Passado mais de meio século desde seu surgimento, On the Road Pé na Estrada, o livro emblemático da geração beat, escrito em 1957, parecia um desses casos perdidos de obra literária não adaptável ao cinema. Marlon Brando, Francis Ford Coppola, Jean-Luc Godard e Gus Van Sant, por razões diversas, não levaram adiante seus projetos. E foi, afinal, o brasileiro Walter Salles, um especialista em road movies (vide Diários de Motocicleta e Central do Brasil), quem encarou o desafio e transformou em belas imagens aquilo que parecia infilmável.
O resultado foi revelado ontem, no 65.º Festival de Cannes. Na Estrada, título definitivo para o lançamento no Brasil em 15 junho, com distribuição da PlayArte, foi apresentado quase na reta final do evento. Ao se apropriar do texto, Walter e seu roteirista José Rivera, também colaborador em Diários de Motocicleta (2004), dão a impressão de, deliberadamente, terem traído em diversos momentos o original de Kerouac, mas para melhor permanecerem fieis ao espírito libertário da obra. De fato, eles parecem reinventar o road movie nos EUA dos anos 1950, acompanhados por um formidável ensemble de atores.
A história desta trajetória pela imensidão americana, sempre regada a sexo, drogas, jazz e rock-and-roll, tem seu início logo após a morte do pai de Sal Paradise, aspirante a escritor e personagem alter ego de Jack Kerouac na narrativa literária, interpretado no filme por Sam Riley (Control). Paradise encontra Dean Moriarty (Garrett Hedlund, de Tron: O Legado), icônico poeta beat, casado com a sedutora e liberada Marylou (Kristen Stewart). Sal e Dean, conectados imediatamente, recusam uma vida convencional e conservadora. Cortam seus laços cotidianos e caem na estrada com Marylou. Sedento de liberdade, o trio sai em busca do universo, de outros encontros e de si mesmos.
Cult
Embora aplaudido com moderação, Na Estrada é dirigido com mão segura por Salles. Oscila entre a urgência e a contemplação, em uma dança incessante entre o ritmo que alucina e a reflexão sobre o ato de estar no mundo. É a típica obra instantaneamente cult, um convite irrecusável a uma aventura ao mesmo tempo visceral e intelectual. Com certeza Na Estrada não teria o mesmo carisma se o elenco fosse outro. Garrett Hedlund e Sam Riley têm uma química inegável para contar a história de uma amizade sólida. Kristin Stewart quebra paradigmas, dá seu melhor sangue agora sim, por uma causa justa e assume o posto de atriz talentosa e madura no papel complexo da beatnik Marylou.
Na coletiva de imprensa que se seguiu à exibição, Walter Salles situou seu filme: "É a história de uma amizade rompida, mas, ainda assim, maior que a vida. E é também um filme sobre um livro que está sendo escrito no calor de todos aqueles fatos e episódios que desfilam na tela. Busquei, além de ilustrar o texto da maneira mais adequada a esses tempos, contar como se produz um rito de passagem da juventude para a idade adulta."
Mas a melhor intervenção foi de Viggo Mortensen, que interpreta William Burroughs, escritor, pintor e um dos pioneiros da geração beat. Reconhecidamente lúcido e brilhante em suas observações, o Aragorn de O Senhor dos Anéis fez uma análise preciosa acerca da relevância da adaptação do clássico de Kerouac. Segundo ele, "o filme é de uma contemporaneidade única, ao propor o discurso sobre a questão da liberdade em todos os aspectos, mas, principalmente, de acordo com os ideários de cada pessoa." Sobre o ator, Walter não deixou por menos e afirmou que Mortensen deu importante contribuição na elaboração de seu personagem, oferecendo novas ideias e improvisando cenas, como aquela em que cita o poeta francês Louis-Ferdinand Céline (1894-1961) como vital para a compreensão dos anseios da cena beatnik.
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