Sean Penn é o filho que, nos dias atuais, vive as consequências de sua criação rígida| Foto: Divulgação
Brad Pitt vive o papel de um pai exigente dos anos 50, cujo rigor deixa profundas marcas em seus filhos

É uma dessas situações que acontecem raramente na vida, como a passagem do cometa Halley. Tanto que foi preciso dar explicações sobre a ausência do cineasta Terrence Malick na coletiva de imprensa de A Árvore da Vida no 64.º Festival de Cannes, o filme responsável por tirar a competição de seu estado morno, na manhã de ontem.

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Apesar de algumas vaias ao final da projeção, geradas certamente pela enorme expectativa de um longa-metragem em produção há vários anos, o filme tornou-se favorito à Palma de Ouro com uma poesia visual e cheia de espiritualidade, que captura a vida em cada plano. Há mais personagens do que história, pois o cineasta propõe-se mesmo a refletir sobre a vida, a perda e o amor a partir de uma família das mais comuns, nos anos 1950.

Voltando à coletiva: o fato não é inédito, mas, quando a­­conteceu anteriormente, tudo foi justificado. Ridley Scott tinha tido um problema de saúde, daí a sua ausência na entrevista de Robin Hood. Godard citou misteriosas circunstâncias que tinham impedido sua ida a Cannes para falar sobre Film Socialisme.

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No caso de Malick, não houve carta, bilhete ou torpedo. Mas o moderador Henri Behar, que de bobo não tem nada, começou perguntando justamente sobre a ausência de Malick, um cineasta bissexto que lançou apenas quatro longas-metragens: Terra de Ninguém(1973), Cinzas no Paraíso (1978), Além da Linha Vermelha (1998) e O Novo Mundo (2005). "O senhor Malick é muito tímido", explicou a produtora Sarah Green. E acrescentou: "E eu diria que seu trabalho fala por ele".

Uma entrevista sem o realizador é algo estranho, ainda mais em se tratando de um diretor como Malick, dono de uma visão de mundo e de um cinema muito únicos. "Como ele é de verdade? Ri?", perguntou o bem-humorado Behar. Brad Pitt, que é um dos protagonistas e produtor do filme, respondeu igualmente com humor. "Sim, ele até vai ao banheiro!", disse. "Ele é jovial, ri boa parte do dia. E ele tem aquilo que faz a diferença dos grandes cineastas: realmente ama seus personagens." Mais tarde, o assunto voltou à pauta. "Malick deu instruções sobre o que as pessoas da mesa poderiam dizer sobre ele?", indagou uma jornalista. "Não", foi a resposta unânime.

"Ele quer pessoas que pensem, tirem suas próprias conclusões. A ideia de que ele possa impor algo ou tentar exercer alguma influência sobre nós não poderia estar mais longe da verdade do que é como pessoa. Ele não gosta de falar porque deseja que a plateia tenha suas próprias ideias sobre o filme", disse o produtor Grant Hill. "Terry não gosta de falar sobre o que se trata, se é autobiográfico. Prefere fazer uma peça de poesia ou de arte, em vez de verbalizar", disse o produtor Bill Pohlad.

Brad Pitt teve de responder até se Terrence Malick é religioso – o filme tem uma visão cósmica sobre a vida e a morte. "Tivemos muitos debates teológicos. Acho que ele é mais espiritualizado do que adepto de uma versão cristã do mundo", disse. O próprio ator, que teve educação cristã no meio-oeste dos Estados Unidos, disse que sempre questionou muitas das coisas que o filme levanta. "Cresci ouvindo que Deus ia tomar conta de tudo, e aí uma tragédia ocorre e você se pergunta. Tenho muitas questões, nem vou começar a falar sobre isso!", afirmou.

Outro projeto

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Os produtores também tiveram de comentar a famosa demora do diretor para terminar seus projetos – A Árvore da Vida era para ter sido exibido na competição do Festival de Cannes de 2010. "Sempre colocamos uma pós-produção longa, porque sabemos que ele vai levar tempo", disse Pohlad. Sarah Green apressou-se em afirmar que ele é disciplinado. "Trabalha dia e noite, não para. Mas alguns trabalhos se revelam para ele mais rapidamente, outros menos. E isso é com ele, não conosco."

Surpreendentemente, o cineasta já acabou de rodar outro filme, ainda sem título e com um elenco superestelar, formado por Rachel McAdams, Ben Affleck, Javier Bardem e Rachel Weisz, entre outros. Em que edição de Cannes ele vai passar, é outra questão que ninguém, provavelmente nem Terrence Malick, deve saber responder.