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Curitiba vive um caso raro de aceleração da produção de óperas. Passou de zero a três montagens em menos de quatro meses. Em junho deste ano, a estréia de La Bohème marcou o fim de um jejum de oito anos de grandes apresentações líricas. Depois, foi a vez de La Serva Padrona, que estreou em condições mais modestas, com baixo orçamento, mas serviu para mostrar que é possível colocar música lírica no palco com pouco dinheiro. Agora, a temporada de Gianni Schicchi promete ser a volta de produções mais esmeradas ao Guairão.

A penúltima ópera de Puccini chega com assinatura de Alessandro Sangiorgi – regente que já fez montagens da obra na Itália, no Rio de Janeiro e em São Paulo – e do diretor de cena Marcelo Marchioro – que assinou quase todas as óperas importantes do Guaíra nos anos 90. Os papéis principais são da revelação Alexandre Trovon, de Luciana Melamed e de Denise Sartori. Mas nem tudo são flores: o dinheiro ainda é curto e vários dos artistas estão trabalhando na base da boa vontade, sem saber ainda quando e quanto vão receber. Tudo vai depender do resultado da bilheteria.

Farsas e fraudes

Gianni Schicchi, escrita no começo do século 20, é uma ópera atípica de Puccini. Primeiro, por ser engraçada e curta – ao contrário das trágicas e mais longas Madame Butterfly, Tosca e La Bohème, por exemplo. Além disso, Puccini incorpora quase integralmente a idéia de Wagner de não fazer mais a obra ser dividida em várias pequenas árias – funde as partes em um grande número musical. A única ária, no sentido tradicional, é a famosa "O Mio Caro Bambino".

Para Alessandro Sangiorgi, titular da Orquestra Sinfônica do Paraná (0SP), Gianni Schicchi é "lastimavelmente a única ópera cômica de Puccini". A história fala sobre um personagem da Divina Comédia, de Dante Alighieri. O libreto conta como Schicchi se aproveita da semelhança com um conhecido que acabou de morrer para ficar com sua fortuna. A pedido dos familiares, ele finge ser o morto. Tudo para dar tempo de mudar o testamento e distribuir entre os parentes a herança. Quando o tabelião chega, porém, ele dita um testamento que beneficia antes de todos os outros o seu grande amigo Gianni Schicchi. E fica com a fortuna para si mesmo.

"É uma ópera que tem muito a ver com a situação do Brasil atual", comenta Marcelo Marchioro. "Fala sobre fraudes, sobre ganância", continua. Por isso, o diretor colocou em cena cinco corvos, que estão o tempo todo convivendo com os personagens, simbolizando a ânsia que todos têm de repartir o dinheiro do recém-finado.

Boa vontade

A montagem surgiu de um projeto da Acord, uma ONG criada para a difusão da música erudita em Curitiba. Ivo Lessa, presidente da instituição, conta que o orçamento original da ópera era de mais de R$ 400 mil. No entanto, como não havia verba para cumprir o projeto original, partiu-se para o plano B. "Estamos quase trabalhando em sistema de cooperativa", conta. Ou seja: todos trabalham e no fim vê-se quanto se consegue para repartir.

Na verdade, só foi possível que a ópera saísse do papel porque o Teatro Guaira decidiu investir no projeto. Com a parceria formada, a Acord correu atrás de dinheiro para a montagem e cuidou da parte artística. O teatro entrou com a orquestra, o regente e toda a infra-estrutura, inclusive de produção. "Vimos que o projeto era bom e incentivamos a Acord a ir em frente, ajudando no que podíamos", diz a diretora artística do teatro, Nena Inoue.

A idéia de Lessa é fazer com que a ópera agora entre no repertório da OSP e dos cantores. Periodicamente, pode ser apresentada novamente, dessa vez com menos gastos – e portanto com chance de melhor lucro financeiro para quem está participando.

* Serviço: Gianni Schicchi. Guairão (Pça. Santos Andrade, s/n.º), (41) 3315-0979. Música de Giacomo Puccini. Libreto de Giovacchino Forzano. Regência de Alessandro Sangiorgi. Direção de Marcelo Marchioro. Hoje, amanhã e sábado, às 20h30, e domingo, às 18 horas. R$ 30 (platéia e 1.º balcão) e R$ 16 (2.º balcão).

Em processo

Saiba quais são os próximos projetos de ópera em Curitiba:

* Com o processo de retomada de óperas iniciado, o Guaíra já pensa em projetos para o ano que vem. Um deles é montar uma ópera em homenagem aos 250 anos do nascimento de Mozart – a escolhida poderá ser As Bodas de Fígaro.

* A Acord, por sua vez, tem intenção de fazer Don Giovanni, também de Mozart, em 2006, e Falstaff, de Verdi, em 2007.

* No próximo mês, Curitiba terá mais uma ópera. Está prevista para 26 de outubro a estréia de Il Maestro di Capella, de Ferdinando Paer, na Sala Scabi do Solar do Barão.

* Uma das dificuldades de seleção de repertório para as óperas do Guaíra é a falta de um coro. O teatro tinha um coral próprio, mas ele foi extinto e até hoje nunca foi substituído por outro.

Orçamento

R$ 400 milera o valor aproximado da produção da ópera antes dos cortes – o valor atual não é informado.

14 cantores líricosestarão no palco do Guairão durante as quatro apresentações de Gianni Schicchi.

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