Está na natureza do teatro: é a arte do aqui e agora. Sua repercussão, contudo, pode avançar no tempo e no espaço, e para isso a internet abre possibilidades de debate e prolongamento do que acontece em cena. No entanto, elas são ainda pouco aproveitadas por artistas, críticos e público.
Basta comparar à quantidade de sites, blogs e afins dedicados ao cinema (Filmes Polvo, Contracampo, Cinética, a lista segue longa). Para não falar de como o YouTube e o download de arquivos ampliaram os espectadores de um filme. O teatro está em defasagem.
Quando criaram, em abril de 2007, a revista eletrônica Bacante, o paulista Maurício Alcântara e os outros editores sentiam falta de um espaço virtual de diálogo sobre o teatro no Brasil. "Até então, o que havia se restringia aos blogs particulares de artistas, guias de programação com foco na divulgação (e não na análise) e a algumas poucas comunidades no Orkut", recorda.
Aos poucos, o espaço começa a ser ocupado. Dias atrás, Fabrício Muriana, outro dos editores da Bacante, declarou no Twitter: "Só em 2010 podemos falar em blogosfera do teatro." De fato, surgiram desde o começo do ano algumas iniciativas significativas, como o Teatro Jornal, mantido pelo crítico Valmir Santos.
Além de escrever sobre espetáculos atuais, Santos criou um arquivo de toda a sua produção em mais de uma década de trabalho para veículos como a Folha de S. Paulo. Não faltam, por exemplo, balanços do Festival de Curitiba, que acompanhou anos a fio. Republicá-los na internet é um esforço de preservação da memória do teatro, essa arte efêmera. É o que faz também, com abrangência superior, a Enciclopédia de Teatro, do Instituto Itaú Cultural.
O que se escreve hoje sobre um espetáculo que logo sairá de cartaz cumpre a dupla função de servir de registro para o futuro e mapear o presente. Esse segundo ponto ganha especial relevância para quem tenta acompanhar a cena brasileira de fora do eixo Rio-São Paulo. Antes de decidir se vale a pena tomar um avião para ver um espetáculo por lá, ou antes de uma peça como In on It chegar aqui, pode-se ler três críticas distintas sobre ela na Bacante e, não satisfeito, mais três publicadas na revista eletrônica Questão de Crítica.
Não foi apenas o preço da impressão em papel que determinou o meio que a Questão de Crítica habitaria, desde março de 2008. "A internet é um fator determinante para a crítica nesse momento", acredita a diretora Daniele Ávila. Ela cita dois motivos: a circulação livre dos textos e a possibilidade de experimentar novos formatos, mais reflexivos. Maurício Alcântara diz também não ser capaz de imaginar a Bacante fora da internet, pelo alcance, circulação e a liberdade de linguagem.
Uma, a Bacante, com seu tom informal e pessoal. Outra, a Questão de Crítica, com seu pendor para aplicar a teoria à realidade dos espetáculos. A seu modo, são espaços virtuais que ventilam ideias próprias sobre o teatro. Exatamente o que está em falta, inclusive entre os artistas. "Poucos são os que tomam a iniciativa de experimentar um discurso próprio sobre o seu trabalho. A Internet dá voz. Mas quem quer ter voz, pra valer?", questiona Daniele. "Vejo pouca apropriação da tecnologia por parte dos grupos", completa Alcântara.
Na contramão, vão aparecendo os diários de processos de companhias e ousadias como a do Teatro Oficina, que libera espectadores a fotografar e pede que divulguem na internet. "Eles estão dialogando com esse momento de transformação que não é puramente técnica, mas também é econômica e política", conclui Alcântara.
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