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Livro - A Hora Terna do Crepúsculo - Richard Seaver. Tradução de Cid Knipel. Globo Livros, 576 págs., R$ 64,90 |
Livro - A Hora Terna do Crepúsculo - Richard Seaver. Tradução de Cid Knipel. Globo Livros, 576 págs., R$ 64,90| Foto:

Poucos editores podem se orgulhar de terem servido de degrau para um grande autor conquistar a notoriedade e virar um clássico. Richard Seaver (1926-2009) foi um desses. Com faro literário apurado, o editor ajudou a alçar Samuel Beckett ao sucesso internacional, ao publicá-lo nos Estados Unidos. Seaver lutou contra o moralismo de seu país, nos anos 1960, para publicar autores em que acreditava, como Henry Miller e seu Trópico de Câncer e D.H. Lawrence e seu O Amante de Lady Chatterley. Agora, as memórias de uma das lendas do mercado editorial americano chegam às livrarias, com a autobiografia A Hora Terna do Crepúsculo — Paris nos Anos 1950, Nova York nos Anos 1960: Memórias da Era de Ouro da Publicação de Livros (Globo Livros).

O projeto de livro era um calhamaço de 900 páginas, que Seaver deixou inacabado ao morrer, em 2009, e foi publicado por sua viúva, a também editora Jeanette Seaver. A obra foi uma volta à escrita depois dos mais de 50 anos em que ele deixou de lado suas pretensões como escritor, na Paris dos anos 1950. O motivo, segundo Jeanette, era um só: o arrebatamento intelectual causado pela obra de Beckett e pelos outros escritores que editou. Diante de seus autores, a inspiração de Seaver ficou calada por décadas. Só voltou a falar perto da morte do editor.

"Foi uma grande responsabilidade cortar esse manuscrito. Mas tentei botar meus instintos de editora para funcionar. Queria enfocar a jornada editorial de Richard, com as histórias mais divertidas, para interessar também a um público mais amplo", diz Jeanette.

O encontro com a obra do autor irlandês ocorreu em Paris e é narrado na primeira parte do livro. Seaver era um jovem bolsista da Sorbonne, onde escrevia uma tese sobre James Joyce — seu grande ídolo. A Segunda Guerra acabara de terminar, e o clima de empolgação era grande no meio artístico quando o jovem editor leu Murphy, Malloy e Malone Morre, de Beckett.

Seaver procurou o escritor para publicá-lo na revista literária que editava e, mais tarde, traduziria Beckett para o inglês, apresentando-o aos leitores americanos. Os dois ficaram amigos, e graças a isso Seaver esteve em um momento histórico: a primeira apresentação de Esperando Godot, peça mais conhecida do dramaturgo, para uma plateia quase vazia.

Contracultura

Se Beckett é o herói da primeira parte do livro, passada em Paris, o protagonista da segunda, em Nova York, é Barney Rosset, fundador da Grove Press, uma das editoras que mais bem representavam a contracultura nos anos 1960. Na Grove Press, Seaver e Rosset montaram um catálogo contestatório, que desafiava a censura.

A primeira encrenca veio quando os dois amigos publicaram O Amante de Lady Chatterley, de D.H. Lawrence, romance da década de 1920 banido em vários países. A Grove Press foi à Justiça e conseguiu o direito de distribuir a obra, num caso considerado um marco da luta pelos direitos civis nos EUA.

O mesmo aconteceu com Trópico de Câncer, clássico de Henry Miller, e, mais tarde, com a autobiografia do ativista negro Malcom X. O militante acabara de ser assassinado por opositores, e sua editora original, pensando na segurança dos funcionários, desistiu de publicar o livro. A Grove Press aproveitou o momento.

As memórias de Richard Seaver são cheias de causos de desobediência contra as normas em nome dos livros. Mesmo sendo um editor à moda antiga, sua viúva garante que, nos últimos anos, ele se mostrava empolgado com a facilidade de distribuição dos livros digitais. Mas não teve tempo para ver onde a tecnologia ia dar. Ele ainda passou por outras editoras antes de morrer, no dia 6 de janeiro de 2009.

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