Premiados
Saiba quais são as peças da safra 2011 destacadas com prêmios que estarão no Festival de Teatro:
Shell/Rio de Janeiro
Obituário Ideal - Autor (Rodrigo Nogueira)
Estamira Beira do Mundo - Atriz (Dani Barros)
Julia - Direção (Christiane Jatahy)
Shell/São Paulo
O Jardim - Autor (Leonardo Moreira) e cenário (Marisa Bentivegna) e direção no prêmio da Associação Paulista de Críticos de Arte (APCA)
Oxigênio - Ator (Rodrigo Bolzan)
Luís Antônio Gabriela - Direção (Nelson Baskerville) e prêmio de melhor espetáculo da APCA
O Idiota Uma Novela Teatral - Figurino (Joana Porto)
Uma prova de que Curitiba receberá, a partir de terça-feira, uma amostra do que se faz de mais significativo no teatro brasileiro é o fato de que seis espetáculos da Mostra 2012 e um do Fringe foram premiados com o Shell, mais importante homenagem cênica do país.
Para Tania Brandão, uma das curadoras do festival, um levantamento histórico de peças que vêm desde 1992 a Curitiba revela uma grande quantidade de espetáculos premiados, dada a boa recepção do público a montagens inquietas e fortes, que abundam no teatro nacional (leia mais na entrevista a baixo).
Essa característica foi consagrada pelo Prêmio Shell na semana passada à curitibana Oxigênio, da Cia. Brasileira de Teatro, em cartaz na mostra paralela Fringe. Rodrigo Bolzan, após levar o prêmio de melhor ator na etapa paulista da seleção, considerou, em conversa com a Gazeta do Povo, que o júri viu a honestidade com que ele cumpre a proposta delineana frase que abre o espetáculo: "Este é um ato que deve ser produzido aqui e agora".
"É uma missão impossível, mas um compromisso que eu realmente não deixo de fazer em nenhum momento do espetáculo."
A fronteira entre a interpretação e a realidade serve de substrato a outro trabalho premiado que desembarca no festival. Julia trouxe a concha dourada de melhor direção a Christiane Jatahy, numa adaptação do texto de August Strindberg (Senhorita Julia) que coloca em cena câmeras e projeções.
"Me interesso em renovar a relação do espectador com a cena, e dos atores com seus personagens", disse a diretora à reportagem.
A grade do festival tem inúmeros outros exemplos de profissionais apaixonados pelo que fazem e com propostas bastante autorais. É o caso da atriz Dani Barros, cujo projeto Estamira Beira do Mundo lhe rendeu o Shell de melhor atriz na etapa carioca. A história da catadora de papel, já contada no documentário Estamira, de Marcos Prado, despertou lembranças pessoais na atriz, que cresceu acompanhando a mãe a instituições psiquiátricas. "Curitiba será nossa primeira viagem com a peça, e depois seguiremos com apresentações em hospitais."
Teste de resistência
Se o curitibano aceita mesmo linguagens e propostas ousadas, saberemos a partir da quarta-feira, quando entra em cartaz O Idiota Uma Novela Teatral. A duração de seis horas e meia, com dois intervalos, é um teste de resistência para qualquer um. A figurinista da peça, Joana Porto, garante, porém, que ninguém vê o tempo passar. "Não se fica sentado o tempo todo e no meio tem uma festa", conta. Ela foi selecionada pelo Shell por seu trabalho na caracterização dos personagens desta história, que se passa na Rússia do século 19.
Obituário Ideal, premiado pelo texto de Rodrigo Nogueira, já está com ingressos esgotados. Leia mais sobre as outras peças premiadas (O Jardim e Luís Antônio-Gabriela) durante a cobertura diária do festival na Gazeta do Povo.
EntrevistaTania Brandão, curadora do Festival de Curitiba, crítica e professora de História do Teatro Brasileiro da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UniRio)
A curadoria do festival deu preferência a peças indicadas a prêmios?
A ótica da curadoria vai muito mais em função das discussões mais fortes do teatro brasileiro no momento. O que acontece é que o teatro brasileiro se preocupa em dialogar com os valores da nossa sociedade, e isso é permanente, e faz com que aconteçam espetáculos de bastante força com um impacto grande. Se for feito um estudo dos espetáculos que já compareceram ao festival, talvez apareça ao longo da história um notável número de peças que foram premiadas. Isso exatamente por causa dessa orientação que sempre marcou o festival, de trazer o que há de mais inquieto o que acontece realmente de relevante na cena brasileira.
Quais são as questões que estão indo da sociedade para os palcos?
Uma questão que acho muito forte é a importância do chamado homem comum. Aconteceu a primavera árabe, o Wikileaks, uma série de manifestações no mundo inteiro, que provavelmente tenham levado a um processo de adensamento da democracia no Brasil. Então, temos um espetáculo como Palácio do Fim, que é uma reflexão estética muito densa sobre a guerra e o imperialismo, e o enfrentamento disso pelo homem comum.
Que outro espetáculo pode ser destacado pela força?
Outro que trabalha com um tema contemporâneo muito comovedor é Judy Garland O Fim do Arco-Íris. Ele questiona o que é o astro, o mito, e o que a consagração faz com a pessoa. Ainda mais no caso dela, uma pessoa absolutamente tiranizada pela fama desde a infância, barbarizada pela ambição de sucesso, praticamente assassinada pela fama. Outro é Namíbia, Não!, proposta de reflexão sobre o racismo a exclusão do negro, da falta de democracia racial no Brasil. Por ter bom humor, brinca com a hipótese de todos os negros serem deportados do Brasil em sintonia com a questão mundial da limpeza racial, num momento em que se precisa parar para definir o que é a humanidade.
O público curitibano está preparado para essas peças menos tradicionais?
Acho espantosa a força teatral de Curitiba. O público sabe lidar com referências teatrais muito variadas. Não vejo a hipótese de não entender ou rejeitar uma peça. Além disso, o número de atores, diretores e dramaturgos que vêm do Paraná é grande. Tem uma inquietude fundamental para o teatro brasileiro hoje.
Serviço:Festival de Teatro de Curitiba. De 27 de março a 8 de abril. Confira o serviço das peças da Mostra 2012 no Guia Gazeta do Povo