Como funciona a mente de uma pessoa que decide se isolar do mundo para passar boa parte de sua vida ao lado de animais selvagens? A cineasta alemão Werner Herzog procura decifrar esse enigma no documentário O Homem-Urso, que será apresentado hoje, às 21h20, em sessão especial no Unibanco Arteplex.
A figura em questão é o ativista ecológico americano Timothy Treadwell, que durante anos procurou defender os ursos pardos do Alaska, mas acabou sendo trucidado, juntamente com a namorada Amie Huguenard, por um desses animais, em outubro de 2003. Herzog constrói seu trabalho a partir de várias fitas de vídeo gravadas por Treadwell com os ursos selvagens e depoimentos da fa-mília e de pessoas próximas a ele.
Timothy nasceu em 1957, em uma família de classe média americana. Segundo seus pais, tinha talento para esportes na adolescência, mas não os desenvolveu. Quando jovem, envolveu-se com drogas e passou por um período de isolamento social, criando até uma persona que se dizia australiana. Passada essa fase e já com mais de 30 anos, Treadwell decidiu viver para os animais, mais precisamente os ursos pardos, os quais visitou regularmente durante 13 temporadas, no período em que não estavam hibernando apesar de todos os avisos de como era perigoso se aproximar deles, coisa que nem os esquimós, que vivem na região, tentam fazer.
Virou uma figura pública, que aparecia sempre na mídia o documentário apresenta uma entrevista sua no programa do conhecido David Letterman e que buscava recursos para a proteção os animais, chegando a criar uma fundação especialmente com esse intuito, juntamente com a amiga Jewel Palovak. Mas especialistas diziam que sua causa era estranha, pois os ursos já viviam em uma reserva especial.
É difícil, praticamente impossível, para o espectador se identificar ou mesmo gostar de Tread-well. Ele chegava a ser irritante em muitos momentos, seja em seu discurso extremo de eco-ativista ou mesmo no convívio com os ursos, conversando com eles como uma criança patética, às vezes dizendo que os amava muito, outras recriminando-os por fazer coisas inerentes a sua natureza, como matar outros animais. Não devem ter sido raras as vezes em que alguém desejou de brincadeira sua morte, pelo estardalhaço que aprontava e os politicamente incorretos podem pensar o mesmo durante a projeção do documentário. Mas, depois de tanto tempo sem problemas com os ursos, ninguém esperava que seu final seria tão trágico e que ele mesmo registrasse o áudio do ataque fa-tal. A fita com os terríveis sons está em poder de Palovak, que nunca a escutou, mas a mostrou a Herzog, que acabou ouvindo tudo.
Esse é o único momento do fil-me em que o diretor alemão toma uma posição explícita sobre o tema que está retratando, aconselhando Jewel a destruir o registro, por achar que um dia ela não resistirá à tentação de escutar os sons, sofrendo muito. Fora isso, Herzog não aponta uma conclusão própria sobre Treadwell, não o julga moralmente, apenas revela uma sensação de incredulidade com os acontecimentos, que é perfeitamente compartilhada pelo espectador.
Idiota, louco varrido ou uma pessoa com sérios problemas emocionais? O documentário muito bem executado por Herzog aponta para um conjunto dessas características. Vale destacar ainda a atitude positiva do cineasta, que não apela para o sensacionalismo ao contar a história do ativista, um caminho de fácil escolha para diretores menos experientes no momento atual da mídia mundial. GGGG
Serviço: Sessão Doc O Homem-Urso, de Werner Herzog. Unibanco Arteplex Crystal (R. Comendador Araújo, 731). Hoje, às 21h20. Entrada gratuita.
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