Em meados dos anos 60, existiam poucas galerias de arte nos centros urbanos brasileiros. A Bienal de São Paulo estava amadurecendo como projeto e os leilões eram os eventos de peso que movimentavam o mercado de arte no país. Mudanças mais significativas só ganharam forma a partir das duas décadas seguintes, pois, além da consolidação de algumas iniciativas importantes, como a própria bienal, profissionais de outras áreas enxergaram a arte não só como paixão, mas também como investimento.
Galeristas de destaque no período, Raquel Arnaud foi uma das principais responsáveis por contribuir para a profissionalização do mercado e a consistência da produção artística no Brasil. A sua trajetória como marchand, fomentadora de cultura e formadora de opiniões confunde-se com a história e com a evolução das artes visuais no país, o que a tornou referência para várias gerações de artistas e críticos.
Para registrar os principais acontecimentos dos seus 35 anos de carreira, foi lançado recentemente pela editora Cosacnaify, o livro Raquel Arnaud e o Olhar Contemporâneo, composto de uma entrevista cedida ao crítico Rodrigo Naves, texto de José Bento Ferreira e cronologia montada por Giovanna Milani.
A publicação pode ser considerada um dos primeiros projetos realizados para Instituto de Arte Contemporâneo (IAC), idealizado por Arnaud para ser um espaço de pesquisas e de exposições de arte. Realizado em parceria com o Centro Universitário Maria Antonia da USP (Universidade de São Paulo), o instituto deve ser inaugurado no início de 2006. "O livro é uma conseqüência dos trabalhos desenvolvidos para o IAC. Pesquisar e retomar os principais acontecimentos era necessário", explica. O material recolhido pelo livro será doado ao arquivo da instituição.
Natural de Guaratinguetá, no interior de São Paulo, Raquel Arnaud começou a conviver com as artes plásticas no ateliê do pintor Lasar Segall, pai de seu primeiro marido, Oscar. Quando o artista morreu, Raquel ajudou a sogra a catalogar as obras e acompanhou uma exposição itinerante em homenagem ao artista por diversos países da Europa.
Em 1968, quando se separou de Oscar, começou a trabalhar no Masp (Museu de Arte de São Paulo), onde deu os primeiros passos profissionais na área. Em seguida, atuou como diretora da conceituada galeria Arte Global, que pertencia à Rede Globo, e criou o Gabinete de Artes Gráficas, que, em 1980, passou a se chamar Gabinete de Artes Raquel Arnaud. "A galeria se tornou ponto de encontro de uma nova geração de artistas, colecionadores e críticos, e tinha o objetivo de analisar e divulgar a arte contemporânea", lembra.
Para Raquel, ter coerência é o mais importante para a atividade de um marchand. A falta de critérios pode devastar o reconhecimento da galeria como espaço de referência. "Batalhei muito para manter a coerência no meu trabalho. Uma laranja podre estraga as demais, então é importante ter cuidado, acompanhar e estudar a produção do artista antes de tomar uma decisão", comenta.
Por causa de sua dedicação e seriedade, Raquel trabalhou e manteve laços estreitos com artistas como Lygia Clark, Hércules Barsotti e Willys de Castro, entre muitos outros. Mesmo assim, nunca abriu mão de defender as suas opiniões e não se deixou levar pela vaidade da atmosfera artística.
Apesar das mudanças, Arnaud acredita que o mercado de arte no Brasil ainda tem uma longa jornada pela frente. "Falta solidariedade e profissionalismo a muitas galerias brasileiras. A interação de estilos, de idéias e o intercâmbio de trabalhos favoreceria muito o cenário atual", afirma.
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