A formação original dos Engenheiros do Hawaii se uniu às pressas para abrir um show universitário em 1985. Menos de dois anos depois, o trio ganhava o Disco de Ouro pelas cem mil cópias vendidas de “Longe Demais das Capitais” (1986), seu disco de estreia.
Desde então, os Engenheiros se tornaram uma das bandas mais bem sucedidas do rock nacional. Amada e odiada quase na mesma medida.
Para contar a trajetória da banda, o repórter Alexandre Lucchese, do jornal Zero Hora, de Porto Alegre, escreveu a biografia “Infinita Highway - Uma Carona Com os Engenheiros”.
O livro analisa a primeira fase da banda. O recorte escolhido por Lucchese vai da fundação da banda em meados dos anos 1980 até a segunda metade dos anos 1990, quando a formação clássica dos Engenheiros - com Humberto Gessinger no baixo, Augusto Licks na guitarra e Carlos Maltz na bateria - chegou ao estrelato nacional e se apresentou até na União Soviética.
Ouvindo os próprios músicos, família, amigos, roadies e muitos personagens que cruzaram a estrada da banda, Luchesse consegue traçar o perfil dos Engenheiros do Hawaii. Da leitura, emerge uma banda contraditória e original em relação à maioria das contemporâneos da geração “80” do rock nacional.
Leia abaixo cinco fatos sobre Os Engenheiros do Hawaii que estão narrados no livro de Lucchese:
1) A banda deveria durar apenas uma noite.
O trio original no dia da assinatura do primeiro contrato com a RCA
Humberto Gessinger e Carlos Maltz eram estudantes de arquitetura da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Não eram exatamente amigos, mas descobriram que um tocava guitarra e outro bateria.
As aulas do ano letivo de 1984, por conta de uma greve dos professores, se estenderam até janeiro do ano seguinte.
Para comemorar o fim do período foi organizado um show para os estudantes do curso. Eles resolveram montar a banda. A principio, um quarteto com Marcelo Pitz no baixo e Carlos Stein (da banda Nenhum de Nós) na guitarra.
O nome nasceu da rixa existente entre estudantes de arquitetura e engenharia. Lucchese conta que a ideia era que a banda acabasse no dia seguinte ao show, que aconteceu em 11 de janeiro, mesmo dia da abertura do primeiro Rock in Rio.
Os Engenheiros deveriam ser a banda de abertura, mas acabaram fazendo o show principal. No repertório da estreia, além de algumas canções compostas por Gessinger especialmente para o “concerto”, eles tocaram o jingle do extrato de tomate Elefante, o tema da série Hawaii 5.0 e uma versão ska de “Lady Laura” de Roberto Carlos
Para Lucchese este início despretensioso definiu o que a banda seria nos anos seguintes. “De certa forma, estabeleceu relações de trabalho mais distanciadas, sem muita intimidade afetiva entre os músicos, o que é bem diferente de bandas que nascem de modo mais orgânico, a partir de relações de amizade, se profissionalizando com o passar do tempo”.
Ele analisa, que por outro lado, a postura foi positiva “no sentido de que a música sempre foi a protagonista. Ninguém estava lá para se divertir ao lado de ninguém, mas para defender boas canções diante do público”.
Escute uma faixa do primeiro show dos Engenheiros:
2) Os Engenheiros do Hawaii eram a banda “fora da turma” no circuito do rock de Porto Alegre.
A capa do disco de estreia que vendeu mais de 100 nil cópias.
A ascensão rápida dos Engenheiros - de um show mambembe na faculdade ao disco de ouro e– não foi muito bem digerida pela então forte cena do rock, fossem punks, roqueiros tradicionais ou alternativos.
O livro “Infinita Highway” mostra que a banda colecionava desafetos dentro e fora da cena musical. Em parte, por uma postura tomada como arrogante pela “cena”. Também por não fazer questão de se encaixar em turmas.
Em entrevistas, a banda dizia que não fazia parte do “sindicato do Ocidente”, em referência ao bar onde se encontravam as outras bandas locais como Replicantes, Graforréia Xilarmônica e De Falla, na Porto Alegre dos meio dos anos 1980.
“Os Engenheiros eram outsiders porque não se sentiam representados pela cena punk crescente, que se desvinculava de influências regionais e setentistas, nem tampouco pela MPG (Música Popular Gaúcha), herdeira de uma musicalidade e de um estilo de vida mais hippie”, explica Lucchese.
“Humberto e Carlos não costumavam circular pelos pontos de encontro dessas turmas - preferiam ficar em casa discutindo Camus ou Andy Warhol. Isso fazia deles estranhos no ninho, mas acabou por gerar um identidade própria, única”.
