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E de repente esse drama: o Palmeiras será ou não rebaixado?

Até palmeirenses carecas se descabelam.

Lembro de amigo corintiano que tanto roía unhas vendo jogo, que a mulher obrigou a usar luvas. Ele então roía as luvas, arrancando fiapos até chegar às unhas. Ela não entendia:

– Porque sofrer tanto por causa de um time?

Ele respondeu sem tirar os olhos da televisão:

– Ora, mulher, porque... Pra ver drama na vida, paixão!

Ela ficou olhando murcha e micha para ele, até sussurrar:

– E eu?...

Ele não ouviu, atento ao jogo. Ela insistiu sussurrando:

– Você quer paixão então... E eu?!

Aí aconteceu pênalti, ele ficou mordendo as mãos cerradas. O goleiro defendeu, ele pulou de alegria, ela gritou:

– Hem, e eu?!

Ele lhe deu tapinha no ombro:

– Ah, meu bem, você pode torcer pra quem você quiser, até pro Palmeiras!

Não vou contar se continuam casados, não vem ao caso. O caso é: porque o torcedor não aceita que, assim como o time pode ser campeão, pode ser lanterna, não?

Anormal seria time que nunca estivesse nem na ponta nem no pé da tabela, time que nunca ganhasse nem perdesse, sempre empatando, ou ganhando uma partida e perdendo outra, sempre no meio da tabela. Quem torceria para time previsível assim?

Oh, talvez o Média Clube tivesse torcida, sim. Os medíocres, os conformados, os medrosos torceriam pelo Média, e, conforme ele fosse ficando sempre na média, comemorariam tão discretamente que ninguém perceberia. Até porque os torcedores do Média não iriam aos estádios, veriam os jogos em casa pela tevê, sem risco nem custo, como legítimos torcedores medianos.

Fim de jogo. O juiz já vai levando o apito à boca, placar zero a zero como gostam os medianos, quando atacante é derrubado na área. O juiz apita como se já se arrependesse, tirando logo o apito da boca e apontando a marca do pênalti. Os torcedores do Média se encolhem em casa, todos como se fossem um só, levando as mãos à cabeça.

Um pênalti! O Média fazia campanha linda, só empatando há dez jogos seguidos, e agora um pênalti! Se perder, para manter a média terá de ganhar o próximo jogo, contra adversário duro!

Então, diante da tevê, esse altar doméstico, os torcedores do Média torcem apertando as mãos como se rezando.

O atacante adversário recua, dá dois toquinhos com a ponta do pé no gramado, corre e... Os torcedores do Média fecham os olhos, para abrir só depois que o goleiro estiver com a bola nas mãos ou a bola no fundo do gol, e acontece nem uma coisa nem outra, a bola sobe a caminho da arquibancada.

Melhor assim, suspiram aliviados, melhor assim. Nem o atacante vira herói com tão pouco, nem o goleiro vira herói, para depois querer aumento do salário mediano. Todo o time ganha em média a mesma coisa, um que ganhe mais pode desequilibrar a equipe, e o forte do Média é o equilíbrio. Nenhuma falta em doze jogos, embora também nenhum gol.

O locutor encerra dizendo que o placar de zero e zero, pela visão da torcida, é uma vitória do Média. E o repórter de campo concorda bocejando, vai tentar entrevistar alguém do time, mas até o técnico é tão discreto que já foi para o vestiário.

Conto a um amigo palmeirense esta história, ele se benze:

– Credo, cara! No dia que futebol for assim, eu deixo de torcer! Viva o rebaixamento do Palmeiras!

Ou invente-se um ser humano sem paixões.

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