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Bueno, artista multilinguagens: mergulho de cabeça no mundo infantil | Pedro Serapio/ Gazeta do Povo
Bueno, artista multilinguagens: mergulho de cabeça no mundo infantil| Foto: Pedro Serapio/ Gazeta do Povo

Trecho de Naipo - Um Menino Que Não Existe

"Celina é a mulher mais linda que eu já vi na vida. Tem a pele do rosto muito delicada. As mãos finas e os gestos muito suaves. Fico namorando ela, ali, ao lado do poço, pegando água pra levar pra casa. Nossa, ela é muito mais velha que eu! Deve ter uns 20 anos. E canta música doce, feliz. Não, não tem namorado. Mas tem uma espécie de um príncipe. Como? Tá, tá certo, ela não diz que é príncipe, mas eu imagino que seja porque nestas histórias sempre é um príncipe. É, deve ser. Ele é apaixonado por ela, fica vendo ela passar, conversar com uns animais. Celina é tão sensacional que conversa até com as borboletas."

Depois de dirigir muito teatro infantil, inclusive dois com texto de Ruth Rocha que estarão no Fringe deste ano (Teimosinho e Mandão, dias 30 e 31 de março, e Marcelo, Marmelo, Martelo, dias 1 e 4 de abril), o ator e dramaturgo curitibano Edson Bueno estreia na literatura com o in­­fanto-juvenil Napo – Um Menino Que Não Existe. Sua incursão pelo mundo das palavras destinadas a esse público, segundo ele, é fruto de "amor e troca", já que as emoções e aventuras que o artista proporciona à criança também são vivenciadas por ele.

Na história, que integra a coleção Metamorfose da Editora Positivo, Napo é um menino prestes a completar 12 anos do tipo "plausível-impossível".

Plausível porque todo mundo já ouviu argumentos ou perguntas feitas por crianças como as que compõem este longo ano na vida do garoto. Impossível porque nenhum piá poderia reunir tamanha consciência numa cabecinha só.

Sim, ele é moleque: gosta de falar sobre animais "estraçalhados"; de filme de terror; de imaginar o Frankenstein feito de carne de pessoas mortas...

Envereda até por assuntos fortes para um livro paradidático – como quando Napo vê o tio beijando na boca uma mulher que não era sua tia.

Mas o garoto tem uma noção exacerbada do que quer e do que não quer. É quase um mentor de si mesmo.

Não quer, por exemplo, desobedecer a mãe e entrar no lago – tem horas que ele manda a competição às favas e assume seus medos.

Não entende por que o pai fica segurando um canarinho morto se não vai adiantar nada – o irmão lhe contara que animais não vão para o céu. Na relação com o pai, com frequência Napo parece pensar: "Esses adultos são tão infantis...". Quando é levado ao circo, por exemplo, finge sentir medo do rinoceronte só porque o pai dissera que o filho se sentiria assim. "Mas saiu da sua cadeira e foi para o colo do pai. Só pra não quebrar as expectativas dele."

Naquele momento ele escolhe seu animal preferido. Como ele poderia ter medo de um bicho tão lindo?

Citações

Algumas tiradas denunciam que por trás da mente de Napo há um cinéfilo apaixonado. Dono de um prolífico blog sobre cinema (A Eternidade e Um Dia), o autor tem seu melhor momento quando veste Napo com roupas de domingo, brilhantina no cabelo, caderno novo e caneta na mão para assistir Tudo o Que Você Sempre Quis Saber Sobre Sexo, Mas Tinha Medo de Perguntar, de Woody Allen (1972).

Apesar do interesse no misterioso mundo da sexualidade, o negócio de Napo é mesmo filme que dê medo – ainda que ele não reconheça a ligação daquilo que assiste na tevê com as madrugadas de pânico e luz apagada.

O garoto já viu tantos que ensina: "Em filme de terror é um perigo andar em corredor, entrar em sala sem acender a luz, perguntar quem está batendo na porta e entrar em caverna. É morte certa!"

Bueno aproveita o canal aberto com a criançada para inculcar referências literárias também. Um dos capítulos se chama "Crime e Castigo" – neste caso, a protagonista é a cadelinha de Napo, que é levada embora pelo pai depois de ter "brincado de um jeito engraçado com outro cachorro".

A leitura de jornais também é incentivada. Napo "nem sempre entendia tudo, mas era sua forma de dominar as palavras".

Serviço:

Napo – Um Menino Que Não Existe, de Edson Bueno. Editora Positivo, 142 págs, R$ 29,90. Lançamento: Salão de exposições do Teatro Guaíra. Dia 16, às 19 horas.

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