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Oliveira: mudança temática flerta com a ficção científica sob a voz de Luiz Bras | Tereza Yamashita/Divulgação
Oliveira: mudança temática flerta com a ficção científica sob a voz de Luiz Bras| Foto: Tereza Yamashita/Divulgação

Entrevista com o escritor Nelson de Oliveira

A partir de agora, o Nelson de Oliveira só publicará ensaios?

Exatamente. Nelson continuará apenas com a teoria: os ensaios, a organização de antologias e a coordenação do curso de Prática de Criação Literária, na Universidade Cruzeiro do Sul.

Os enredos dos contos presentes em Paraíso Líquido são pouco convencionais, não são? É ficção científica?

Eu percebi que há muito escritor talentoso escrevendo sobre a periferia das grandes cidades, os dilemas da classe média, as guerras conjugais e o cotidiano difícil das pessoas comuns. Se também começasse a escrever sobre tudo isso, eu seria só mais um, entre as feras da literatura. Então decidi procurar outro assunto. Foi assim que comecei a escrever sobre a sociedade e os dilemas do futuro. Sobre a maneira como as novas tecnologias estão modificando o ser humano e provocando novas crises sociais e existenciais.

São contos extensos, bem mais do que a média. Os temas exigiram essa extensão ou o processo foi natural?

Não há microcontos nem minicontos nessa coletânea. Para situar o leitor dentro de um universo incomum, habitado por pessoas incomuns, foram necessárias muitas páginas cheias de detalhes. Evitei os temas mais explorados pela ficção brasileira contemporânea — periferia, violência urbana, dramas conjugais, adolescentes desnorteados etc. — e procurei privilegiar os menos abordados: o indivíduo diante das novas tecnologias, dos avanços da medicina, das futuras crises sociopolíticas etc.

Tão longe, tão perto

Paraíso Líquido, aparentemente, é ambientado em um futuro distante, no qual o que hoje poderia parecer impossível acontece. Lá, amanhece vermelho e cobalto.

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O que Nelson Rodrigues, Clarice Lispector e Nelson de Oliveira têm em comum? Além de serem nomes da literatura brasileira, os três autores se irmanam pelo fato de terem usado pseudônimos para assinar textos inventivos. Rodrigues se fez passar por Susana Flag, assim como Clarice chegou a assinar como Tereza Quadros. Oliveira, por sua vez, vem usando há alguns anos o nome Luiz Bras.

No caso de Rodrigues e Clarice, os pseudônimos foram opções que os dois autores usaram para veicular textos na imprensa. Oliveira, assinando Luiz Bras, também é responsável por uma página mensal no jornal Rascunho, de Curitiba, intitulada "Ruído Branco", além de um blog, o Cobra Norato: http://luizbras.wordpress.com.

Mas o pseudônimo praticamente ganhou vida própria e os desdobramentos ultrapassaram qualquer previsão.

Em 2007, já com mais de dez livros publicados e alguns prêmios no currículo, Oliveira anunciou aposentadoria literária. "Sen­­ti que a obra ficcional do Nelson estava completa, nada mais havia para ser dito", diz Oliveira, referindo-se a sua própria trajetória. Ele já havia publicado, nesta primeira década do século 21, alguns livros, voltados para o público jovem, assinando como Luiz Bras. Então, há exatos três anos, decidiu fazer de Luiz Bras o autor dos livros ficcionais que ele, Nelson de Oliveira, escreve.

A exemplo do poeta português Fernando Pessoa, que teve heterônimos como Alberto Caeiro, Ricardo Reis e Álvaro de Campos, Oliveira também criou personalidade para o seu pseudônimo. Ele informa que Luiz Bras nasceu em 1968, em Cobra Norato (MS), é de leão e, no horóscopo chinês, cavalo. "Bras adora filmes de animação, histórias em quadrinhos e gatos", conta Oliveira.

Agora, em 2010, Luiz Bras pu­­blica o seu primeiro livro para o público adulto, o romance Paraíso Líquido. E, como não poderia deixar de ser, se faz necessária a pergunta: e de prático, o que muda em termos de texto, de enredo e de proposta literária geral, nesta troca de "dono" do texto?

"No plano da forma literária, não há quase nada diferente. Mas é muito melhor ser Luiz Bras, pois assim posso recomeçar do zero", diz Oliveira. No entanto, houve uma mudança, que diz respeito à temática. "Agora, estou escrevendo mais sobre a maneira como o ser humano está modificando o ser humano. O modo como a tecnologia está mudando a sociedade, para o bem e para o mal, é assustador", explica.

Se ele ainda assinasse como Nelson de Oliveira, Paraíso Líquido seria uma ruptura em seu "jeito" de fazer ficção. Afinal, Oliveira se tornou conhecido por fazer imersões pelo chamado bizarro. "Percebi que nada mais havia pra ser dito, a menos que eu aceitasse me repetir, repetir, repetir", diz.

Paraíso Líquido reúne 13 contos produzidos nos últimos três anos, alguns deles já veiculados em revistas e coletâneas. O livro foi financiado pelo Programa de Ação Cultural (ProAC) da Secretaria de Estado da Cultura de São Paulo, que custeou os 1,5 mil exemplares da edição.

Serviço:

Paraíso Líquido. Luiz Bras. Terracota. 300 págs. R$ 35. Romance.

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"Sólido está enjoado da Paisagem.

Ele não suporta mais este lugar. Mas não há outro lugar. Em todas as direções só existe a Paisagem. Foi o que Gasoso disse. Gasoso, que já viajou muito, vive afirmando que em todas as direções só existe a Paisagem, plana e infinita.

Sólido quer morrer, eu sei.

Pra ele apenas a extinção faz sentido. A extinção de todas as coisas.

Ele não me ama mais. Ele quer muito morrer.

Ele quer muito a extinção da Paisagem e da Força. A extinção de Gasoso e de todos os gatinhos. A extinção das equações e dos dogmas. A minha extinção."

Trecho do conto "Paraíso Líquido", de Luiz Bras.

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