Há exatos 70 anos, morria o irlandês James Joyce (1882 -1941), um dos grandes autores do século 20, em Zurique, na Suíça. Sua obra complexa, no entanto, ainda é uma aventura a qual poucos leitores estão dispostos a se lançar. É corriqueiro ouvir, por exemplo, alguém dizer que largou Ulisses (1922) logo nas primeiras páginas ou comentar que não entendeu patavina de Finnigans Wake (1939).
Para adentrar o universo dessas obras, as maiores do século passado para o professor de literatura Caetano Galindo, da Universidade Federal do Paraná (UFPR), é preciso ler e reler o livro várias vezes. Afinal, prêmios são proporcionais aos esforços, como bem justifica o autor de uma tradução ainda inédita da obra prevista para ser publicada em 2012, pela Companhia das Letras.
Nesses livros, Joyce praticamente exauriu os recursos da forma-romance. Mas não se trata de virtuosismo gratuito. "Eles são mais complexos que a média simplesmente porque Joyce estava mais aplicado que a média dos romancistas a representar adequadamente camadas mais amplas, mais profundas e, logo, mais complexas, da experiência humana", diz Galindo.
Para poeta Ivan Justen Santana, Joyce ensaia tudo que foi feito no século 20 e nos séculos anteriores, e aponta caminhos ao milênio seguinte. "A obra de Joyce ombreia com os clássicos maiores. Ele nos força a sempre reler Homero, Ovídio, Dante, Rabelais, Cervantes, Shakespeare, Sterne, Swift, Goethe, Tolstói, Dostoiévski", diz.
Para ele, Joyce fascina por ser, ao mesmo tempo, um humorista e um escatologista; erudito e popularesco; cômico, trágico, lírico, épico e melodramático. Para além da forma, o que fica mesmo com o leitor, são as pessoas, diz Galindo, "os personagens Bloom, Dedalus, Molly... O que a gente vê da vida, do mundo, nessas pessoas, e o que entende".
Siga a ordem cronológica
Por onde começar a ler a obra de Joyce? Os dois entrevistados recomendam começar pela ordem, ou seja, por Dublinenses (1914), primeiro livro do autor. Galindo sugere, então, passar ao Retrato de um Artista Quando Jovem (1916). "É fundamental lembrar que esses dois livros 'menores' teriam bastado para deixar o nome de Joyce em qualquer história da literatura. E, no caso do leitor paranaense, vale lembrar que Dublinenses tem, no mínimo, uma similaridade de espírito com a obra de Dalton Trevisan que, não por acaso, foi o primeiro a traduzir fragmentos de Ulisses no Brasil, na revista Joaquim", lembra. Aí, dizem os entrevistados, é tomar coragem e pegar o Ulisses.
Conselho de Galindo aos iniciantes: procurem ajuda. A grande dificuldade para os monolíngues é a ausência de material de referência traduzido. Mas um conhecimento instrumental de inglês permite a leitura de um guia fundamental, o Ulisses Annotated, de Don Gifford. "Ele anota tudo, nomes, lugares, dá mapas, localiza citações". Em português, o professor indica a tradução de Homem Comum Enfim, de Anthony Burgess (Cia. Das Letras), e Para Ler Finningans Wake de James Joyce, de Dirce Amarante (Iluminuras).
Para não haver desculpas, convida os interessados na aventura joyceana a acompanhar cursos sobre o autor na UFPR. "A universidade é pública, está de portas abertas, e as pessoas nem sempre contam com isso", diz.
Domínio público
A obra de James Joyce será colocada em domínio público no dia 1.º de janeiro de 2012, ano subsequente a este em que se completam os 70 anos da morte do autor. Caetano Galindo considera o fato positivo por facilitar a publicação de novas edições, muitas vezes, impedidas devido aos direitos autorais. "A duração do Copyright, no caso de Dublinenses, é de quase cem anos! Na verdade, 98, já que o livro saiu em 1914 e só entra em domínio público em 2012, com todos os outros. Isso é algo que precisa ser revisto", diz.
O professor prevê uma enxurrada de 'joyceanismo' para 2012-13. "Traduções, edições de manuscritos (cartas, cadernos), biografias, textos críticos baseados na análise direta dos romances, tudo vai ficar repentinamente facilitado. Tomara", diz.
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