O Subcomandante Marcos é uma das figuras mais emblemáticas da América Latina atual. Identidade secreta, máscara no rosto, ele é presumivelmente um ex-professor que decidiu se rebelar contra o governo mexicano. Uniu-se aos índios e pobres de Chiapas, a região mais miserável do México, e lidera o Exército Zapatista de Libertação Nacional, que chegou a pegar em armas para defender os direitos dos menos favorecidos.
Embora hoje leve uma vida de revolucionário, com tudo o que isso implica, Marcos parece nunca ter esquecido os anos universitários que, segundo suas tentativas de biografia, ele teria cursado. E quer também se mostrar ao mundo como escritor e intelectual. Dono de um estilo já famoso, decidiu agora publicar um romance. Como se isso não fosse insólito o bastante, chamou para fazer um trabalho a quatro mãos um dos principais escritores do México o popular autor de novelas policiais Paco Ignacio Taibo II.
O resultado é Mortos Incômodos (Falta o Que Falta) (Tradução de Magda Lopes. Planeta, 240 págs., R$ 37,50), que agora chega ao Brasil. O livro, que tem ao mesmo tempo tons de história policial e romance social, foi publicado primeiro em capítulos, como se fosse um folhetim, pelo jornal La Jornada. Marcos escrevia os capítulos ímpares. Taibo respondia a seguir com um capítulo par. No total, foram seis capítulos de cada um, com um epílogo acrescentado pelo romancista.
Obviamente, o livro não se preocupa só com literatura. Os focos principais estão na vida dos camponeses, nos absurdos criados pela classe política do México, no exército zapatista e outros assuntos do gênero. Em declaração dada ao jornal inglês The Guardian logo que aceitou tocar o projeto, Taibo dizia saber que "não seria um romance inocente".
O surpreendente é que em meio a todo o clima político e à trama policial, há espaço para bom humor e até para um certo refinamento literário por parte de Marcos. Ele tem boas tiradas em várias ocasiões. Num determinado momento, por exemplo, cria um personagem italiano, que decidiu se juntar aos zapatistas no México. Mas Marcos, o narrador, diz que ele está na história só porque romances policiais devem falar de comida e gastronomia. Mais engraçado é que Agosto Proibido, o personagem, também é metido a ufólogo. E diz que há dois tipos de alienígenas: os bons e os maus. Os bons ainda estão por vir à Terra. Os maus já vieram. E tomaram o poder em Washington, Londres e outras capitais.
A história ocorre em dois mundos paralelos. Os capítulos iniciais de Marcos contam a trajetória de Elias, um "comissãrio de investigação" dos zapatistas. Ele corre atrás do autor de um assassinato. Enquanto isso, Taibo narra a história de um detetive na Cidade do México, chamado Belascoarán. Ele investiga o reaparecimento de um antigo prisioneiro político, que todos supõem ter sido assassinado pelo governo em 1971.
Mortos Incômodos é um romance que está longe de ser a descoberta literária da década. Em todo caso, é um fenômeno social raro e uma boa dica para quem quer saber mais sobre o continente em que vivemos.
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