Hoje existe o deslumbramento com "fenômenos" artísticos que atingiram o sucesso antes de lançarem o primeiro disco. O músico, compositor, ator e escritor Eduardo Dussek já tinha conseguido isso há 30 anos. Antes de lançar os LPs Olhar Brasileiroe Cantando no Banheiro!, ele já tinha se consolidado como compositor de conhecidos intérpretes da música brasileira. Hoje coleciona trabalhos interpretados por Zizi Possi, As Frenéticas, Ney Matogrosso e Marília Pêra, só para citar alguns, e se prepara para uma minitemporada de apresentações em Curitiba, que acontece no Teatro da Caixa, de hoje até domingo.
Desfilarão no palco a simpatia e a versatilidade de um legítimo showman em diferentes estilos musicais. Normalmente, o nome de Dussek é associado a obras debochadas ("Barrados no Baile"), populares e políticas ("Doméstica"), mas também tem um lado, mais romântico, eternizado em composições como em "Eu Velejava em Você". E, de uns tempos para cá, ele também aproveitou para resgatar marchinhas de carnaval e ampliar seu abraço para novos públicos. Leia a entrevista que ele deu, por telefone, à Gazeta do Povo:
Você vem a Curitiba para comemorar seus 30 anos de carreira. Como resumiria essas três décadas de trabalho?
Como uma carreira vitoriosa! Tive meus percalços, como qualquer outro artista. Mas a minha vitória vem com a identificação que o povo tem com meu trabalho. Descobri que sou um cara legal! Sem frescura, com o ego controlado e com um legado bacana. O povo gosta e sente confiança no que faço, e eu nem precisei ser consumido pelo mainstream. Esse é o retorno que a gente procura, ainda mais quando trabalhamos com criação, né? Trabalhos para a felicidade e esclarecimento do povo. Mas 30 anos é pouco, dá para fazer muito mais.
Por exemplo?
Estou atualmente gravando mais um disco de músicas românticas. Também estou envolvido com a criação de outro musical... E penso em lançar mais algum produto como escritor. Sou um artista multifuncional. Faço qualquer coisa, desde que não seja uma apresentação de balé ou no Cirque du Soleil. Não sou bailarino ou acrobata (risos). Mantenho sozinho minha gravadora e produtora. Trabalho por conta, sem precisar de empresários ou produtores.
Em um de seus discos mais recentes, o Tao do Dussek, você montou um resumo de sua obra e uma espécie de introdução ao público jovem. Deu certo?
Sim! Ele foi bem necessário. Ali tem o "tao" de equilíbrio, e mostra quem é esse "tal de Dussek". O engraçado é que meu público novo varia entre os 10 e 20 anos de idade. São filhos e netos de antigos fãs que me acompanham até hoje. E, ao mesmo tempo, existem pessoas com mais de 60 anos que estão descobrindo minha obra. Não iam com a minha cara quando comecei a tocar... me achavam irreverente demais. Mas, depois que eu lancei os musicais, trabalhei com a obra de Carmen Miranda e as marchinhas de carnaval, eles começaram a me dar mais atenção. Tudo isso esta no Tao do Dussek, que atira para todos os lados e conquista o equilíbrio que eu buscava. Tem marchinhas, sambas, rock, musicas românticas... Bem diferente dos discos que eu lançava antigamente, que eram mais chatos e radicais...
Como assim?
Não sei. Meus discos eram egocêntricos demais. Eu só via o meu lado e esquecia todo o resto. Quando o artista amadurece, entende que precisa prestar atenção no público e diminuir bastante o ego nesse sentido. Sou um servidor público a serviço de todos!
O interessante é que você foi uma das figuras que acompanhou a descoberta da cultura jovem brasileira no início dos anos 80. Com direito a participação no Rock in Rio de 1985, cutucadas políticas e som bem atual para a época...
Isso é um fato bem marcante na minha carreira. Parece que agora estou fechando um ciclo, porque conto novamente com a valorização das gerações que surgiram dos anos 80 para cá. Não tenho preconceito ou papas na língua. Posso trabalhar com samba, marchinhas, óperas, trilhas clássicas... Estudei para tudo isso acontecer. O único critério que eu tenho é fazer o melhor em cada área. Eu sou uma grife que prima pela qualidade do meu estilo. Até nas musicas românticas que eu gosto de compor tem uma dose de humor. O público sempre gostou disso, não importa a idade ou a contexto histórico. Não quero parecer oportunista ou fazer moda. Poderia produzir muito mais se tivesse um melhor apoio cultural. Hoje em dia apoia-se muita bobagem, mas não se incentiva a informação.
Baseado nisso, como você monta suas apresentações? São bem interativas e divertidas. Já passou por alguma saia justa?
Nunca rolou! Fora um ou outro espectador bêbado meio inconveniente. Eu tomo muito cuidado. Não faturo em cima da desgraça dos outros ou da vida alheia. Coloco os percalços a partir da minha pessoa, sou "um brasileiro ferrado" e bem parceiro do público, com uma linha bem traçada de ideias e piadas utilizadas nos shows.
É verdade que quando você contracenou com o ator Michael Madsen (no filme brasileiro Federal, dirigido por Eryk de Castro e lançado em 2010) ele se tornou seu fã?
Louco isso, não é? (risos). Ele até me convidou para ir passar um tempo na casa dele em Hollywood. Disse que ia me apresentar ao Quentin Tarantino e quer fazer mais coisas juntos. Deixou claro que na continuação de Federal, ele quer contracenar bastante comigo. Mas eu não acredito muito nessa coisa de Hollywood. Não tenho grandes ilusões. Madsen é um bom companheiro e colega de trabalho, mas eu precisaria de uma estrutura muito maior para largar tudo por aqui e encarar essa história.
Para finalizar: você prefere o romantismo ou o deboche?
Os dois lados! Sou um romântico assumido, mas tenho uma vida normal. A gente não é debochado o tempo todo e nem agimos constantemente de forma romântica.. As duas coisas funcionam bem e convivem juntas. Cada uma a seu tempo.
Serviço:
Eduardo Dussek, Teatro da Caixa (R. Cons. Laurindo, 280), (41) 2118-5111. De 17, 18 e 19, às 21 horas, e 20 de março, às 19 horas.. Ingressos: R$ 20 e R$ 10