E quem disse que crianças não podem gostar de música clássica?, perguntava o diretor Nélio Spréa, ao fim do espetáculo Villa das Crianças. A transposição cênica dos estudos culturais de Heitor Villa-Lobos acerca do universo infantil, mais precisamente de suas pesquisas com as cirandas, de origem portuguesa, pode bem ter feito muitos pais se perguntarem a mesma coisa.
Por quase uma hora de um sábado à tarde tinha o blockbuster Peppa Pig no mesmo horário , a atriz Katia Horn e o Quarteto Pantalla envolveram uma plateia inquieta e entregaram um apanhado musical pautado por duas qualidades pouco em voga no cenário cultural como um todo: honestidade de princípios e clareza de ideias.
Na primeira base, o musical primou por se vestir de elementos simples e agregar as crianças de um jeito natural, sem excessos de mise-en-scène ou redução completa de significados. Quem esteve lá, viu a romaria de crianças que quase tomou conta do palco para cantar "Marcha Soldado" e o momento-mastigador-de-corações, quando um coro infantil surgiu cantando "Nesta Rua". Deu para contar nos dedos de uma mão o Guairinha estava lotado, transbordando os pais que não se emocionaram quando ouviram as coisas do bosque que se chamava solidão.
No segundo plano, ficou evidente a proposta de casar o mundo erudito com o andamento lúdico das cirandas, presentes de modo generalizado no imaginário cultural brasileiro. Se há quem reclame e com razão das companhias que forçam o público a interagir, neste caso, em que a música tem um caráter de apresentação de horizontes, o expediente vai bem.
E tudo funcionou na montagem da Parabolé. Da direção artística caprichada de Levi Brandão um dos maiores talentos do grupo vocal Brasileirão ao texto singelo de Nélio Spréa, a frase do menino Bruno, de três anos, definiu, de modo altissonante, Villa das Crianças: "Mãe, eu não quero ir embora". E ainda teve "Trenzinho do Caipira", de Villa Lobos e Ferreira Gullar, para fechar a turnê de afetos e pedagogias.
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