Ensaios
Poesia e Escolhas Afetivas Edição e Escrita na Poesia Contemporânea
Luciana di Leone. Rocco, 256 págs. R$ 29,50.Frutos Estranhos Sobre a Inespecificidade na Estética Contemporânea
Florencia Garamuño. Rocco, 128 págs. R$ 24,50.
Em O Espectador Emancipado, o filósofo francês Jacques Rancière especula sobre a necessidade de desempenharmos o papel de intérpretes ativos do mundo: "Uma comunidade emancipada é uma comunidade de narradores e tradutores". O trecho está dissecado em Frutos Estranhos Sobre a Inespecificidade na Estética Contemporânea, de Florencia Garramuño, o primeiro livro da série Entrecrítica, projeto teórico voltado ao pensamento literário. O ideário pode bem servir como ponto cardeal para a discussão do que é fazer atualmente crítica de livro em jornal.
A pesquisadora argentina analisa os entrelaçamentos da literatura contemporânea brasileira com as diversas linguagens artísticas. De Bernardo Carvalho a Carlito Azevedo, ela passeia pelas instalações de Nuno Ramos e Hélio Oiticica para, então, configurar uma teia sensitiva.
"As obras de Nuno Ramos fazem de uma área importante da arte contemporânea um laboratório de ideias e de inspirações para pensarmos e imaginarmos, como dizia o último Barthes, como viver juntos". Este apelo comunitário é um dos cernes de Frutos Estranhos. A autora debate como escritores podem refletir preocupações e problemas provenientes dos mais diversos campos: da política à construção narrativa sendo a própria iniciativa de narrar e contar uma história uma ação fundamentalmente política.
Mercado
Em Poesia e Escolhas Afetivas Edição e Escrita na Poesia Contemporânea, Luciana di Leone, professora argentina de Teoria Literária, radicada em Florianópolis, toma para si um propósito ainda mais amplo: decifrar o que é a poesia contemporânea brasileira e o seu mercado editorial.
Ela contextualiza o trabalho exercido por editoras independentes a independência como construção de capital simbólico e a fuga da mesmice e do homogêneo , e torna a obra indispensável para escritores, editores, jornalistas e leitores que queiram entender a lógica do mercado. A discussão sobre a desmonetarização da literatura e da poesia, mas não da indústria do livro ou a do escritor, que participa ativamente do mercado como professor, editor ou jornalista, é também relevante.
Paixões
Os dois primeiros volumes de Entrecríticas são valiosos para além da esfera literária e podem funcionar como bússola do próprio fazer jornalístico. Em um contexto de crise cativa na formação de leitores e muitos lançamentos, escrever sobre livros é um desafio e, ao mesmo tempo, um exercício de didatismo.
Dizer sobre o que é lançado a cada semana reconhecendo a lógica da novidade e do rápido esquecimento não é apenas apreender o livro, mas também encontrar meios de contextualizá-lo no momento histórico e social de sua produção e veiculação. Ao almejar traduzir as nuances de cada voz autoral busca-se, sobretudo, conquistar o leitor, essencial à existência de crítica literária em um jornal impresso diário.
Como dizia o filósofo francês Gilles Deleuze, este jeito nosso de alcançar o máximo de paixões alegres e a tentativa, enquanto jornalistas, de realizar o trânsito entre o comum e o singular.
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