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O francês Patrick Charadeau tem uma longa relação com o Brasil. Desde 1979, vem ao país pelo menos uma vez ao ano para ministrar cursos e palestras. Já deu aulas na USP, na UFRJ e na UFMG. Aluno de Roland Barthes e Michel Foulcault, é professor de Ciências da Linguagem na Universidade Paris 13, onde dirige o Centro de Análise de Discurso.

Charadeau está lançando dois livros na 19ª Bienal de São Paulo: "Dicionário de análise do discurso" e "Discurso político" (Editora Contexto). Participará de um debate no sábado, no Salão de Idéias, e de outros dois no domingo, no Espaço Universitário. No hotel onde está hospedado em São Paulo, Charadeau conversou com o GLOBO ONLINE sobre campanhas eleitorais e o papel da encenação na política.

GLOBO ONLINE: Diz-se que hoje os políticos são vendidos como produtos, com slogans e jingles como qualquer mercadoria. Ainda é possível fazer uma distinção entre o discurso político e o publicitário?

PATRICK CHARADEAU: Sim. Os dois são discursos de influência, que pretendem convencer as pessoas a que se dirigem. Mas fazem isso de maneira diferente. A publicidade se baseia na sedução, que é baseada em apelos afetivos. O discurso político também seduz, mas ele tem uma outra estratégia de convencimento que é a persuasão, baseada em argumentos racionais. Os políticos não podem prescindir disso, enquanto para a publicidade o argumento racional é irrelevante. Enquanto os publicitários se dirigem ao consumidor, o político fala para o cidadão. Claro que a política também é feita com apelos afetivos, mas ela não se reduz a isso.

Mas à medida que as campanhas se tornam mais dispendiosas, e os políticos são treinados por profissionais do marketing, qual o espaço que resta para o discurso político?

CHARADEAU: Não se pode pensar que uma campanha eleitoral é vencida apenas graças ao dinheiro, ou à boa publicidade. É muito difícil dizer qual é a causa direta de uma eleição, como é difícil dizer a causa de qualquer fato social. Os candidatos tentam corresponder às expectativas do eleitor. Pode ser que um slogan consiga isso, mas pode ser também que as qualidades do próprio candidato sejam o fator mais importante.

A filosofia nasce com uma crítica ao discurso político, que é o ataque de Platão aos sofistas. Para ele, a fala dos sofistas não tinha valor porque não estava preocupada com a verdade, e sim com o convencimento. O que o senhor acha disso?

CHARADEAU: Minha perspectiva é muito diferente da de Platão e outros filósofos. A filosofia faz uma reflexão de fora, propondo um regime ideal, refletindo sobre as possibilidades éticas do discurso. Eu estou preocupado em ver como ocorre concretamente o jogo político na sociedade. A linguagem está no coração de todos atos sociais e todo discurso fabrica uma imagem. Quem fala, cria uma máscara para si. E por detrás dessa máscara não está a verdade, e sim outra máscara.

É ingenuidade, então, esperar sinceridade dos políticos?

CHARADEAU: No espaço público, onde se dá a política, tudo é feito com a finalidade de se conseguir algo. Pode haver momentos de verdadeira espontaneidade, mas na maioria das vezes ela é pensada, construída. Na política, tudo é encenado.

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