Adriana Falcão está muito bem para alguém que não tinha um caminho previamente traçado. Há seis anos é uma das roteiristas de A Grande Família, da Rede Globo, onde também assinou Brasil Legal, A Comédia da Vida Privada e O Auto da Compadecida. Desde 2004 participou da redação de sete roteiros para cinema, incluindo Irmã Vap O Retorno e A Máquina, história adaptada tanto para teatro quanto para cinema pelo marido João Falcão, e recentemente lançada como livro pela Editora Objetiva. São de Adriana, ainda, os best sellers infanto-juveins Mania de Explicação, que concorreu ao prêmio Jabuti, e Luna Clara & Apolo Onze. A escritora e roteirista deu um tempo na sua rotina agitada para falar com o público curitibano dentro do projeto Sempre um Papo, promovido na quarta-feira passada no Teatro da Caixa.
"Se o evento fosse chamado Sempre uma Palestra, eu não viria porque palestrante eu não sou", brincou logo no início. A formalidade não é com ela, mas extroversão certamente é, assim como o gosto pela fala do povo, seus trejeitos e superstições. Uma influência de uma mãe de coração grande, diz ela. Quando a estação espacial americana Skylab começou a cair, nos anos 70, a mãe de Adriana foi proteger a cabeça da filha. "Ela não achou que o Skylab fosse cair na minha cabeça... ela tinha certeza que o Skylab cairia na minha cabeça", lembra a escritora. A superstição ficou: uma "mulher do tarô" disse que nenhum avião cairia com Adriana a bordo. Mãe superprotetora que é, ela viaja sempre junto com as filhas, algo complicado para quem tem de cuidar de três meninas. Quando escreve, acende incenso. "Não que seja uma coisa de estar inspirado ou não. Mas, quando escrevo, acontece algo que faz parecer que sou o veículo de algo maior que eu", conta ela.
Quando pequena, cogitou ser cantora de rock, antes de ser conquistada pela literatura de Machado de Assis. Aos 11 anos, trocou o Rio de Janeiro, onde havia nascido, pelo Recife. "Achei que o meu mundo fosse desabar", lembra. A casa mudou, mas não o interesse pela literatura. O Estrangeiro, de Albert Camus, mudou sua vida, e García Marquez a fez encher os olhos de lágrimas, ao lado de outros autores do realismo fantástico.
O começo para Adriana, porém, estava longe dos cânones e do "odioso" curso de Arquitetura que concluiu. Estava no sabão em pó, que teve de vender enquanto era redatora de uma agência publicitária. Descobriu, pelo menos, que poderia viver apenas daquilo que escrevia, mesmo que se tratasse apenas de um slogan de supermercado.
A vida, no entanto, armou outra reviravolta para Adriana. Seu marido foi trabalhar no Rio de Janeiro e ela foi junto com as filhas. Estava com mais de 30 anos e não nutria esperança na carreira de publicitária. "Eu estava velha para começar tudo de novo, andar com a minha pasta. Se eu viesse com um portfólio de Milão, sim, mas chegando do Recife, já achei que ia ter de enfrentar preconceito", diz.
Resolveu escrever "suas coisas" quando um convite do diretor Guel Arraes caiu como luva. O global comprou um texto dela sobre mulheres e o aproveitou em A Comédia da Vida Privada. Logo virou colaboradora, com direito até de roteirizar todo um episódio sozinha. Pipocaram convites para escrever para teatro e cinema enfrentando resistência da autora. "Eu não sei escrever para teatro. Não gosto de escrever o roteiro de um filme, o formato do roteiro, a estrutura narrativa me assusta. O que gosto de fazer são os diálogos", conta.
Ela topou, porém, escrever sobre o nordeste, a pedidos do ator pernambucano Tuca Andrada. "Tive muitas dificuldades, mas acabei fazendo esse livro que agora é A Máquina. O João pegou para ler e disse Não é teatro, mas continua escrevendo que eu adapto. Eu não imaginava que era um livro. Pensei que estava escrevendo um livro para servir de guia para um peça. Acabou sendo publicado e aí eu virei escritora", conta. Houve ainda um outro caminho tortuoso para Adriana se tornasse escritora, sem muita pretensão: a coluna que mantinha na Ve jinha Rio virou o infantil Mania de Explicação.
O volume já vendeu perto de 150 mil cópias, para alegria da autora. "Mas, veja que coisa curiosa, um capítulo de A Grande Família atinge entre 18 e 20 milhões de pessoas". A Adriana enxerga nesse público um enorme potencial para a televisão, que considera subaproveitado no Brasil. "A qualidade caiu muito, está piorando, mas isso não é motivo para abandonar. Vamos fazer algo interessante. É entretenimento, mas pode ser bem melhor", comenta.
A rotina da tevê é dura e mais fechada. É preciso segurar a atenção do espectador a cada minuto, criar ganchos para amarrar as pontas entre os intervalos. "No fundo, o que eu mais gosto é de escrever literatura. Se eu pudesse viver disso, adoraria", conta, ao passo que quer dedicar-se, também, a fazer a televisão no Brasil ficar melhor e mais interessante.
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