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 | Ilustração: Felipe Lima
| Foto: Ilustração: Felipe Lima

Barulhinho bom

Os apelos da praticidade e da quantidade jogaram para escanteio a preocupação com a qualidade da música que se ouve. Quem não quer perder o brilho dos agudos pode adotar algumas práticas:

Novas mídias

O professor Hugo Melo, do curso de Produção Sonora da UFPR, sugere novas mídias bastante disseminadas na Europa ou nos Estados Unidos, mas ainda pouco conhecidas por aqui: os concorrentes DVD-Áudio (DVD-A, tem o dobro da qualidade de um DVD normal e só registra o áudio) e Super Audio CD (SACD). Só tocam em aparelhos específicos, mas que, normalmente, dão conta de rodar as "velhas mídias" também.

DVD

O som do DVD tem qualidade melhor que a do CD. São seis canais em vez de dois e o processo de áudio usa arquivos maiores, dando mais qualidade aos sons agudos.

320

Se ainda assim o MP3 for o formato do arquivo escolhido, não economize no tamanho. Opte pela taxa de transferência a 320 kbps, que se aproxima da qualidade de som do CD.

Caixas acústicas

Invista em boas caixas de som. As mais baratas deixam muita a desejar. "Seria como olhar para a tevê de alta definição e ver a imagem de uma comum."

Ipod

Se for usar o Ipod, esqueça o preciosismo com a qualidade. O formato AAC é como o MP3. Ouvindo com fone não se percebe, mas uma caixa de som potente vai denunciar as perdas. Aliás, aposente o fone se não quiser perder graves e agudos.

A tecnologia teria feito a música "involuir"? Há quem defenda que sim, como o jornalista e crítico Luís Antônio Giron, em um artigo incisivo para o site da revista Época. Sem medo de nadar contra uma corrente avassaladora, que vem abalando as estruturas de gigantes da indústria fonográfica mundo afora, ele brada: "Delete o MP3 de sua vida". Vale citar um trecho final: "Ouvir música no MP3 é ridículo. É como tentar apreender uma miniatura inaudível, uma orquestra tocada por... mosquitos".

Não é bem assim. Se a tecnologia trouxe algumas limitações para a música de um lado, sem dúvida, por outro, ampliou suas possibilidades. O que acontece com frequência é que as pessoas "se acostumaram com as limitações", diz Hugo Melo, professor de Tecnologias de Áudio do curso de Produção Sonora da Universidade Federal do Paraná.

"A alta tecnologia está mais acessível, mas as pessoas abrem mão dela em troca da praticidade", diz. A portabilidade venceu – afinal, compactando o arquivo de áudio, cabem mais faixas em um espaço menor e mais fácil de ser levado para cima e para baixo. A qualidade do áudio sofre com isso. Mas quem escuta música em fone de ouvido ou nos modelos básicos de caixa de som para computador nem sente o efeito. "Você só vai usufruir da qualidade do áudio se tiver um equipamento com boa qualidade de reprodução", explica Melo. Não é, nem de longe, o caso do fone de ouvido.

Comparações

"O vinil tem problema do desgaste. Cada vez que se ouve, fica um pouco mais arranhado e com um pouco mais de chiado, em compensação o agudo é um pouco mais nítido. O CD tem a vantagem do som mais limpo, silêncios sem chiados e ruídos, mas não consegue ter alta fidelidade nos agudos. O MP3 é pior que os dois", compara Melo.

A compactação de músicas no formato MP3 ganhou espaço, apesar da menor qualidade, durante a fase da internet discada, quando as conexões eram mais lentas. Os arquivos, bem menores, são facilmente transferíveis. Em compensação, "se ouvidos em um equipamento de boa qualidade, se percebe a perda de brilho dos sons mais agudos, que ficam abafados", diz o professor.

Não é qualquer gênero musical que faz sentir esse desnível. "Com a música erudita, instrumental (que tem variedade de tons, timbres e frequências) ou voz e violão (cheia de detalhezinhos), você consegue perceber. Com a música po­­pular que tenha muita percussão, ou o rock, não é tão fácil, porque o volume é alto o tempo todo e os sons bloqueiam os outros."

As consequências da evolução tecnológica para música não são apenas boas ou ruins, opina o professor. Mudaram os hábitos, as pessoas têm menos tempo para dedicar a longos momentos de fruição musical e a tecnologia deu um jeito de manter a música como parte da vida urbana, mesmo que ganhando mais um caráter de trilha sonora.

Além disso, há de se levar em conta que o "efeito fonográfico" de um avanço tecnológico pode va­­riar. Melo relembra que o surgimento do K7 teve impactos diversos. Na Índia, onde as gravadoras tinham monopólio musical e perpetuavam um só estilo, a fita deu voz a sonoridades diferentes, a menores custos. "Ajudou a aumentar a variedade", diz. Já no Pacífico, em Java, a diversidade do gamelão (gênero musical da Indonésia), tocado de um jeito diferente em cada vila, se desfez quando alguns grupos ganharam destaque ao serem divulgados em K7, passando a servir de modelo para os outros – e reduzindo a variedade.

As limitações técnicas acabam por criar hábitos que sobrevivem a elas. A própria duração média das músicas, entre três e quatro minutos, vem do máximo de tempo comportado nas primeiras gravações em cilindro, nos primórdios do registro fonográfico. "As pessoas se acostumaram. Depois, quando a música começou a tocar em rádio, a duração foi preservada para manter a atenção do ouvinte. É engraçado, porque a tecnologia permite hoje que se faça música de uma hora agora."

Quem sai perdendo é a criatividade musical. Mas jogar a culpa na tecnologia não se justifica mais. Se as gravadoras não querem se arriscar colocando no mercado formatos diferentes, o barateamento dos meios caseiros de gravação de áudio com qualidade profissional abriu espaço para a criatividade fluir solta novamente – e se espalhar pela internet de banda larga.

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