O jornalismo de hoje é melhor do que o do passado. O jornal impresso não vai acabar. Os adolescentes e os jovens são leitores. Eis alguns pontos de vista defendidos por Carlos Costa, de 59 anos. Paranaense de Londrina, ele é doutor em Ciências da Comunicação pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo. Dirigiu as revistas Playboy, Quatro Rodas e Elle, da Editora Abril. Em Buenos Aires, esteve à frente da Editorial Primavera, do Grupo Abril. Edita as revistas Diálogos&Debates, da Escola Paulista da Magistratura, e Getulio, do programa FGlaw, da FGV. Jornalista formado pela Faculdade Cásper Líbero, onde leciona História da Comunicação, Design Gráfico e Jornalismo em Revistas, Costa concedeu entrevista à Gazeta do Povo.
Qual a sua avaliação a respeito do futuro dos jornais impressos?
Carlos Costa A tendência da mídia impressa, não como futuro, mas como algo que já acontece, é a de diminuir tiragens enquanto aumenta a quantidade de títulos. Ou seja, a meta perseguida no passado de um jornal ter o maior número possível de assinantes, com curvas ascendentes de vendas, é mesmo coisa do passado.
Por quê?
Dou um exemplo. Sempre trabalhei em revistas, na Editora Abril, e todo ano era negociada uma meta, buscando subir uma média de 15 a 20% de circulação. Na Playboy, quando chegamos ao patamar dos 300 mil exemplares mensais (época em que a revista publicou um ensaio com o travesti Roberta Close), logo a direção da empresa acenou com a meta de chegar aos 500 mil exemplares de circulação mensal, entre vendas em bancas e assinaturas. Depois (e eu já não estava mais lá), a revista ultrapassou a marca de 1 milhão de exemplares (com as capas da Tiazinha e da "feiticeira" Joana Prado). Na Quatro Rodas revista que dirigi a seguir ocorria essa mesma pressão: ultrapassar a barreira dos 200 mil etc. Hoje, Playboy tem de se contentar com tiragens próximas de 150 mil, amargando vendas em banca na casa dos 80 mil exemplares. Ou até menos.
Isso é irreversível?
O leitor hoje não está interessado em impressos (jornais e revistas) com temas genéricos, que atendam a necessidades de "todo mundo". Saber que Barak Obama gaguejou na fala do juramento da posse eu li na internet. Se precisar aprofundar esse assunto, comprarei ocasionalmente dois jornais ou duas revistas semanais de linhas editoriais contrastantes. Mas não serei assinante de nenhum deles, para receber todas as semanas as duas publicações em casa, repetindo temas que já li online ou vi pela tevê ou recebi no celular (não é meu caso, mas o de tantos jovens). Pois, tanto o jornal quanto a publicação semanal de informação tratam de assuntos de interesse para "o grande público". Já o dono de uma padaria, sem dúvida, terá de assinar uma revista que fale e ensine como melhorar as vendas, distribuindo melhor os produtos nos displays, como incrementar a saída de sorvetes no inverno etc. Temas específicos atendem a necessidades específicas de públicos delimitados.
E isso representa o quê?
Com isso, os jornais "genéricos" terão tiragens reduzidas. E, se o grande jornal quiser manter aquela corrida de ultrapassar tiragens de 400 mil, visando a marca do milhão, estará perdendo tempo. Não adianta dar brindes, seja de panela, lençol ou coleções de CD (a garotada já fez download do que interessa). Na contramão, teremos muito mais jornais ou folhetos ou revistas segmentados, direcionados a dentistas, cabeleireiros etc.
Os jornais impressos já absorveram o impacto da internet e conseguiram se reinventar?
