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A presença de Roberto Carlos na mídia no fim de 2006 foi além do especial da Globo. Dias antes, o historiador e jornalista Paulo César de Araújo, 44 anos, lançava o livro Roberto Carlos em Detalhes, fruto de 15 anos de pesquisas – 13 por conta própria, o que lhe custou a perda de um emprego, a privação da família e um processo do próprio Rei. Mas quando perguntado sobre o resultado, Araújo nem pensa em arrependimento. "Se a obra dele não fizesse parte da minha vida, não teria me dedicado assim."

Se na opinião de Araújo o livro – resultado de uma pesquisa profunda com 200 entrevistas e um sem-fim de fontes bibliográficas em quase 500 páginas e que está na segunda edição (60 mil exemplares) – é apenas o começo do preenchimento do buraco na historiografia sobre Roberto Carlos (ler entrevista), ao menos em seu próprio metiér o Rei nunca deixou de ser referência. A lista de músicos e bandas que bebem da fonte do filho mais ilustre de Cachoeiro do Itapemerim (ES) não é pequena.

No rock, isso vai muito além do óbvio, de bandas já consagradas que o regravaram, como Skank ("É Proibido Fumar"), J.Quest ("Além Do Horizonte"), Ira! ("Você Não Serve Pra Mim"), Titãs ("É Preciso Saber Viver"), Chico Science & Nação Zumbi ("Todos Estão Surdos") e até os punks argentinos do Attaque 77 ("Amigo"). Roberto segue inspirando jovens que nem sequer pensavam em existir na fase áurea de sua carreira, da Jovem Guarda à virada dos 60 para os 70, quando as letras maduras se uniram à batida black.

Para o jornalista Fernando Rosa, 52 anos, editor do principal veículo sobre rock brasileiro, a revista eletrônica Senhor F, Roberto Carlos continuará sendo gravado daqui 100 anos. "É como Beatles, Beethoven, é um clássico. Ninguém traduziu de forma tão simples as coisas do dia-a-dia. Ele conseguiu fazer um verbo bobo como ‘eu te amo, eu te amo, eu te amo’ algo incrível", ressalta. Fernando diz que ver bandas undergrounds em início de carreira cantando Cavalgada (1977) é um sinal de que os novatos estão no caminho certo.

Um das bandas recentes que assume essa influência é a pernambucana Mombojó. O grupo tem, segundo o tecladista Chiquinho, 23 anos, pitadas de Roberto Carlos não só nas letras. "Sou muito fã do Lafayette (tecladista do Rei nos anos 60 e 70). Nas letras também pegamos essa influência porque o Roberto fala de uma forma singela e direta".

A devoção é tanta que Chiquinho, com outros quatro integrantes do Mombojó mais China, ex-vocalista do Sheik Tosado, formou o Del Rey só para tocar clássicos do cantor. "Primeiro tocamos na formatura de uma amiga e tínhamos só dez músicas. Hoje tocamos 30", diz. Entre os ambientes em que se apresentam estão casamentos e bodas de prata.

A mesma idéia tiveram seis músicos do Rio de Janeiro das bandas Autoramas, Acabou La Tequila, Canastra e Carbona que se juntaram ao lendário tecladista Lafayette, cujas habilidades à frente de um Hammond se transformaram na marca da Jovem Guarda. Conforme explica o guitarrista Gabriel Thomaz (Autoramas), o que era apenas brincadeira virou coisa séria – além de Roberto, eles tocam outras músicas da Jovem Guarda, como as de Wanderléa e Erasmo Carlos. Nascia o Tremendões. "Fizemos três shows. Mas sentíamos falta do teclado", afirma Gabriel.

Após buscar e não achar nada parecido com o timbre de Lafayette, Gabriel se arriscou: por que não convidar o próprio? "Levei todos os discos dele para autografar e fiz o convite. Ele topou um ensaio e estamos aí". Desde então, o grupo, agora Lafayette e os Tremendões, faz shows em teatros do Rio e está atualmente nas telas. Em A Grande Família – O Filme eles tocam no baile dos personagens Lineu e Nenê. "É um orgulho enorme podermos tocar com ele", ressalta Gabriel.

Os também fluminenses do The Feitos optaram por outra forma de homenagear o Rei. Na canção "Disco do Roberto", o trio de Niterói relata de forma bem-humorada uma desilusão amorosa em que a briga pela partilha dos poucos bens da casa é o carro-chefe. "Esse disco do Roberto é meu / Leve só o que for seu", conta o refrão. "Assim como o Roberto, me baseei em relacionamentos comuns. E o Roberto fala muito bem de amor, seja do lado bom ou ruim", argumenta.

Para 2007, além do lançamento do primeiro CD, que deve ter "Disco do Roberto" como música de trabalho, Ramon diz ter planos "pequenos". Ao encontrar com Erasmo em um programa de tevê, ele deixou com o Tremendão dois CDs – um para ele e outro para o Rei. "Depois que ele cantou funk no especial, por que não pode cantar nossa música?", brinca Ramon.

Dificuldade

Admitir influência de Roberto Carlos nem sempre foi visto com bons olhos. Que o digam os gaúchos da Graforréia Xilarmônica, que em dezembro lançaram disco ao vivo. Conforme explica o baixista e vocalista Frank Jorge, quando a banda começou, em 1987, o rock era ditado por influências de fora. "Vencíamos esse preconceito (contra a obra de Roberto) pela convicção, mas deixando sempre um saldo de ‘grupo de caras esquisitos’, o que de certo modo é positivo", comenta.

Em sua nova empreitada, como professor do curso de Formação de Produtores e Músicos de Rock da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos), a obra de Roberto Carlos será um dos temas principais das aulas na cadeira de História do Rock. "O Roberto foi fundamental para uma linguagem própria do rock nacional", sintetiza Frank. Em se tratando do Rei, assunto não vai faltar nas aulas.

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