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Fundador e diretor do On Think Tanks (onthinktanks.org), instituição britânica que funciona como um observatório global da atuação dos think tanks na internet, Enrique Mendizabal também é ex-pesquisador da área da América Latina e do Caribe no Overseas Development Institut (ODI), instituto bretão que atua no desenvolvimento internacional e causas humanitárias. Confira a seguir uma entrevista com o pesquisador, concedida por e-mail à Gazeta do Povo, diretamente de Londres:

Como funciona o On Think Tanks e porque você resolveu criá-lo?

Os think tanks estão por aí há muito tempo. Ainda que o termo seja associado com centros de pesquisa dos Estados Unidos e do Reino Unido, países de todo o mundo têm suas próprias versões locais. Dois bons exemplos no Brasil são a Fundação Getulio Vargas (FGV) e o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Nenhum deles é um think tank tradicional. A FGV combina pesquisa com academia e o Ipea é um centro de pesquisa pública. O objetivo do nosso blog é estudar e explicar essas diferenças para ajudar os think tanks a serem mais eficientes.

Geralmente, as pessoas assumem que os think tanks precisam ser parecidos com o Brookings Institution (entidade americana sem fins lucrativos que desenvolve soluções políticas inovadoras), mas a verdade é que eles são muito diferentes em cada país e, mesmo dentro do mesmo país, há diferenças. Não há, infelizmente, muitas fontes de análise independentes e conselhos para reflexão. Vejo que o nosso On Think Tanks preenche uma lacuna importante.

Qual é o papel dos think tanks na agenda pública do século 21?

O papel tem mudado. Não é possível dizer que todos os grupos de instituições desempenham as mesmas funções. Alguns pensam que os think tanks são particularmente valiosos na identificação de questões ou problemas, outros são muito melhores em fazer recomendações políticas (ou escolhas), outros abrem e mantêm espaços para debate sobre questões que poderão ser demasiadamente controversas para outros contextos. Um papel em muitos países em desenvolvimento, muitas vezes esquecido, é treinar as futuras gerações de agentes políticos e formuladores de políticas públicas. Jovens mentes brilhantes que passam por estes institutos muitas vezes usam suas habilidades a serviço de partidos políticos, funcionalismo público e da mídia.

Outro papel importante no século 21 é agrupar e dar sentido a toda a densidade de informações que circulam por aí. Com mais e mais informação, disponível 24 horas por dia, os responsáveis políticos, os meios de comunicação, as corporações e outros, não é possível se manter atualizado com as ideias mais recentes. Os think tanks podem filtrar as informações e traduzi-las em ideias úteis e relevantes para a ação. Isso significa que eles tanto podem afetar a política de nível elevado, bem como as ideias e discursos do público em geral.

Poderia citar um exemplo da atuação recente de think tanks interferindo na agenda política ou mudando a vida das pessoas?

Há muitos exemplos, mas é difícil atribuí-los apenas aos think tanks. Enquanto muitas ideias importantes que afetam a vida de muitas pessoas ao redor do mundo foram colocadas na conta das usinas de conhecimento, elas não brotam lá sozinhas. Eles foram, provavelmente, a consequência da interação de muitos jogadores diferentes. Na América Latina é possível dizer que os think tanks chilenos ajudaram a transformar a oposição a Pinochet em uma força coerente e seus pesquisadores forjaram com suas ideias as circunstâncias que tornaram possível a Concertación (coalizão eleitoral de partidos de centro-esquerda) na década de 1990.

Neste caso, os think tanks cederam espaço para o debate de pessoas importantes. A bem conhecida teoria da dependência, que surgiu na América Latina nos anos 60 e 70, teve seus toques finais dados na Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL) por pesquisadores do Chile, Argentina, Brasil e outros países. Um desses pesquisadores foi Fernando Henrique Cardoso que passou a ser presidente do Brasil.

Do outro lado do espectro político, no Reino Unido, muitas das ideias implementadas por Margaret Thatcher foram desenvolvidas no Instituto de Estudos Fiscais. Suas políticas têm efeitos importantes em todo o mundo nos anos 80 e 90.

Como os think tanks transformam seus "produtos" em capacidades políticas e organizacionais?

Estes grupos de reflexão, particularmente em países em desenvolvimento, lutam para transformar seus produtos (conselhos) em capacidades políticas e organizacionais (ações). Nos países em desenvolvimento, isto é particularmente difícil, porque os principais atores políticos são fracos. Às administrações públicas e aos partidos políticos, muitas vezes, falta a capacidade analítica e programática, a mídia não tem jornalistas suficientemente especializados, as ONGs não têm pesquisadores de nível, etc.

Como consequência, eles não podem apenas publicar suas pesquisas e esperar que o conteúdo será compreendido e usado. Em vez disso, desenvolvem estratégias de comunicação mais ativas e treinamentos para explicar como usar seus conselhos, se envolvendo em experiências e seminários com os governos locais para lhes mostrar como as coisas poderiam funcionar.

Não há uma receita pronta e cada grupo de reflexão tenta encontrar a melhor maneira para chegar a este resultado. E por isso é interessante estudá-los.

Como se dá a relação destes institutos e o público leigo, as pessoas comuns?

Think tanks são como os "peões" da elite, como legitimadores de governos, partidos ou interesses privados. Estes são créditos válidos, mas não representam toda a comunidade.

Em geral, podemos dizer que os think tanks precisam de outros atores mais do que outros atores precisam deles. Precisam da academia para fornecer um fluxo constante de bons pesquisadores e conceitos teóricos, precisam de partidos políticos fortes e corpos de formulação de políticas para se envolver com eles e apresentá-los, com questões políticas para responder. Precisam também de corporações e filantropos profissionais para apoiar o seu trabalho a longo prazo, uma mídia forte para comunicar suas ideias para o público em geral e claro, um público educado para compreendê-los e envolver-se com eles.

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