em gestão urbana da PUCPR, Denis Alcides Rezende afirma é a justificativa do cancelamento é “bastante inconsistente e questionável, pois a rubrica de saúde o orçamento de 2017 já está definida”.
“Isto é uma tentativa de comoção social e não de gestão pública propriamente dita. Cancelando um programa cultural, ele joga para a torcida dizendo que está investindo na saúde, quando uma boa gestão pede o equilíbrio dos investimentos nas duas áreas. É típico do novo prefeito, que trabalha mais com o lado emocional do que com gestão pública”.
“Isto é uma tentativa de comoção social e não de gestão pública propriamente dita. Cancelando um programa cultural, ele joga para a torcida dizendo que está investindo na saúde, quando uma boa gestão pede o equilíbrio dos investimentos nas duas áreas. É típico do novo prefeito, que trabalha mais com o lado emocional do que com gestão pública”.
Os números da Secretaria Municipal de Saúde (SMS) comprovam. A Lei Orçamentária Anual (LOA) para a saúde municipal de Curitiba em 2017 é de R$1,6 bilhão. De acordo com dados da SMS, o custo diário do SUS Curitiba, incluindo gasto com pessoal e equipamentos, é de R$ 4,3 milhões.
Assim, o valor total da Oficina de Música (R$ 1,7 milhões) corresponderia apenas a nove horas e meia de atendimento de saúde na cidade.
O valor que a prefeitura teria que efetivamente que depositar para realizar o evento (R$ 900 mil) equivaleria a cinco horas de atendimento no SUS Curitiba.
Lei Rouanet
Ontem, o presidente do ICAC, Marino Jr, viajou a Brasília para conversar com o Ministro da Cultura, Roberto Freire (PPS). “Mostrei ao ministro que trata-se de um evento internacional de grande prestigio para a cidade”. Marino diz que não desistiu de tentar realizar a oficina .
Ele diz que há ainda a possibilidade de patrocínio parcial através da Lei Rouanet com empresas estatais do governo de Estado (Compagás e Sanepar) e do banco Itaú que estão autorizados a captar cerca de R$ 300 mil para Oficina. “Até agora não conseguimos sensibilizar as empresas. Mas não vamos desistir até o último segundo”.
Este valor é quase igual ao que o prefeito Rafael Greca conseguiu captar para o lançamento de seu livro “Curitiba - Luz dos Pinhais”. Editado pelo Solar do Rosário e foi produzido por meio da Lei Rouanet . O projeto captou um valor total de R$ 291 mil. O patrocínio veio das empresas Blount International (R$ 112 mil), Roca Sanitários (R$ 30 mil), Peróxidos do Brasil (R$100 mil) e Impextraco (R$ 48 mil).
Músicos dizem estar “de luto”
Veteranos da Oficina de Música lamentam a extinção e destacam o caráter internacional e agregador do evento
- Sandro Moser
Criada em 1983, a Oficina de Música de Curitiba era um dos mais tradicionais eventos musicais de férias do Brasil.
Dividida em duas fases, erudita e popular, no ano passado a Oficina atraiu 1,8 mil alunos, metade de outros estados brasileiros e do exterior.
Músico da Orquestra Sinfônica do Paraná e frequentador da Oficina como aluno e professor há vinte anos, Levy Carvalho de Castro diz que a sensação entre os músicos da cidade é “de luto”.
“A oficina é um patrimônio de Curitiba. Jamais se poderia cogitar sua extinção. Não tem crise que possa justificar, pois o ganho da cidade é muito maior que o gasto”, diz.
Castro ressalta que a oficina era dos poucos eventos “realmente internacionais de Curitiba”, e muitos alunos e professores de diversas partes do mundo que já se programaram para vir, compraram passagens e reservaram hospedagem.
“A presença de alunos e professores movimentava os hotéis e o setor do comércio e dos espetáculos. A oficina tradicionalmente tinha um circuito oficial e um paralelo de shows diários em vários espaços da cidade”, diz o músico. Os concertos da Oficina de Música de 2016 arrecadaram cerca de R$ 150 mil em bilheteria, segundo o Instituto Curitiba de Arte e Cultura (ICAC).
Induzido ao erro
Aluno desde 2003 e professor desde 2012, o bandolinista Daniel Migliavacca ressalta que a Oficina de Música é “fundamental para a minha vida e para a de muitos músicos de Curitiba, pois além dos cursos e concertos diários, serviu como o grande espaço de troca de informações entre artistas”.
“Muitas parcerias e projetos nasceram aqui, durante a oficina. É um período para se atualizar sobre o que as pessoas estão produzindo, além dos concertos que eram muito prestigiados pelo público”.
Para o tubista Levy de Castro, muitos artistas votaram no prefeito Greca, que sempre se disse um “defensor da cultura”. “Mas agora vimos que ele talvez não saiba a diferença entre saúde e cultura”.
“Cada coisa no seu lugar. Ele deve ter sido induzido ao erro, pois não poderia ter feito esta confusão entre coisas tão diferentes e tão importantes”, diz Castro.