Pela ótica do que comentei anteriormente, para manter e segurar vendas, os jornais buscam copiar a linguagem da internet. Talvez um bom exemplo foi o do jornal O Estado de S.Paulo redesenhou sua apresentação gráfica de modo a ficar mais parecido com a navegação da internet. É importante o jornal acompanhar essa tendência: basta ver como eram os jornais na década de 1920 ou 30, como passaram a se apresentar nos anos 50, quando a tevê e a urbanização do país davam a tônica da importância do visual. No entanto, não é a cópia do visual da internet que mudará o que foi apontado, por mim, há pouco. A era do impresso como grande meio de comunicação massivo passou. A partir da década de 1990, entramos em outra dimensão, que é a da informação online, via computador e celular.
Independentemente de suporte, jornalismo, entre outras coisas, é noticiar. O que pode se esperar do jornalismo?
Jornalismo é noticiar e prestar serviço que melhore ou mude a vida do leitor (o conceito de useful information: pago pela informação, pois ela irá melhorar meu desempenho). Nesse contexto, o que se espera são informações confiáveis: seja o preço certo do ingresso e o horário do filme no cinema do shopping etc. Se me programo para assistir a uma peça e chego no teatro e encontro as portas fechadas ou com a sessão iniciada, jamais voltarei a comprar aquele jornal que me fez perder o programa.
Há quem diga que jovens, adolescentes sobretudo, não costumam ler impressos. Fala-se que se informam pela internet. Esses futuros adultos vão migrar para o impresso? Ou o impresso estaria condenado mesmo a desaparecer?
O pior é que ouço falar que o jovem de hoje não lê. E quem costuma dizer isso é o professor da geração anterior. Nunca se leu e se escreveu tanto quanto hoje. Pessoas na faixa dos 50 anos, que não pegavam na caneta ou na máquina de escrever há duas ou três décadas, agora mandam e-mail, recebem torpedos no celular. Há mesmo uma explosão da escrita. Nesse contexto, o impresso continuará, sim. E com novo vigor: as pessoas irão comprar livros, revistas, jornais, se esses meios trouxerem algo novo, algo diferente. E isso representa um desafio novo para o jornalista. O impresso não está condenado a desaparecer, ele terá um lugar especial se atender ao interesse desses muitos leitores.
Há crise no jornalismo hoje, independentemente do jornal de papel?
A crise é sempre sinal de mudança e creio que para melhor. O leitor se tornou mais crítico. O jornalismo dá tiros no próprio pé quando entra na ciranda do show, do espetáculo. Mas entendo que hoje o jornalismo está melhor do que foi no passado, pois não está amarrado às grandes corporações. O blog abre espaços de expressão que antes não eram imaginados. Como diz o professor Sérgio Amadeu, especialista em novas tecnologias da informação, o problema hoje não é ter onde publicar, mas ter quem leia o que se publicou, tamanha é a oferta (de blogs, revistas digitais). O próprio poder de definir o que é notícia foi diminuído, contrariando as teorias do gatekeeper (o dono do jornal decreta que a cobertura da passeata não é assunto sério para o jornal): qualquer um pode postar a informação sobre a passeata em seu blog e isso vira notícia.
O senhor é professor. O que os alunos pensam a respeito do jornalismo?
Sou professor de Jornalismo há dez anos, e continuo editando revistas. Há uma mudança que se nota: os alunos chegam à Casper Libero cada vez mais preparados, com mais quilometragem. Em 2000, eu precisava ensinar a montar uma apresentação em power point. Hoje eles me ensinam truques de recombinação de conteúdos, de inserir som e imagem nesses mesmos slides. Há de tudo um pouco nos novos alunos: o aluno que quer ser jornalista porque desde pequeno escrevia bem e gostava de escrever. Há o missionário que quer mudar o mundo. Há os que sonham com coberturas de Copa do Mundo para a revista Placar. Os que querem ser radialistas (Heródoto Barbeiro, ex-colega de curso aqui na Casper, tem muitos fãs). Mas é o Caco Barcelos que tem maior ibope entre esta garotada. Ao final do quarto ano e elaborando o TCC (trabalho de conclusão de curso), que é muito importante no projeto da Cásper, essas visões estereotipadas são vistas com ironia por eles mesmos. Mas a visão da missão é algo que permanece: a missão cidadã de fornecer informação isenta.
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