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 | Marcelo Elias/Gazeta do Povo
| Foto: Marcelo Elias/Gazeta do Povo

Quatro Tons de Odair José

4 CDs. Universal Music. Preço médio: R$ 72,90. MPB.

Odair José não mudou, mas seu público sim. O lançamento da caixa Quatro Tons de Odair José, com discos essenciais de sua carreira gravados nos anos 1970, encontrará provavelmente os ouvintes jovens e antenados que costumam frequentar seus shows hoje, e não mais as classes humildes. A caixa traz de volta às lojas os discos Assim Sou Eu... (1972), Odair José (1973), Lembranças (1974) e Odair (1975). Também serão lançados uma segunda caixa com discos históricos e um DVD com o show O Filho de José e Maria, releitura de um álbum também dos anos 1970, ambos sem data definida.

Na década de 1970, sua música era amplamente aceita pela sociedade, mas desprezada por uma elite intelectual. O senhor sentia preconceito?

A gente sempre sabe que determinado segmento da sociedade não curte o seu trabalho, mas não via isso como preconceito. Vi isso [preconceito] mais recentemente, quando me jogaram em um balaio misturado com um monte de coisas. Lá atrás, eu sabia que meu trabalho era de uma força popular muito grande e que não era consumido por esse tipo de elite que você citou. Mas não via preconceito da parte deles.

Muitas de suas canções falam de amor partido, saudade, melancolia. Por que esse tema do ex-amor sempre foi tão presente?

Acho que é presente na vida das pessoas. Era assim há mil anos e vai ser assim daqui a mil anos. Talvez possa haver menos melancolia na vida de uma pessoa ou menos ex-amores na vida de outra, mas é sempre uma coisa presente no dia a dia delas. Tenho quase certeza de que ainda hoje é assim, haja visto que, de uns cinco anos para cá, percebo um público jovem mais interessado nesse trabalho.

Hoje, seu trabalho não é mais ouvido pelas classes populares, que apreciam pagode, sertanejo e funk, por exemplo. Por outro lado, os jovens realmente parecem ter redescoberto sua música. Foi por causa do livro Eu Não Sou Cachorro, Não (2002), de Paulo César de Araújo? Foi por causa do disco Vou Tirar Você Desse Lugar – Tributo a Odair José (2006)?

Acredito que é mais a partir do tributo. Acho que nem está muito ligado à pesquisa do Paulo. Mas, de qualquer forma, o livro foi bom pela importância que ele me deu, pois meu trabalho é o mais citado. De uns três ou quatro anos para cá, comecei a ser convidado para tocar em eventos de jovens, como o festival de rock Se Rasgum, em Belém, e o Rec-Beat, em Recife. Onde vamos tocar, ainda que não seja um evento para jovens, percebemos que quem vai lá para animar a festa são os jovens. Isso você falou certo. Não sou mais um cantor da classe popular. Acho que o popular hoje está mais ligado ao pagode, ao sertanejo. Esses artistas estão cantando para o povão. Estou cantando mais para esse público cabeça, jovem. Vejo como se eu estivesse herdando o público do Raul Seixas, mais do que qualquer outra coisa.

O livro de Paulo César de Araújo ajudou a mudar a maneira como as pessoas veem o trabalho dos chamados artistas bregas, conferindo legitimidade a essa turma. Como o senhor vê essa questão?

É um trabalho muito bem escrito e muito bem pesquisado. Evidentemente, também percebo no livro do Paulo que, de certa forma, ele deixa umas divisórias. Ele junta grupos aqui e grupos ali. Essa parte de juntar um pouco de cá e um pouco de lá eu não concordo muito, não gosto disso. Mas, de modo geral, o livro foi importante dentro desse raciocínio que você acabou de dizer, de legitimar esse trabalho feito pelos cantores populares.

Como o senhor analisa a evolução da sua música ao longo das décadas?

Hoje, nos meus shows, em duas horas, toco um repertório pensado em um universo de 44 anos e quase 400 músicas. E toco exatamente as músicas dos anos 1970. São mais atuais do que as que são feitas hoje. Acho que não houve uma evolução. O que está havendo dentro do meu trabalho, no meu entender, é uma confirmação de que aquilo que foi feito há 40 anos foi tão bom que continua atual.

O senhor não fica frustrado que o público goste mais das canções antigas?

Pelo contrário. Acho isso muito lindo. Canto uma música que tem 40 anos e vejo um cara de 18 anos cantando junto. Vocês têm aí o Lupicínio Rodrigues, que fez música há 50 anos que toca hoje como se tivesse sido feita na semana passada. Isso, sim, é o que leva o compositor a pensar: "Fiz uma boa obra".

"Brega" é uma palavra estigmatizadora. Como o senhor prefere se definir?

Não gosto muito de definições. Quando você fala do brega, realmente não gosto [da palavra]. Dizem que existe um estilo brega. Não existe. O brega é uma forma de diminuir o trabalho de alguém. A arte, seja a pintura, a música ou a interpretação, não deve ter uma análise com olhar preconceituoso. Importa se é boa ou ruim. Se um cara fez uma valsa, essa valsa é boa ou ruim? Sobre definição, acho que sou um compositor popular. Ou, como se diz em inglês, um compositor pop. Faço uma coisa fácil de ser entendida e de longo alcance.

Quais são os novos artistas brasileiros de que o senhor gosta?

Sempre tem gente com talento fazendo trabalho bom, em todas as épocas. Confesso que hoje não tem ninguém que me encanta. Fico mais encantado com os caras do passado. Acho que o Paul McCartney continua sendo o melhor. Tom Jobim continua sendo o melhor. Chico Buarque. E vou até me incluir: Odair José, Roberto Carlos, Mick Jagger, Lupicínio Rodrigues, Ataulfo Alves. Tem gente que deve estar fazendo alguma coisa boa [hoje], mas não vi ninguém que me encantasse de uns 20 anos para cá.

Qual o próximo projeto?

Tenho repertório pronto de um disco que eu acho que reflete exatamente o que quero que as pessoas vejam do Odair José. Não vai ter interferência de fora, de ninguém. Espero que esse disco passe melhor para as pessoas quem é Odair José. Mas é só para o ano que vem.

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