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Fábio Elias, João Egashira e Hélio Brandão: músicos que sentem necessidade de se apresentar em público com alguma frequência | Aniele Nascimento/Gazeta do Povo
Fábio Elias, João Egashira e Hélio Brandão: músicos que sentem necessidade de se apresentar em público com alguma frequência| Foto: Aniele Nascimento/Gazeta do Povo

Acordes - Sugestões para uma renovação na cena cultural curitibana

Hélio Brandão, 51 anos, João Egashira, 38, e Fábio Elias, 34, a convite da Gazeta do Povo, sentaram-se ao redor de uma mesa no café do Paço da Liberdade, no centro de Curitiba, na última quarta-feira (30). Durante duas horas, conversaram a respeito da realidade do mercado, para quem, como eles, vive de música.

Brandão é jazzista, mas também transita por veredas eruditas e populares. Egashira é bamba, toca chorinho e muita bossa. Elias aposta na música sertaneja, depois de duas décadas de rock-and-roll.

Em comum, eles analisam que as oportunidades para o músico em Curitiba melhoram ano após ano, apesar da situação estar distante do ideal. "É preciso brigar sempre por melhores condições, seja de cachê, bom tratamento e demais direitos", diz Egashira.

Brandão conta que há público para todos os gêneros. Uma manhã, ele se apresentava na rua, em uma feira e, de brincadeira, colocou um boné no chão, sugerindo que o público jogasse moedas. Um mendigo se aproximou. O músico pensou que o sujeito fosse passar a mão nos trocados. "E não é que o mendigo tirou uma moedinha e jogou dentro do boné", conta o músico, que ficou desconcertado. "Há público sempre, em todo lugar, disposto a pagar pelo show", afirma.

Os três sugerem que seja implementada em Curitiba, pelo poder público ou pela iniciativa privada, uma universidade, com espaço para o ensino e a pesquisa de rock-and-roll, choro, jazz, música clássica e contemporânea.

Todo músico já se apresentou ou ainda irá se exibir no palco de algum bar. É como o teste do pezinho para os bebês ou o exame da próstata para aqueles que caminham em direção à meia-idade. Não tem como escapar. Natural­­mente, a experiência pode agradar a gregos e franzir o cenho de baianos.

Em Curitiba, o cachê varia de R$ 7 a R$ 500, mas a média está entre R$ 100 e R$ 150 por quatro horas de exibição – os R$ 7 seriam o valor de uma única entrada, no caso de o local hipotético receber durante a noite apenas um cliente. O cachê médio, algo em torno de R$ 125, é – nas palavras do saxofonista Hélio Brandão – a realidade e o espelho da cultura da cidade e de como os curitibanos não valorizam o trabalho de um músico.

Brandão, no entanto, não reclama. Durante as últimas três décadas, período em que atua como profissional, ele sempre procurou, e encontrou, oportunidades para se apresentar pelo menos uma vez por semana em algum bar da cidade. Atual­­mente, é atração fixa às quartas-fei­­ras, no Blues Velvet (R. Trajano Reis, 314), e aos sábados, no Original Beto Batata (R. Prof. Brandão, 678). O músico diz sentir necessidade de tocar ao vivo, para "manter a forma" e pelo contato com o público.

João Egashira, a exemplo de Hélio Brandão, gosta de fazer música ao vivo em bares e não faz do cachê do bar a sua única fonte de renda. Egashira dá aulas de violão, participa de projetos variados, arranja e grava álbuns com outros artistas e não reclama do dinheiro que recebe quando toca chorinho nos bares curitibanos.

A remuneração pelas apresentações em bares foi um dos motivos que fez com que Fábio Elias investisse em uma carreira-solo. Depois de duas décadas à frente da Relespública, respeitada banda de rock de Curitiba, ele suspendeu as atividades do conjunto e radicalizou. No dia 9 de julho, Elias sobe ao palco da Vanilla (R. Mateus Leme, 3.960) para, pela primeira vez, apresentar em Curitiba o show inspirado no álbum de repertório sertanejo Me Dê um Pedaço Teu, que levou mais de 20 mil pessoas a apresentações em Ponta Grossa, Cascavel e Foz do Iguaçu. Agora, o cachê (que ele não revela) é bem maior do que quando se apresentava com a Reles.

Burburinhos

Brandão observa que, atualmente, Curitiba tem restaurantes para todos os gostos e bolsos, mas, lamenta, a mesma variedade e diversidade não dizem respeito à música. A população aumentou sim. Hoje, a grande Curitiba soma quase 2 milhões de habitantes. Mas, apesar disso, o músico constata, desanimado, que não há qualquer bar em que o público possa apenas sorver música.

"Tem gente que diz: ‘A música no bar estava boa, dava até pra conversar’. É um absurdo. Ninguém vai ao cinema e diz: ‘O filme é bom, dava até para conversar", reclama, referindo-se ao fato de que a música costuma ser um "acessório" ou "pano de fundo" para paquera e ingestão de bebida alcoólica.

Brandão verbaliza o que muitos músicos, como Egashira e Elias, prezam: respeito.

Ou seja, não é apenas o valor do cachê que motiva, mas as condições gerais de trabalho. "Tem bar em que o cachê é de R$ 400, mas o dono desrespeita o músico, não oferece água e faz cara feia. Prefiro me apresentar até por um valor menor se o tratamento for digno", afirma.

O experiente músico analisa que cachê de bar é algo mais real, comparado, por exemplo, com verbas de editais e de leis de incentivo. "Por que o cachê de bar é dinheiro que sai do bolso de quem quer escutar, passa pelo dono do negócio e chega ao músico", argumenta.

Elias, por sua vez, lembra que toda vez que é publicada matéria em jornal, "principalmente na Gazeta do Povo", no dia seguinte já "chove" propostas para shows e não é incomum aumentar o valor do cachê. "Tomara que a nossa segunda-feira (amanhã) seja próspera", dizem os três, com sorrisos nos rostos.

Interatividade:

Você frequenta bares para ouvir música ou para namorar e beber? Já se incomodou com o burburinho e as conversas durante uma apresentação musical em um bar?

Escreva para:leitor@gazetadopovo.com.br

As cartas selecionadas serão publicadas na Coluna do Leitor.

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