A norte-americana Stacey Kent não impõe seu estilo ao mesmo tempo suave e intenso no álbum The Changing Lights| Foto: Divulgação

CD

The Changing LightsStacey Kent. Warner Music. Preço médio: R$ 29,90. Jazz.

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Quando, em setembro de 2012, a cantora norte-americana Stacey Kent conversou por telefone com a reportagem da Gazeta do Povo, ela se preparava para uma turnê brasileira, que chegaria a Curitiba no fim de novembro daquele ano. Preferiu falar apenas em português, exceto por uma ou outra palavra, da qual não conseguia se lembrar, e acabava saindo em inglês.

A destreza da artista em nosso idioma, adquirida graças a anos de estudo, tem uma explicação: "Sou apaixonada pelo seu país, pela música brasileira", disse ela, ao lembrar que, aos 14 anos, quando morava no estado de Nova Jersey, sua terra natal, teve uma espécie de epifania ao ser apresentada por um amigo a Getz/Gilberto. O álbum, lançado em 1962 pelo músico norte-americano Stan Getz, foi responsável por revelar ao mundo – e a Stacey – a extraordinária musicalidade de João e Astrid Gilberto e, é claro, de Tom Jobim. A cantora nunca se recuperaria desse abalo. Ainda bem.

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A paixão de Stacey por nossa música só se torna mais evidente no novo álbum da cantora, The Changing Lights, no qual ela estreita essa relação, dando um passo à frente. O tom quase reverencial, ainda perceptível em trabalhos anteriores da artista, hoje com 46 anos, cede agora lugar a um esforço de recriação.

Com sua voz suave, intimista, ainda assim muito precisa, Stacey Kent se apropria de "This Happy Madness", versão de "Estrada Branca" (1958), composição de Tom Jobim e Vinicius de Moraes, com letra em inglês de Gene Lees. É como se sempre tivesse sido dela a canção, que se inicia como uma balada, em tom de pé de ouvido, para ganhar embalo de samba-bossa, subvertendo as expectativas de quem a ouve.

Stacey não escapa dos standards "One Note Samba" e "How Insensitive", versões, respectivamente, de "Samba de uma Nota Só" (Tom Jobim e Newton Mendonça, de 1959) e de "Insensatez" (Jobim e Vinicius, 1961), mas não o faz de forma burocrática. Como no caso de seu canto, e das roupagens musicais que essas canções recebem, menos é sempre mais, nada sobra.

A responsabilidade por essa sonoridade em que altas dosagens de musicalidade são concentradas em pequenas cápsulas, sem grandes arroubos ou rompantes, sejam eles vocais ou instrumentais, é compartilhada com o saxofonista britânico Jim Tomlinson, que além de marido da cantora, é produtor do álbum e arranjador de todas as faixas. À exceção de "O Barquinho", que ficou ao encargo de um de seus compositores, Roberto Menescal, que a criou com Ronaldo Bôscoli, em 1961.

Jim Tomlinson também é compositor, e assina algumas das canções do disco, como a faixa-título, feita em parceria com o escritor nipo-britânico Kazuo Ishiguro, autor do romance Vestígios do Dia. Os dois assinam outra faixa, também de levada bossanovista: "Waiter, Oh Waiter". Com o português Antônio Ladeira, o saxofonista compôs as mais líricas "Mais uma Vez" e "A Tarde", ambas interpretadas em português, que fogem um tanto da atmosfera do álbum, mas são belas amostras do que Stacey pode fazer em outro registro.

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Para os fã curitibanos, uma boa notícia: quem assistiu ao show de Stacey no Teatro Positivo em fins de 2012 vai reconhecer boa parte do repertório de The Changing Lights. GGG1/2