3) Numa era de drogas e excessos no rock nacional, os Engenheiros eram caretas e brincalhões
O dinheiro jorrava frouxo das gravadoras que apostaram no estouro do rock nacional. Com a fartura,são famosas histórias de abusos de drogas por outras bandas daquela cena como Titãs, RPM e Capital Inicial.Os Engenheiros do Hawaii, porém, eram uma banda absolutamente careta.
“Em um cenário em que a maconha era muito comum e a cocaína começava a se popularizar, os Engenheiros sempre se mantiveram sóbrios, o que realmente não era muito comum.
Mas também tinham sua próprio droga: eram viciados no trabalho. Escapavam da realidade tocando nos shows, de quinta a domingo, e nas gravações de disco, de segunda a quarta”.
Nas viagens pelo país, a diversão do trio era comprar discos raros em sebos.Gessinger ficou famosos por quase nunca sair de seu quarto de hotel durante as turnês.
A banda também pegou fama de infantil por conta das diversas brincadeiras e sacanagens que os integrantes faziam entre si e com a equipe, principalmente Maltz e Gessinger.
“Pois é, talvez eles fossem emocionalmente frágeis, passando essa imagem de infantis, mas foram bastante responsáveis diante dos fãs, procurando fazer discos e shows que não se repetiam, sem cair no comodismo ou na irresponsabilidade.
4) Chamados de “direitistas” pelos desafetos , a banda fez campanha de graça para Leonel Brizola
Arte sobre a foto do Papa João Paulo II tomando mate dada por Brizola aos Engenheiros
Quando surgiram e começaram a incomodar, os Engenheiros foram tachados (entre outros insultos) de ser uma “banda de direita”, por seus desafetos na cena do rock.
Um pouco pelo uso da imagem de um homem com vestido no e do grupo Tradição, Família e Propriedade, ao lado de outras imagens no encarte “dadaísta” do disco “A Revolta dos Dândis”, de 1988.
A postura de “fora da turma” e algumas declarações iconoclastas de Gessinger em entrevistas criticando as “tribos” do rock também reforçavam esta imagem.
Para Lucchese, a imagem é injusta. “Eles eram todos politizados, mas não faziam música panfletária, que assumisse determinada posição de maneira intransigente. Usavam a música para questões mais transcendentes”.
“E também questionam figuras como Fidel e Pinochet. Por outro lado, não tinham uma visão estreita é bem definida, o que também contribui para a perenidade do trabalho”.
Luchesse também destaca que a banda também apoiou a abertamente a candidatura de Leonel Brizola a presidência da República em 1989, tocando de graça em vários “showmícios” do político gaúcho, ícone da esquerda brasileira.
Brizola cedeu a foto do papa João Paulo II tomando chimarrão usada na capa do disco “O Papa é Pop” , o mais vendido dos Engenheiros. A banda também deve a Brizola a inclusão da versão da música “Era Um Garoto Que Como Eu Amava os Beatles e os Rolling Stones”, dos Incríveis, usada para preencher um dos atrasos do candidato em um comício em Betim, Minas Gerais.
A partir de então, a canção se tornou um dos maiores sucessos da banda.
5) A personalidade de Humberto Gessinger faz a banda ser a mais amada e mais odiada de sua geração.
A formação clássica : Licks (de camisa listrada) , Maltz e Gessinger (de <i>mullets</i> e bigode)
Quem escuta as letras românticas e a poesia cheia de clichês e frases feitas de Humberto Gessinger não imagina o grande número de polêmicas que a banda teve que enfrentar.
As saídas de Marcelo Pitz, o baixista original, e Licks, o guitarrista da fase áurea, são desavenças sobre as quais até hoje os dois egressos da banda preferem não falar.
Luchesse destaca que a personalidade de Gessinger é “ a de um cara difícil de entender, e que também não faz questão de se explicar”.
Segundo o biógrafo, o líder dos Engenheiros “parece se importar mais com seu próximo show ou disco do que com o aquilo estão pensando dele. Para músicos e críticos do Rio ou de São Paulo nos anos 1980 ou 1990, era difícil compreender como aquela banda fazia sucesso, pois não imaginavam como e por que trio viajava e circulava por todo o país. Humberto e Carlos também não faziam questão de se fazerem amigos e de se explicarem para essas pessoas do meio artístico e jornalístico”.
Segundo Lucchese, por este comportamento eles “eram os caras de fora, os estrangeiros, presas fáceis de bater pois não tinham relação de companheirismo com o meio”.
“Se você escrevesse uma crítica injusta, não daria de cara no outro dia com eles em um restaurante ou festa. Esse desinteresse dos rapazes por formar amizades também era encarado como arrogância, deixando tudo mais difícil”.
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