Uma das categorias mais misteriosas do Oscar sempre foi a de melhor filme estrangeiro. Como os indicados são escolhidos por um colegiado, e não por todos os integrantes da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood, a lista final de concorrentes, assim como o próprio vencedor, sempre pode causar supresas.
Dentre os indicados deste ano, dois títulos estavam entre os citados pela imprensa norte-americana como prováveis finalistas. Já era esperada a citação do mexicano Biutiful (em cartaz no Brasil), que também colocou o espanhol Javier Bardem (vencedor da estatueta por Onde os Fracos Não Têm Vez) na corrida de melhor ator. O filme tem direção do badalado Alejandro González Iñárritu, já indicado a melhor direção e filme por Babel, e a de melhor filme estrangeiro, por Amores Brutos, longa-metragem que o revelou ao mundo.
Em Biutiful, Bardem, premiado no Festival de Cannes deste ano por seu maravilhoso desempenho, vive um homem que, na Barcelona contemporânea, globalizada e repleta de imigrantes ilegais, se descobre doente e com os dias contados, ao mesmo tempo em que tem de lidar com seus poderes mediúnicos.
Denso e tenso, o filme pode sair premiado, mas também corre o risco de ser considerado autoral demais para o gosto da Academia, que prefere reconhecer nessa categoria produções mais tocantes, edificantes ou com maior comunicação com o público, caso do vencedor do ano passado, o ótimo O Segredo dos Seus Olhos, da Argentina.
Outro título que era quase certo entre os finalistas do Oscar é Em um Mundo Melhor, representante da Dinamarca dirigido pela cineasta Susanne Bier, expoente em seu país. Vencedor do Globo de Ouro, o longa tem como personagem central um médico que trabalha na África e enfrenta sérias dificuldades com um tirano local. Já sua mulher, que ficou na Dinamarca, alimenta preocupações com o filho mais velho do casal, que vem sofrendo violento bullying na escola.
Drama humanista, com foco nos personagens e seus dilemas, que têm caráter universal, Em um Mundo Melhor apresenta mais o perfil de um ganhador do Oscar de filme estrangeiro.
Drama político
Não seria totalmente inesperado, no entanto, se a Academia decidisse premiar o impactante Fora da Lei (lançado semana passada em São Paulo e Rio de Janeiro), um dos filmes mais comentados e aplaudidos pelo público da Mostra Internacional de Cinema de São Paulo do ano passado.
Espécie de homenagem ao clássico de Luchino Visconti Rocco e Seus Irmãos, o longa-metragem do diretor Rachid Bouchareb é uma obra engajada e despertou a ira da direita na França, quando exibido no Festival de Cannes do ano passado. Foi acusado de distorcer os fatos, pintando os franceses como fascínoras, e terroristas argelinos como heróis.
O filme é pontuado por dois massacres. O primeiro ocorre em Sétig, na Argélia, em 1945, quando colonos franceses atiram na população nativa que, após o fim da Segunda Guerra Mundial, ansiava pela independência do seu país. No segundo confronto, que fecha Fora-da-lei, uma manifestação em Paris nos anos 1960, que era para ser pacífica, se transforma em carnificina.
Como a obra-prima de Visconti, o filme narra a história de três irmãos e de uma mãe. Desterrados, eles emigram para a França, onde seguem caminhos diversos e trágicos. Dois deles ingressam na Força Nacional de Libertação (FNL), organização que faz uso da violência em nome de seus ideais.O terceiro irmão se torna proprietário de um cabaré.
Na perspectiva de Bouchareb, a atuação da FNL foi uma resposta justificada a décadas de opressão colonialista francesa. O resultado é um filme explosivo, ainda que assumidamente tendencioso.
Incógnitas
Sabe-se pouco sobre os outros dois indicados, o grego Dogtooth (Caninos, em tradução livre) e Incendies (Incêndios), do franco-canadense Dennis Villeneuve, ambos ainda sem distribuição garantida no Brasil. O primeiro, com direção de Giorgos Lanthimos e vencedor da mostra Um Certo Olhar (Festival de Cannes 2010), gira em torno de três adolescentes confinados em casa pelos pais superprotetores e que criam um mundo e um vocabulário apenas deles. Até a chegada de um estranho, trazido pelos pais para satisfazer as pulsões sexuais dos jovens.
Já Incendies conta a história de uma mãe, cujo grande desejo é que seus filhos gêmeos viajem ao Oriente Médio para procurar suas origens e o pai, supostamente morto. Tem toda a pinta de azarão.
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