Incrível como são populares ficções sobre a vida de Jesus, sejam focadas em sua infância, na "verdadeira relação com Maria Madalena" ou até na vida após a "não crucificação" como mostra A Última Tentação de Cristo, clássico do cinema com Willem Dafoe (1988) baseado no romance de Nikos Kazantzakis (1951). O público fica em polvorosa: na versão cinematográfica do best seller O Código da Vinci, era possível ouvir espectadores comentando: "Puxa, não sabia que tinha sido assim"...
Nas mãos do consagrado autor irlandês Colm Tóibín, o tema rendeu O Testamento de Maria, em que aquela que para os católicos é mãe de Deus é completamente despida da aura divina e transformada numa mulher que envelhece desiludida pelo fim trágico do filho, que ela apenas sonha ter ressuscitado.
Antes da morte na cruz, é dilacerante acompanhar sua (falta de) comunicação com o filho, que acaba quando ela falha em convencê-lo a desistir de sua missão. Indo embora com uma caravana, Maria percebe o risco de ser mãe daquele que viria a chamar a atenção de tantos como Messias.
Tudo isso ela relembra como que num desabafo antes da própria morte. Conta que, na crucificação, nem ela nem os discípulos ficam até o fim, e depois ela passara a ser protegida e ao mesmo tempo vigiada pelos seguidores do filho. Dois deles, nos anos seguintes, já em Éfeso (hoje Turquia), pretendem colher dessa mulher detalhes sobre a vida pregressa de Cristo. Querem dela memórias que já se misturam a fantasias, mas que ela reluta a entregar.
Um ponto forte do livro é a poesia da linguagem, que deixa o caminho aberto para a imaginação como no período que a protagonista passa escondida, num torpor em que mistura realidade e alucinação. Por isso, o livro simula um testamento e não um evangelho, já que, aqui, Maria não acredita em seu filho como filho de Deus. Sobre a anunciação, quando um anjo, de acordo com os evangelhos, avisara sobre a gestação milagrosa, ela se cala.
Há também a descrição de marcantes cenas da época (estamos 20 anos após a crucificação), como uma luta entre uma águia e coelhos. O que espanta é a liberdade poética em relação a hábitos que seriam adotados séculos depois. O menino Jesus se "trancava em seu quarto", em cuja porta Maria batia; a família "comia à mesa, sentada em cadeiras". Lázaro foi "enterrado sob a terra", não numa caverna.
Monólogo
O livro foi levado à Broadway em abri, num monólogo de 90 minutos, com o mesmo nome, causando protestos fervorosos de religiosos. A adaptação para o teatro foi feita pelo próprio Tóibín e o papel entregue a Fiona Shaw, a tia Petúnia na saga Harry Potter.
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