O famoso estilo controlador de Paul McCartney está em toda parte do bar moderninho do sul de Londres no qual o beatle recebe a imprensa para um evento promocional do lançamento de seu novo DVD - "Good evening New York City", o registro de um show em julho passado, na Big Apple. Ele se detecta em fatores tão diferentes quanto os imensos seguranças na porta do bar, o fato de todos os canapés serem vegetarianos - até os cachorros-quentes - e o aviso de que apenas sete jornalistas poderão fazer perguntas durante a sessão em que Macca falará sobre assuntos previamente combinados. E as perguntas serão as mesmas que a assessoria da gravadora Universal pedira aos jornalistas anteriormente.
Tirando o privilégio de estar numa espécie de lounge a apenas três metros de um dos maiores ícones culturais do século XX, a noite não promete, ainda mais depois de revelado que o mestre de cerimônias será Dermott O'Leary, muito mais conhecido por ser um dos apresentadores do breguíssimo programa de calouros da TV britânica "X Factor". Mas eis que Macca resolve fugir do roteiro, inclusive a parte que diz que ele não responderá a perguntas da imprensa britânica. E afirma estar pensando em sair de sua zona de conforto artística: parece ter chegado o momento de subir ao palco com o interessante projeto paralelo The Fireman, em que o rock'n'roll dá espaço a experiências eletrônicas num duo que não poderia ser mais diferente da parceria que o imortalizou.
"Já faz algum tempo que penso em fazer algo com o Fireman, e a hora chegou. Mas será preciso fazer tudo com muita calma e, especialmente, deixar claro para o público que esse show não terá nada a ver com o que ele geralmente conhece de mim", afirma o beatle
O projeto paralelo - que McCartney criou em 1993 ao lado de Youth, músico inglês de origem africana, com passagens pelo movimento punk - resultou em três álbuns. Embora tenham sido recebidos de maneira fria pelos fãs, renderam a Macca elogios maiores que os destinados a muitos de seus projetos após a separação dos Beatles. Ainda que o músico saiba plenamente que seu público mais tradicional dificilmente será convertido para a causa dos experimentos eletrônicos, especialmente os que em momento algum contam com a voz do hoje senhor de 67 anos de Liverpool, ele curte a possibilidade de mostrar o lado mais avant-garde, algo que na época do quarteto era mais atribuída ao parceiro John Lennon.
"Ninguém é como John, e nunca poderei comparar o que foi trabalhar com ele. Mas o desafio de fazer algo novo nunca me deixou. É um passo natural, agora, o Fireman tocar ao vivo. Só fico com medo de as pessoas começarem a se levantar para sair, o que não sinto desde o tempo em que os Beatles ainda tocavam em clubes pequenos do interior da Inglaterra", brinca.
O desejo de experimentalismo já está no nome do duo, inspirado por um poema do guru beat Allen Ginsberg e também no fato de os dois primeiros discos terem sido instrumentais. Mas, mesmo na parte mais tradicional da carreira, McCartney já dera sinais de um desejo de arejar o catálogo quando trouxe o produtor do Radiohead, Nigel Godrich, para cuidar do que resultou no excelente "Chaos and creation in the backyard" (1995), um de seu melhores trabalhos pós-Beatles. Porém, Macca não conseguiu se adaptar ao estilo durão de Godrich, e o álbum seguinte, "Memory almost full", já era mais, digamos, genérico.
Teria sido ótimo ouvir mais de Sir Paul sobre os planos para um momento em que a chegada dos Beatles ao mundo digital e dos videogames parece marcar o limite para as explorações do catálogo do grupo. Já serve de consolo saber que ele não pretende apenas passear pela estrada dos velhos sucessos tão trilhada por outros conterrâneos e contemporâneos. Porém, o novo DVD está longe de ser apenas mais uma explorada no filão comercial. Além de registrar um show feito por Macca no Citi Field, a arena erguida no lugar do Shea Stadium, palco de um dos mais famosos shows dos Beatles, o homem está numa forma muito melhor que em anos anteriores.
Pelo menos na versão editada de 24 minutos exibida para os jornalistas, Paul, no palco, está menos caricatural e mais gutural, e se arrisca em novas canções, inclusive números de Lennon, como "Day tripper" e "A day in the life". Ele também se mostra muito mais emocional: em "Here today", canção feita nos anos 1980 como tributo a Lennon, o velho beatle lida com dificuldades com uma letra em que revisita bons e maus momentos da convivência. A versão de "Something" puxada pelo uquelele e a princípio criada para o show-tributo feito pouco após a morte de George Harrison, em 2001, também mexe com ele.
"De certa forma, acabo revisitando todos eles, lembrando de detalhes aqui e ali das gravações, dos ensaios. Penso muito em John, George e Linda (sua mulher, morta em 1998, vitima de câncer) e é claro que tudo é muito triste, ainda que repleto de boas memórias", explica o beatle, que sai em turnê a partir de semana que vem, começando justamente em Hamburgo, na Alemanha, onde os Beatles se fortaleceram como músicos, tocando na noite local, entre 1960 e 62.
Os ingressos para esses novos shows foram vendidos em questões de horas, o que ainda é capaz de deixar Macca surpreso: "Ainda me lembro dos dias em que, com os Beatles, ficava imaginando se esse negócio de música iria mesmo dar certo", disse.
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