Entrevista
"A crônica é a jabuticaba da literatura"
Como foi feita a escolha dos textos para este livro?
A edição ficou a cargo do jornalista e professor Christian Schwartz, que por acaso é meu vizinho e também atleticano. Ele fez de tudo para esconder meus defeitos! E tem mais: o livro é ilustrado pelo Benett, um toque especial à edição. Em suma, o cronista está cheio de álibis neste livro!
Mesmo com uma consagrada carreira literária, há uma "emoção" especial em ser cronista de jornal diário?
A crônica é o gênero mais difícil que já enfrentei. Primeiro, porque sou um falso cronista comecei com 55 anos! Sofri para entrar no espírito da coisa, porque nunca tive experiência jornalística, e um detalhe que percebi em pouco tempo é que a literatura nem sempre é boa conselheira para uma crônica. Há um toque especial naquelas poucas linhas que não se aprende com poesia ainda que, às vezes, ela seja útil para o cronista
Há quem diga que a crônica é um gênero menor. E também quem pense que a crônica é o mais brasileiro dos gêneros. O que você acha?
Parece que há alguma coisa tipicamente brasileira na crônica de jornal, uma espécie de jabuticaba dos gêneros literários. Essa mistura de literatura, jornalismo, poesia e conversa fiada, tudo em poucas linhas, só teria germinado aqui no Brasil. É possível, e faz sentido. O fato de ser um gênero "menor" ou "maior" não me preocupa. O que eu sei é que ela de fato pertence ao reino da literatura, mas como parente próximo, quem sabe bastardo, ou um primo aproveitador que pega roupa emprestado e às vezes brilha mais que o dono. Alguns cronistas conseguem ser fortemente literários, cada um a seu modo, mas em todos os casos, na crônica ninguém é uma coisa só. A crônica aproveita-se da literatura para dar o seu pulo, mas poucas vezes se confunde com ela.
Cristovão Tezza, escritor e cronista da Gazeta do Povo
O escritor Cristovão Tezza lança hoje seu novo livro, Um Operário em Férias, às 19 horas, na Livraria Arte & Letra, em Curitiba. A obra é uma antologia de cem crônicas escolhidas entre as publicadas por Tezza na Gazeta do Povo às terças-feiras, desde 2008.
Para o autor, a ideia de reunir os textos em um livro deve-se à "força do gênero, que não está propriamente no fato em si que relata, mas no seu modo de olhar, no seu estilo. Espero ter sobrevivido", diz.
Tezza conta que levou em consideração o fato de que as crônicas, às vezes, se referem a assuntos do noticiário que podem envelhecer rápido para a perenidade de um livro.
"Faz parte do DNA das crônicas o seu toque passageiro, o comentário do dia, a referência política, etc. Mas achei que a seleção das crônicas para o livro conseguiu contornar essa limitação, escolhendo preferencialmente os textos menos datados".
O autor também acredita que o gênero é o mais brasileiro da literatura e revela ter lido crônicas "a vida inteira". "Lembro dos clássicos da minha geração, Paulo Mendes Campos e Rubem Braga, e, no campo político, Carlos Heitor Cony. Mais tarde, Luis Fernando Verissimo virou referência obrigatória pelo seu fantástico toque de humor", revela.
Atualmente, ele destaca os curitibanos Luís Henrique Pellanda e José Carlos Fernandes (também cronista da Gazeta do Povo) como expoentes do gênero.
"Recentemente a crônica tem ganhado tonalidades mais diretamente políticas ou mesmo ensaísticas, mas mantendo sempre alguma ligação com suas formas clássicas o tom informal e a imensa liberdade estilística", analisa.
"Curitibanices"
A seleção dos textos de Um Operário em Férias foi feita pelo jornalista e tradutor Christian Schwartz que, entre um universo de 250 textos, escolheu cem e os dividiu em sete temas recorrentes nas crônicas do autor. Os capítulos são nomeados com com os títulos "A Vida É Sonho", "Viagem pela Leitura", "Vida de Torcedor", "Terça-feira", "Curitiba no Divã", "De Volta à Vida Real" e "Ficções".
"Localizei aqueles temas que pareciam tocar o cronista, esse observador do cotidiano, em seu próprio dia a dia", explica Schwartz. "Temas como ser escritor, viagens, futebol, rotina, Curitiba, atualidades, além de breves ficções no espaço limitado do jornal me pareceram muito marcantes, facilmente reconhecíveis", explica.
Schwartz conta ainda que privilegiou um "critério basicamente cronológico, datado (no bom sentido), a própria definição de crônica" em cada uma das seções do livro. As crônicas trazem a data de publicação e, sempre que necessário, um comentário contextualizando o tema sobre o qual ela foi escrita. O livro, que terá lançamento nacional pela editora Record, traz também algumas notas de rodapé para explicar certas "curitibanices" expressas nos textos para leitores de todo o país.
Cada capítulo é ilustrado pelo cartunista Benett, da Gazeta do Povo. "Sou um grande fã e leitor do Tezza, desde que li Trapo [1988]. Fiz as ilustrações com esmero redobrado. Foi um dos trabalhos que mais me deram prazer nos últimos tempos", conta.
Programe-se
Sessão de autógrafos
Com Cristovão Tezza. Livraria Arte & Letra (Al. Pres. Taunay, 130, Batel), (41) 3039-6895. Hoje, a partir das 19 horas. Entrada franca.