Uma aula de vigilância cidadã. Assim pode ser resumido o encontro com o escritor, jornalista e publicitário Domingos Pellegrini, que aconteceu na quarta-feira passada, em mais uma edição do Café Literário. O evento, promovido pela Gazeta do Povo no Mambembe Bar e Cachaçaria, deu ao autor londrinense, duas vezes vencedor do prêmio Jabuti de Literatura, a oportunidade de expressar suas preocupações em relação à passividade do povo brasileiro diante de mazelas nacionais, co-mo o desrespeito aos direitos civis e a corrupção endêmica que assola o país.
Pellegrini, que recentemente deu voz de prisão ao gerente de uma agência bancária em Londrina, por permitir que os clientes permanecessem mais do que 15 minutos na fila de espera, disse não se importar nem um pouco com a fama de chato. Se, ao adentrar um banco, constata a inexistência de cadeiras e de distribuição de senhas para o público, não se faz de rogado: procura o gerente e exige que seus direitos sejam respeitados. Infelizmente, diz Pellegini, ainda são poucos os que que reagem dessa forma diante desse tipo de abusos. "O povo brasileiro é cordeiro", sentenciou.
A mesma dose inconformismo e indignação é prescrita pelo escritor nas mais diversas situações. Ele mesmo já recorreu às autoridades londrinenses em diversas ocasiões nas quais se sentiu de alguma forma lesado como cidadão e pagador de impostos. A luta contra a poluição sonora, cujos efeitos são comprovadamente nocivos à saúde, é uma das causas que abraçou nos últimos anos. Tanto que se sentiu forçado a se mudar da cidade para uma chácara com o objetivo de fugir do excesso de barulho. Desde então, conta Pellegrini, a situação já melhorou, devido, também, às suas constantes queixas.
Leitura
Premiado autor de romances, como O Caso da Chácara Chão e Terra Vermelha, Domingos Pellegrini revelou que boa parte da renda que o sustenta vem da venda de seus livros infanto-juvenis. Um deles, A Árvore Que Dava Dinheiro, publicado pela superpopular Coleção Vaga-Lume (Editora Ática), vendeu mais de 2 milhões de exemplares, dando aos jovens leitores noções de como funciona o capitalismo.
Afirmando fazer literatura com o desejo assumido de dar sua contribuição a uma mudança no mundo, o escritor londrinense se diz feliz e estimulado com a idéia de que possa estar formando novos leitores, capazes de não apenas de enxergar a realidade com olhos mais críticos, mas, também, de enfrentá-la com maior preparo.
Pellegrini, no entanto, diz concordar que ainda exista um longo caminho a ser percorrido até o livro se tornar um artigo de primeira necessidade no Brasil. Segundo ele, o país, ao contrário de outras nações, como Estados Unidos, Alemanha, Rússia e Inglaterra, não passou pelo que chama de revolução da leitura em massa. "Nesses países, você entra no ônibus, no metrôs, e a maior parte das pessoas está sempre lendo". Como as tiragens são baixas, os livros chegam muito caros ao mercado, o que os torna ainda mais inacessíveis. Por conta disso, o hábito de consumir a palavra escrita precisa nascer dentro da família, estimulada pelos pais. Apenas assim conceitos como a vigilância cidadã, da qual é fervoroso defensor, poderão se difundir e passar a integrar o tecido social como se fosse algo natural.
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