São Paulo – A princípio, pode parecer um pouco demais, específico demais. Duzentas e cinqüenta páginas para falar de um disco de 45 minutos? Mas funciona muito bem. O ponto de partida, um foco específico, amplifica e dá coerência a todo o resto. Para estudar a origem, o resultado, os efeitos, a mitologia por trás de um dos melhores e mais importantes discos da história do jazz, Kind of Blue, de Miles Davis, de 1959, o autor espertamente começa contando suas próprias experiências, para depois contar a história do músico e suas inspirações até ali.

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Quando chegamos ao álbum propriamente dito, o trabalho de pesquisa e análise é impressionante. Está tudo ali: faixa a faixa, solo a solo, músico a músico, o lugar, a técnica de gravação, a foto da capa, o texto da contracapa, o marketing, as conversas internas da gravadora, os nomes das músicas, o momento histórico (no mesmo ano, pela mesma gravadora, foram lançadas outras duas pedras-de-toque do jazz: Time Out, de Dave Brubeck, e Mingus Ah Um, de Charles Mingus). Seria demais, não fosse o álbum o que é. Exatamente o próximo passo do livro, analisar suas conseqüências, sua repercussão, seu legado. Ao final, a compreensão surge não só do disco, mas do universo do jazz e da obra de Miles Davis.

Com texto leve e fluido, claro e direto, Kahn parte do mesmo ponto que todos que ouvem o disco: a magia que aconteceu nessas gravações é tão explícita que só aumenta a curiosidade e o fascínio que torna Kind of Blue dos mais vendidos e populares discos de jazz. Como diz o autor logo nas primeiras páginas, é um álbum que simplesmente tem "o poder de silenciar tudo ao seu redor". É o disco que você dá ao amigo que quer se iniciar no jazz, é o disco que você coloca quando quer criar o clima certo com aquela garota, é o disco especial que você empresta aos amigos que sabe que vão entender o recado.

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É o disco que você ouve e cada vez soa melhor. E é o disco sobre o qual vale a pena saber mais, que tem as histórias mais fascinantes por trás, que serve de parâmetro para o entendimento do que veio antes, do que surgiu depois. É o disco que torna um livro sobre ele algo de interesse genuíno, de leitura indispensável. É o disco que torna justificável escrever um clichê como, digamos, melhor do que ler a respeito, só mesmo tirá-lo da estante e colocá-lo na vitrola.

Serviço – Kind of Blue – A História da Obra-prima de Miles Davis. De Ashley Kahn. Editora Barracuda, 256 páginas, R$ 43.