Foi super efetiva a decisão recente da Nintendo de se aventurar no mundo dos jogos para celulares, para dizer o mínimo. E isso poderá acabar sendo um pesadelo para os jogadores mais veteranos como eu.
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É claro que o Pokémon Go está fazendo milhões de pessoas saírem de casa, se exercitarem e conhecerem outras pessoas na vida real. Não nego que é divertido: eu mesmo sou um treinador nível 13 no Team Valor, e, na semana passada, até participei de uma caminhada Pokémon pelo National Mall. Mas o sucesso estrondoso do aplicativo é uma prova daquilo que os desenvolvedores vêm dizendo há anos: “O futuro dos jogos são os jogos para celular”.
Quem disse isso foi Hideki Hayakawa, executivo-chefe da Konami, a distribuidora japonesa responsável por muitas séries amadas pelos gamers como “Castlevania” e “Metal Gear Solid”. Mas, graças à sua atitude de privilegiar os jogos para celular acima de todo o resto, a Konami se tornou uma das distribuidoras mais odiadas da indústria: em outubro, eles cancelaram o “Silent Hill”, que seria dirigido por Guillermo del Toro e contava com muita antecipação por parte dos fãs.
O que preocupa são os imitadores
Não quero dizer que a Nintendo irá investir numa ideia só de agora em diante. A empresa já se comprometeu com seu próximo console, o NX, e o portátil 3DS foi puro sucesso. Não, o que me preocupa são os imitadores da Nintendo – que é basicamente todo o resto da indústria dos videogames.
O desenvolvimento de jogos para celulares é uma empreitada de baixo risco e baixo custo, que cria jogos para a plataforma mais popular de todas que há, o smartphone. E é um negócio lucrativo, que rende 85% de toda a receita de aplicativos móveis: US$ 34,8 bilhões, no mundo inteiro.
O Pokémon Go pode ser uma nova moda, como colocou Michael Pachter, analista de jogos da Wedbush Securities. Mas pensem só como foi a última vez que a Nintendo criou uma moda global que teve um impacto de verdade.
Em 2006, o console Nintendo Wii, com seus controles de captura de movimento fáceis de usar, se tornou um fenômeno entre os presentes de Natal. As pessoas limparam as prateleiras das lojas freneticamente, e o console se tornou comum nas salas de estar, casas de repouso e centros de recreação em todo o mundo.
E o mais importante foi que o conceito logo foi assimilado pela Microsoft e pela Sony, que canalizaram seus orçamentos, boa parte dos quais iria para outros projetos em potencial, para produzir o Kinect e o Move. A Microsoft despejou meio bilhão de dólares em marketing para o Kinect, um aparelho que não só foi rejeitado pelo público, como ainda acabou ativamente prejudicando as vendas do console do Xbox ao fazer seu preço subir. Enquanto isso, o PlayStation Move entrou e saiu do mercado praticamente na obscuridade.
Efeitos colaterais
Pensem nisso: meio bilhão de dólares foram gastos só com publicidade para o Kinect, que poderiam ter sido investidos em desenvolvedores capazes de criar narrativas e experiências interativas de alta qualidade e que valessem a pena. Não tenho dúvidas de que a Microsoft e a Sony estão planejando uma resposta parecida ao Pokémon Go, que já aumentou o valor de mercado da Nintendo em US$9 bilhões.
Os gamers já estão sentindo os efeitos colaterais da mudança de foco dos desenvolvedores no mercado de jogos para celulares. Além de ter cancelado o “Silent Hill”, a Konami pisou na bola na hora de lançar o antecipadíssimo “Metal Gear Solid V: The Phantom Pain” ao dispensar Hideo Kojima, um dos melhores desenvolvedores do gênero. O jogo foi lançado com a história pela metade e pouco desenvolvida. “Metal Gear” é uma saga com uma premissa simples, mas que tem embutida uma crítica a todo o complexo industrial militar. E sabem qual vai ser o próximo passo agora para a série? Pachinko.
Atolado de lixo
Além disso tudo, o mercado para celular está atolado de lixo (vide o “Zenda”, uma cópia barata de “Zelda”), com jogos que oferecem vantagens virtuais, através de microtransações, que substituíram o que antigamente era chamado de “manhas” nos videogames. O cenário todo não é muito diferente de como estava o mercado antes da crise dos videogames de 1983, quando os jogos bem sucedidos do Atari atraíram dúzias de imitações baratas compiladas de última hora atrás de lucro fácil.
Sim, Pokémon Go é bem legal. Minha rotina diária já conta com caminhadas muito mais longas (dezenas de milhares de passos a mais) e já fiz vários novos amigos só de participar dessas caminhadas e grupos no Facebook. Mas a história sugere que a lição que a indústria dos videogames aprenderá com o seu sucesso será a lição errada, tentando capturar a mágica da Nintendo às custas de investimentos em outros títulos de qualidade.
Há tantos tipos de gamers no mundo quanto há de Pokémons. Só espero que a indústria não se esqueça de nós em sua busca pelo próximo hit dos jogos para celular.
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