Na telinha
A primeira telenovela de Francisco Cuoco foi Renúncia, de Walter Negrão, levada ao ar em 1965 pela TV Record. Era protagonista, ao lado da atriz Irina Grecco.
Também participou de telenovelas na Rede Tupi e na TV Excelsior, onde viveu o protagonista Dr. Fernando, em Redenção, ainda hoje recorde de permanência no ar, com 596 capítulos.
Transferiu-se para a Globo em 1970 e seu primeiro trabalho foi a telenovela Assim na Terra Como no Céu, de Dias Gomes, em que viveu um padre que abandona a batina para se casar, mas tem seus planos frustrados pela morte misteriosa da noiva.
Cuoco era um dos atores preferidos da diretora Janete Clair, que criou personagens que o consagraram como Cristiano, de Selva de Pedra; o jornalista Alex, de O Semideus; o taxista Carlão, de Pecado Capital; e, o misto de mocinho e vilão Herculano Quintanilha, de O Astro.
Francisco Cuoco já foi taxista, padre, jornalista, político e até quiromante de churrascaria. Isso nas inúmeras novelas em que foi protagonista. Na vida real, antes de sequer imaginar que seria ator, ajudava o pai na feira, pela manhã, e à noite estudava com a intenção de ser advogado. "Eu não gostava muito de Matemática para fazer Engenharia e Medicina era uma coisa muito complicada pra minha cabeça, então, tinha que optar mesmo pela advocacia", conta ao Caderno G.
Mas, as matinês de cinema com os primos, no bairro do Brás, onde morava, viraram sua cabeça. Os filmes produzidos pelas duas companhias cinematográficas da época, Atlântida e Vera Cruz, encantavam o futuro ator. "A gente embarcava no sonho, nas aventuras". Gostava principalmente das chanchadas feitas por Anselmo Duarte e do filme O Cangaceiro (1953), de Lima Barreto.
O filho de feirante italiano nem sabia muito bem o que era arte, mas decidiu que tentaria entrar naquele universo que tanto o fascinava. Abandonou temporariamente a vontade de estudar direito e matriculou-se na Escola de Arte Dramática, determinado a fazer parte da turma do cinema nacional. "Percebi que era um terreno fértil, bem fundamentado para poder chegar há algum lugar".
Foram quatro anos difíceis. "Começamos como 50 alunos e, no final, oito se formaram". A escola era um espécie de celeiro do Teatro Brasileiro de Comédia, o TBC, o mais importante da época. Era comum concluir o curso e ser convidado para fazer uma figuração ou um papel pequeno em peças encenadas por artistas consagrados, como Walmor Chagas e Cacilda Becker, e dirigidas por nomes como Ziembinski e Adolfo Celi.
Os pais do futuro galã de telenovelas não ficaram desapontados ao ver o filho trocar o anel de doutor pela arriscada profissão de artista e olha que ser ator, na época, não era coisa lá muito bem vista. "Meus pais eram do Brás, muito simples, e a gente tinha um entendimento de que cada um podia correr livremente em direção aos seus sonhos", conta.
Hoje, com quase 40 novelas, filmes e peças de teatro no currículo, Cuoco se sente um privilegiado por experimentar um pouco de cada profissão. "As profissões acabam se parecendo porque a gente entra na cena da vida com faces, máscaras e sentimentos", diz.
Teatro
O ator está embrenhado no teatro. Não abandonou as telenovelas a última de que participou foi Cobras & Lagartos, em que viveu o milionário avarento Omar Pasquim. Também ilustrou a trajetória dos coronéis da borracha na minissérie Amazônia, de Glória Perez. Mas, aos 73 anos, já perdeu a paciência de esperar a escalação quase futebolística das novelas. "A televisão é uma espera, por mais querida que a gente seja. Por isso, pretendo fazer cada vez mais teatro".
Longe dos palcos desde 1985, quando encenou Hedda Gabler, de Ibsen, com Dina Sfat, o eterno galã só voltou à vida nômade da profissão em 2005, quando abandonou a dedicação exclusiva de 20 anos à televisão e ao cinema para atuar com Gracindo Junior e Chico Tenreiro, na comédia de costumes Três Homens Baixos.
A parceria deu tão certo que, no ano seguinte, os três decidiram se unir outra vez no tablado. Desta vez, Gracindo Junior dirigiu a comédia O Último Bolero, do autor João Machado. A peça rodou pelo país por cerca de um ano e meio, mas a duras penas. O espetáculo foi aprovado pela Lei Rouanet, mas até hoje não conseguiu patrocínio. Diante da dificuldade, a peça encerra temporada hoje à noite, em Curitiba, "que sempre foi um centro importante de teatro", diz.
Isso não significa que o ator de origens simples, alçado ainda jovem à condição de galã nacional, tenha perdido a crença no teatro. "Ele nunca vai desaparecer, mas sempre vive na dificuldade. Porque é artesanal, dirigido a uma minoria que busca algo mais trabalhado na vertical". O protagonista das grandes telenovelas brasileiras falando mal da TV? Ele logo acrescenta, mas não se corrige: "A televisão é um canhão de mídia. A Globo tem excelentes momentos de novelas e minisséries, mas cada mídia tem uma linguagem própria. A televisão é mais apressada, redundante".
Na peça, Tenreiro e Cuoco interpretam dois viúvos "da terceira ou da quarta idade". Um está desiludido e melancólico após a morte da esposa, o outro (Cuoco) é um Don Juan que tenta levantar o astral do amigo. É com o espírito de seu personagem que Francisco Cuoco encara a vida. Ao ser questionado sobre a existência de bons papéis para atores de sua geração nos dias de hoje, ele não despeja o "cálice da amargura".
"O privilégio da profissão é que você tem papéis pra toda a vida. Tem o mocinho, o pai, o avô, o bisavô. É preciso passar por eles com uma certa naturalidade. Você vai se adequando ao seu tempo, à linha da vida, e pode vê-la em uma curva descendente ou que caminha para um infinito de uma maneira bonita. É claro que você não tem esse espírito o tempo todo, mas se isso for uma meta, a vida será mais leve".
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