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Durante visita ao mercado de Mardan, proprietários chamaram Fernando Scheller (ao centro, de bermuda) para um chá e o alertaram sobre os talibãs, que estavam na cidade | Divulgação
Durante visita ao mercado de Mardan, proprietários chamaram Fernando Scheller (ao centro, de bermuda) para um chá e o alertaram sobre os talibãs, que estavam na cidade| Foto: Divulgação

A missão era retratar em um livro-reportagem o cotidiano de um país remoto, alvo de preconceitos por parte de quem não o conhece, principalmente nós, os ocidentais. Para isso, o jornalista paranaense Fernando Scheller passou dois meses no Paquistão, morando com a família Khan, que faz parte da tribo pachtun.

Descontaminado de preconceitos, tentou destrinchar o país e as relações político-culturais que fazem do Paquistão um lugar em constante tensão, seja por conta do fanatismo religioso, das disputas territoriais com a Índia ou dos ataques terroristas em regiões dominadas pelos talibãs.

O resultado está em Paquistão, Viagem à Terra dos Puros, que será lançado às 19 horas de hoje, nas Livrarias Curitiba do Shopping Palladium.

A ideia surgiu na Alemanha, quando conheceu, no curso de mestrado em Economia e Política Internacional, um paquistanês de nome Ishfaq. As "negociações" com a família Khan duraram dois meses, e em 2008 Scheller voou por 36 horas até desembarcar na capital Islamabad ,"em um dia de sol e céu de brigadeiro". Na época, Scheller trabalhava na Rede Globo.

"Foi uma questão de oportunidade. A partir de 2006, a exposição do país aumentou muito por conta do terrorismo. E li muitos livros escritos por europeus que tinham um caráter maniqueísta. Eu estava preocupado em não ir para lá com a história pronta", diz o jornalista, hoje repórter de Negócios do jornal O Estado de S. Paulo.

A observação do cotidiano – quase tudo é exótico e interessante em se tratando de Paquistão – e a real imersão descrita pelo jornalista dão o tom do li­­vro, uma espécie de relato de viagem não programado. A família mora em Mardan, uma vila no noroeste do país.

"Jornalista tem mania de querer fazer pauta para tudo, mas dessa vez não fiz isso. Pelo menos 60% do livro escrevi lá mesmo, no quente", comenta Scheller. Quente mesmo. O brasileiro ti­­nha a "mania estranha" de beber água a toda hora em um calor de 43 graus.

Um fator que norteia o relato é a acolhida de rei que recebeu na família Khan. Se você for ao Paquistão e se hospedar na casa de amigos daquele país, nunca abra a carteira para pagar algo. Pega mal.

"Eu não sabia disso, mas é uma tradição da tribo pachtun, essa característica de tratar o hóspede melhor do que alguém da sua família. O hóspede tem prioridade absoluta lá", conta o jornalista.

Convivendo e, aos poucos, des­­cobrindo singularidades dos outros integrantes da família Khan – lê-se "Ran" –, Scheller des­­venda, por exemplo, as tradições, passadas de geração em geração. O amor, dizem os pa­­quistaneses, é construído aos pou­­cos. Por isso, os casamentos são arranjados pelas famílias. Os cônjuges devem amar a família toda, e não só a pessoa com quem vai juntar escovas de dentes. É normal no Paquistão um ho­­mem se casar virgem, aos 30 anos.

"A interpretação do Alcorão [livro sagrado dos muçulmanos] é muito literal. Não adianta argumentar, o que está lá, está lá e acabou. Eu sofri uma espécie de tentativa de conversão, mas não foi muito ostensiva. Como eles gostaram de mim, estavam preocupados, cogitando que iria para o inferno se não aceitasse a sua religião", explicou Scheller.

O jornalista viajou pelo país e também manteve contatos com professores universitários, que esmiuçaram questões políticas, como a influência dos talibãs – que domina regiões do país em que o governo oficial não tem acesso, daí a força do grupo extremista islãmico –, e das atuais rusgas com a Índia, país do qual conseguiu independência em 1947 e com qual disputa a região conhecida como Caxemira.

"Eu consegui entender o que os paquistaneses pensam, mas há algumas coisas com as quais eu não concordo porque simplesmente não é meu jeito de ver a vida. A questão da repressão das mulheres, por exemplo. Elas devem ser protegidas, e por isso não vão à escola, cobrem o corpo todo e são excluídas de censos. Por mais que tenha ouvido os porquês, não consigo compreender", diz Scheller.

O jornalista já apresentou o livro à família Khan, embora a barreira da língua impeça a compreensão. Uma versão em inglês do livro pode sair em breve.

Serviço:

Paquistão, Viagem à Terra dos Puros. Fernando Scheller. Lançamento hoje, às 19 horas, nas Livrarias Curitiba Palladium Shopping Center (Av. Pres. Kennedy, 4.121, Piso L2), (41) 3330-6777.

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