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Cinema ao ar livre em Palermo, na Itália, em fotografia feita por Wim Wenders em 2007: uma tranquilidade bizarra | Wim Wenders / Divulgação
Cinema ao ar livre em Palermo, na Itália, em fotografia feita por Wim Wenders em 2007: uma tranquilidade bizarra| Foto: Wim Wenders / Divulgação

A fotografia só pode ter sido feita de um helicóptero, ou talvez de uma montanha, e mostra uma formação rochosa e circular no meio de um deserto com a aparência de um ninho. A legenda é lacônica, mas basta para criar uma atmosfera de ficção científica: "Cratera de Meteorito, Austrália Ocidental, 1988".

A imagem embasbacante faz parte de Lugares, Estranhos e Quietos, livro que agrupa os trabalhos fotográficos de Wim Wenders apresentados no Museu de Arte de São Paulo (Masp) entre os dias 20 de outubro do ano passado e 9 de janeiro deste ano. A exposição fez parte dos eventos ligados à Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, que prestou homenagem ao cineasta alemão.

O diretor que marcou os anos 80 com Paris, Texas (1984) e Asas do Desejo (1987) é também um fotógrafo com sensibilidade para cenários incomuns. Faz sentido a exposição e o livro serem dedicados a lugares encontrados nas viagens que fez ligadas ao cinema, boa parte delas em busca de locações. Há inclusive algumas fotos feitas no Brasil.

Uma delas mostra o túnel do metrô em São Paulo, com um desenho dos artistas plásticos Osgemeos (assim, mesmo, junto e sem acento) que foi posteriormente pichado com tinta vermelha por alguém que quis marcar com X os personagens retratados na parede.

No texto breve que introduz a edição bilíngue, Wenders faz uma crítica às imagens alteradas por computador e explica de modo poético o seu método de trabalho. Para o cineasta, lugares são como um vício. "Fico tão ligado a eles que chego a sentir saudades de vários de uma só vez".

Uma das fotografias mais bonitas do volume é uma esquina retratada na cidade de Butte, estado de Montana, nos Estados Unidos, em 2003. Num dia de sol e céu azul, Wenders pegou um encontro de duas ruas completamente vazias, sem carros nem pessoas. A vitrine de uma loja aparece repleta de objetos desencontrados – bancos, uma casa de passarinho, um engradado e um pedaço de manequim.

Wenders consegue retratar o silêncio dos cenários. Há uma tranquilidade incomum em quase todos eles, ou, nas palavras do fotógrafo, são lugares "estranhamente quietos ou quietamente estranhos".

Por motivos óbvios – afinal, o autor é cineasta –, as imagens parecem tiradas de filmes. Um exemplo notório é a roda gigante abandonada, caindo aos pedaços, num terreno da Armênia. Ou o cinema ao ar livre na Sicília, em que fileiras de cadeiras vermelhas de plástico dividem espaço com árvores. Em outra, a tela branca de um antigo drive-in flagrado nos anos 80 lembra um totem no meio de uma paisagem desértica.

Outro detalhe curioso das fotografias é que Wenders fez quatro delas (de um total de 24) mostrando pessoas de costas. Em duas, de um policial na Alemanha e de um palhaço de rodeio nos EUA, os personagens estão em posições muito parecidas, uma semelhança assombrosa.

"A realidade que encontro mundo afora, de vez em quando, aqueles lugares estranhos e quietos, para mim, são muito mais envolventes e emocionantes pelo simples fato de existirem. Na maioria das vezes humildemente, em outras orgulhosamente, com frequência esquecidos e raramente famosos", escreve Wenders, argumentando contra o mundo manipulado por computador.

"Não há nada mais belo sob os céus que a incrível, alucinante, infinita variedade de lugares que realmente existem."

Serviço:

Lugares, Estranhos e Quietos, de Wim Wenders. Tradução de Edson Lemos. Imprensa Oficial do Estado de São Paulo e Mostra Internacional de Cinema, 64 págs., R$ 60.

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