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Brassaï era amigo de artistas e escritores que, assim como ele, tinham Paris como principal inspiração para criar | Valterci Santos/Gazeta do Povo
Brassaï era amigo de artistas e escritores que, assim como ele, tinham Paris como principal inspiração para criar| Foto: Valterci Santos/Gazeta do Povo
  • Para curadora, o fotógrafo desvendou uma Paris muitas vezes negligenciada
  • A luz do farol do carro era o único recurso de iluminação utilizado pelo fotógrafo
  • Montmartre, local preferido de Brassaï

No mais recente filme de Woody Allen, Meia-noite em Paris, o protagonista (Gil, interpretado por Owen Wilson), um roteirista de sucesso que quer se tornar escritor, enxerga na capital francesa a principal fonte de inspiração para um belo romance. Como num sonho, ele volta no tempo e se encontra com os maiores escritores e artistas de todos os tempos, entre eles Ernerst Hemingway, Pablo Picasso e o cineasta Luis Buñuel. É possível imaginar que Gil gostaria de ter cruzado com o fotógrafo húngaro Brassaï, que retratou a noite da Paris dos anos 1930 e frequentou este seleto círculo. A partir de hoje, será possível ver 97 imagens retratadas pelo fotógrafo na exposição Paris La Nuit (Paris à Noite - confira o serviço completo da exposição), que inaugura às 19 horas, no Museu Oscar Niemeyer (MON).

Trazida pela Aliança Francesa de Curitiba em parceria com a família de Brassaï, a mostra, com curadoria de Agnès de Gouvion Saint-Cyr, traz a Paris "não oficial". "São pessoas simples e os boêmios, fotografados numa época difícil economicamente para a França, que vivia o entreguerras. Mesmo assim, foi um período em que muitos artistas escolheram a cidade para viver e criar", diz a diretora da Aliança, Laure Gyselinck. Segundo a diretora do MON, Estela Sandrini, o ponto mais interessante da exposição é, justamente, este contexto da vivência cultural. "Cada imagem mostra toda essa movimentação em Paris."

A mostra, toda com fotos em preto e branco, se divide em dois eixos: imagens noturnas da cidade e a série "Prazeres", que retrata pessoas, prostitutas e ambientes do bairro boêmio Montmartre. Outro ponto interessante é a maneira como Brassaï iluminava as paisagens. Como gostava de fotografar o vazio da madrugada, os faróis de seu carro eram seu único recurso de luz. "Naquela época, a iluminação pública de Paris ainda era à gás. Nos planos das imagens, a paisagem é enxergada do ponto de vista do vazio", explica o coordenador de museologia do MON, Jacson Trierveiler.

Paris "desprezada"

Inspirado pelo fotógrafo francês Eugène Atget, o húngaro, segundo o texto de apresentação da exposição escrito pela curadora Agnès de Gouvion Saint-Cyr, se apaixona pelos indivíduos, pela arte bruta e pelas culturas primitivas, buscando a Paris "desprezada". "Ele desenvolve um gosto pronunciado pelo estranho, pelo diferente. Ele se assemelha a Atget na sua busca pela realidade, tenta transcender o real pelo surreal, segundo seus próprios termos, ao caçar na luz noturna da cidade uma Paris insólita, desconhecida."

A maneira peculiar de Brassaï registrar a vida noturna de Paris fez com que o escritor americano Henry Miller, também radicado em Paris na época, lhe desse o apelido de "o olho de Paris". "Este (Miller) se torna rapidamente seu alter ego. Inseparáveis, eles vagueiam de noite por toda a cidade, de Montparnasse a Montmartre, ida e volta, o que Miller descreverá muito propriamente na sua famosa obra Dias de paz em Clichy", relata a curadora no texto. O projeto que dá nome à exposição virou, em 1932, um livro homônimo de 64 fotografias. A estética ousada para a época foi uma revelação, já que, até então, ne­­nhum fotógrafo fora audacioso o suficiente para registrar a penumbra e a escuridão. O sucesso com o livro coloca-o em contato com revistas de arte famosas e ele inicia uma colaboração de 30 anos para a mais antiga revista de moda americana, Harper´s Bazaar.

Brassaï também tornou-se íntimo do pintor espanhol Pablo Picasso, a quem foi apresentado logo após o lançamento de seu livro. O entendimento entre os dois levou o húngaro a fotografar obras de Picasso até os anos 1960. Desta amizade, surgiram as obras As Esculturas de Picasso e Conversas com Picasso, onde há o mais conhecido retrato de Picasso em seu ateliê. A cumplicidade era tanta que, de acordo com texto de Agnès, o pintor cobrava do fotógrafo o fato de ele não desenhar mais, dizendo que ele tinha o dom e não o explorava. Os conselhos do amigo levaram Brassaï a se dedicar também à pintura, ao desenho, à escultura e ao cinema. Seu filme, Tant Qu’il y Aura des Bêtes, foi premiado no Festival de Cannes em 1955.

Trajetória

Nascido em 1899 em Brasso, na Transilvânia (parte da Romênia, que estava sob domínio austro-húngaro), e batizado como Julius Halasz, Brassaï era fascinado pela língua francesa, influência do pai, professor de francês. Esteve em Paris pela primeira vez aos quatro anos de idade e jamais esqueceu o que viu. A Primeira Guerra Mundial (1914–1918) adia o sonho de ir estudar na França, já que é ele é proibido de viver no país, como todos os cidadãos de países inimigos. Vai para Berlim em 1921 e faz cursos na Academia de Belas Artes, onde fica por três anos. Chega a Paris em janeiro de 1924 e se dedica a estudar a língua francesa. Para sobreviver, faz charges para jornais franceses e alemães, além de colunas para revistas húngaras. Torna-se conhecido com o projeto Paris à Noite e passa a se dedicar a outras artes. Fica na capital até sua morte, em 1984.

Serviço

Paris La Nuit (Paris à Noite - confira o serviço completo da exposição), de Brassaï. Inauguração hoje, às 19 horas. Entrada franca. Museu Oscar Niemeyer (R. Marechal Hermes, 999). De 3ª a dom., das 10 às 18 horas. R$ 4 e R$ 2. Até 22 de agosto.

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