Dois extremos: A fotografia tirada em 14 de janeiro deste ano mostra o homem mais alto do mundo ao lado do mais baixo, ambos citados pelo livro Guinness World Records. Sultan Kösen, da Turquia, mede 2,46 metros, enquanto o chinês Pingping, morto em março passado, aos 21 anos, media 74,6 centímetros| Foto: Mustafa Ozer/AFP

O Guinness Book – O Livro dos Recordes Mundiais pode ser considerado o antecessor natural do YouTube. O livro, criado há 55 anos pela cervejaria irlandesa Guinness, almejava se tornar obra de referência para elucidar discussões de boteco – e assim fazer com que os frequentadores dos pubs passassem mais tempo bebendo que brigando.

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As vendas e o interesse dos leitores, entretanto, ultrapassaram os bares de subsolo irlandeses, atraindo virtuoses, aberrações e malucos profissionais, que disputam espaço no Guinness realizando feitos como manter o maior bigode do mundo (3,5 metros de envergadura, do indiano Ram Singh Chauhan) ou formar a maior coleção de bichos de pelúcia (4.405 itens, da americana Deb Hoffmann).

Os mecanismos de atração que impulsionam pessoas em todo o mundo a dedicar sua vida à fama pueril são investigados pelo jornalista norte-americano Larry Olmsted em Tudo para Entrar no Guinness – A Jornada de um Homem para Entrar no Livro dos Recordes.

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Olmsted, repórter free-lancer de uma dezena de publicações em língua inglesa, entrelaça a experiência própria anunciada no título às histórias em torno de algumas "celebridades" para tentar desvendar a popularidade do Guinness Book, ele próprio um recordista (o livro com direitos autorais mais vendido do mundo: 100 milhões de exemplares, em 37 idiomas).

Olmsted, que é apaixonado por golfe, se propôs a tentar quebrar algum recorde relacionado ao esporte. Como a maioria dos recordes sérios pertence ao insuperável Tiger Woods, o jornalista optou pelo incomum e se tornou o golfista que jogou, em um mesmo dia, duas partidas com a maior distância entre elas. No início da manhã, estava ele em um campo da Austrália. Assim que terminou os 18 buracos, pegou um voo comercial, rompeu a linha internacional de mudança de data e disputou uma segunda partida em Los Angeles – a 12 mil quilômetros de distância – que acabou ao final da tarde, quase junto com a luz natural da costa oeste americana. Entusiasmado com o sucesso, meses depois, Olmsted quebraria outro recorde: permaneceu 72 horas consecutivas jogando pôquer.

Leitor assíduo do Guinness, que descreve como uma das mais importantes literaturas de sua adolescência, Olmsted percebe que a atração pelo livro decorre da mesma vontade de reconhecimento que motiva, por exemplo, participantes de reality shows. Ele próprio se confessa envaidecido ao ver sua foto publicada na edição impressa do livro, que reúne apenas 10% dos recordes registrados pela editora; e decepcionado ao ver que a proeza havia sido superada no ano seguinte.

Essa paixão constitui o que Tudo para Entrar no Guinness tem de melhor, e também o que tem de pior. Fã confesso da compilação de recordes e de tudo o que isso representa para as pessoas que dela participam, Olmsted peca pela falta de ironia com que trata os relatos do livro tornado fenômeno social. Não por acaso, seu herói favorito é o norte-americano Ashrita Furman, o recordista dos recordes: ao longo da vida, estabeleceu ou quebrou 177 deles, inclusive o de velocidade ao empurrar uma laranja com o nariz (1 milha, ou 1,7 km, em 23 minutos). "O acontecimento específico não tem importância desde que dê a você a capacidade de dançar no limite de sua capacidade", diz Furman, ainda que o talento seja a leitura contínua das obras completas de Shakespeare (5 dias, pelo inglês Adrian Hilton). GGG

Serviço: Tudo para Entrar no Guinness, de Larry Olmsted. Tradução de Alexandre Martins. Ediouro, 256 págs., R$ 39,90.

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