A sequência de abertura de Versos de um Crime, longa-metragem de estreia do diretor norte-americano John Krokidas, em cartaz desde a última quinta-feira, sugere que algo muito terrível ocorreu. O jovem Lucien Carr (Dane DeHaan, ótimo) é visto no interior de uma cela e, também, nas águas de um rio, carregando nos braços um homem mais velho e agonizante, David Kammerer (Michael C. Hall). A edição dessas imagens sugere, mas não deixa exatamente claro, que o garoto tenha sido preso sob a acusação de assassinato.
Essas cenas intercaladas servem como ponto de partida de um longo flashback, que não apenas irá explicar o acontecido. A narrativa defenderá a tese de que esse acontecimento, envolto em mistério quase até o desfecho do filme, terá papel-chave na formação existencial e artística do poeta Allen Ginsberg, um dos nomes mais importantes da chamada geração beat, grupo de escritores que emergiu nos Estados Unidos do pós-Segunda Guerra Mundial. Esses autores teriam, com suas obras e seu comportamento, antecipado transformações sociais profundas que viriam na década de 1960, com a contracultura, a revolução sexual e a luta pelos direitos das minorias.
Ginsberg, vivido pelo talentoso ator britânico Daniel Radcliffe (o Harry Potter), é um jovem judeu de classe média que, desde muito cedo, tem de lidar com um lar dividido a mãe, Naomi (Jennifer Jason Leigh), sofre de sérios problemas mentais e o pai, Louis (David Cross), também poeta, encara a enfermidade da mulher como um estorvo, preferindo vê-la internada a conviver com sua doença.
Ao ser aceito pela Universidade de Columbia, em Nova York, Allen enxerga a oportunidade de iniciar uma nova existência. Já nos primeiros dias de aula, ele conhece Lucien, um rapaz provocador, que lhe apresenta um mundo desconhecido e sedutor, povoado por aspirantes a escritores, como William Burroughs (Ben Foster) e Jack Kerouac (Jack Huston, neto do cineasta John Huston), e embalado por muito álcool, jazz e drogas.
De natureza anárquica, contestadora, Lucien desperta em Allen, homossexual, um misto de desejo e fascínio. Acontece que o rapaz, mais interessado em viver e quebrar regras do que nos estudos ou mesmo na literatura, tem uma sombra: David Kammerer, que nutre por Lucien uma paixão obsessiva, o seguindo aonde quer que ele vá, em uma relação ao mesmo tempo simbiótica e destrutiva.
Com um elenco afinado e uma inspirada reconstituição de época, Versos de um Crime padece do mesmo mal que Na Estrada, adaptação de Walter Salles para o clássico On the Road, de Jack Kerouac: não consegue transpor para a tela a complexidade do universo que pretende retratar, resultando em uma versão talvez sanitizada demais. Ainda assim, graças a um roteiro bem construído e a atuações muito convincentes de todo o elenco, o filme resulta acima da média. GGG
STF terá Bolsonaro, bets, redes sociais, Uber e outros temas na pauta em 2025
Estado é incapaz de resolver hiato da infraestrutura no país
Ser “trad” é a nova “trend”? Celebridades ‘conservadoras’ ganham os holofotes
PCC: corrupção policial por organizações mafiosas é a ponta do iceberg de infiltração no Estado
Deixe sua opinião