São Paulo Misto de ensaio e ficção, tratado e peça imaginativa, ciência e fábula, a prosa de Alberto Mussa há alguns anos vem se firmando como uma das mais originais criações da literatura brasileira.
Tome-se o mais recente exemplo: O Movimento Pendular (Record, 240 págs.; R$ 36,90). Trata-se de uma seqüência de casos, extraídos das mais variadas fontes, abrangendo tempos diversos e alinhavados para comprovar uma tese. Segundo essa proposição, o triângulo amoroso (e não, como pretenderia Freud, o incesto) seria "o princípio primitivo elementar que orientou a evolução histórica da espécie humana". A frase do parágrafo acima se insere num capítulo sobre vários povos indígenas brasileiros, que, num momento ou no outro, estão em guerra contra os aimorés. Esse bando semilendário se encontraria num estágio de civilização entre a organização humana e a barbárie animal.
É justamente na observação de um suposto núcleo familiar aimoré que se percebe a primazia do triângulo sobre o incesto.
Como diz o narrador: "Talvez não seja inoportuno lembrar, para dar um argumento lógico, que toda repressão ao incesto -seja qual for sua definição é necessariamente uma repressão ao adultério. O inverso, claro, nem sempre é verdadeiro".
Seja num castelo merovíngio, em 568, seja num mosteiro de hereges bogomilos, seja na Índia dos guptas, seja em terreiros de macumba do Rio de Janeiro do início do século 20: o leitor é levado a concluir que, por mais diferentes que se mostrem os cenários, os períodos históricos e os personagens, os triângulos sempre se formam e sempre determinam a ação.
Há casos até em que o terceiro vértice do triângulo (o perturbador, o sedutor, o intruso; os outros dois seriam: a vítima da traição e o traidor) não existe em termos físicos ou só se estabelece num plano simbólico.
Índia
O enredo indiano fala de um guerreiro da casta dos xátrias.
Ele se apaixona por uma jovem vidente, do grupo dos intocáveis. O xátria lhe pede que adivinhe em quem ele está pensando, e ela, que até então nunca errara um vaticínio, descreve uma mulher bem diferente de si. A segunda mulher se engendrara (pois o militar só tinha a pitonisa em mente) no terreno insondável da interdição que pesa sobre o casal: um homem de casta nobre não poderia desejar uma intocável.
A história transcorrida em Rapa Nui versa sobre um casal de irmãos, abandonados na ilha por feiticeiros polinésios. Os dois crescem quase sem contato humano (exceto quando eram menores). Nessa história, o elemento perturbador é um pingüim que topa por acaso naquelas costas tropicais. Como a serpente bíblica, ele rompe a harmonia do paraíso e sugere a hipótese do sexo.
Alinhavadas de modo solto, essas narrativas não teriam unidade não fosse a teoria que devem provar e, claro, pela figura do narrador. É ele quem pretende descobrir a unidade na diversidade, a harmonia (matemática) no caos (humano). Uma das linhas não menos interessantes de reparo reside nessa dicotomia entre as situações descritas -grávidas de detalhes mórbidos, cruentos, líricos, misteriosos- e um douto erudito que pretende reduzi-las à rigidez da fórmula.
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