• Carregando...
Selton Mello: uso quase contínuo de planos fechados e closes e Malu Mader: fascinada pelos clássicos da sessão da tarde | Fotos: Divulgação
Selton Mello: uso quase contínuo de planos fechados e closes e Malu Mader: fascinada pelos clássicos da sessão da tarde| Foto: Fotos: Divulgação

O que leva um ator a querer se tornar diretor? As respostas possíveis a essa pergunta são muitas. Da necessidade de expressão artística ao desejo de ter mais autonomia para decidir que rumos dar à própria carreira, passando, é claro, pela vaidade.

O fato é que, dentro e fora do Brasil, não são poucos os profissionais da interpretação que vão para trás das câmeras, alguns com sucesso e outros nem tanto. A reportagem da Gazeta do Povo ouviu na última semana, durante a 32ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, que se estende até a próxima quinta-feira, duas estrelas nacionais que acabam de fazer essa transição pela primeira vez – ou quase: Selton Mello e Malu Mader.

Selton, ator de tevê desde a infância e um dos nomes mais populares do cinema brasileiro contemporâneo, lança no fim de novembro o longa-metragem Feliz Natal, um impactante drama familiar escrito e dirigido por ele. Malu, protagonista de várias telenovelas, minisséries e filmes, exibiu na Mostra seu documentário de estréia, Contratempo, dirigido em parceria com a cineasta Mini Kerti. Em ambos os casos, o intuito de dirigir parece ter ido além do mero diletantismo, do "querer fazer algo diferente". Ambos gostaram muito da experiência e desejam repetir a dose.

"Sou um ex-ator em crise, tentando se encontrar." Assim Selton Mello se definiu para uma platéia atenta que compareceu ao debate sobre atores-diretores promovido pela Mostra no Espaço Unibanco Augusta e mediado pelo crítico de cinema Rubens Ewald Filho. "Percebi que há anos venho cuidando muito bem de meus personagens e esquecendo de cuidar de mim. A profissão de ator não tem me estimulado, resolvi dar um tempo."

Essa insatisfação soa incrível vinda do astro de campeões de bilheteria, como O Auto da Compadecida, Lisbela e o Prisioneiro e Meu Nome Não É Johnny, e dos filmes cult Lavoura Arcaica e O Cheiro do Ralo. Mas faz sentido diante da urgência de Feliz Natal.

Fantasmas do passado

O primeiro longa de Selton, que já havia dirigido curtas e videoclipes, é uma obra extremamente autoral e nem um pouco digerível para o paladar médio. Conta a história de Caio, um ex-presidiário (Leonardo Medeiros, com quem Selton contracenou em Lavoura Arcaica), preso por homicício, que vai passar as festas de fim de ano com a família. O retorno do filho pródigo, embora desejado, revela-se traumático por desenterrar antigos traumas e ressentimentos.

A mãe de Caio (Darlene Glória) é dependente de álcool e barbitúricos, separou-se do marido (Lúcio Mauro), que mora com uma mulher muito mais jovem, numa relação mantida à base de viagra e favores financeiros. O irmão do protagonista (Paulo Guarnieri) é bem-sucedido, mas vive um casamento tumultuado com a mulher (Graziella Moretto), que tem pelo cunhado um sentimento mal resolvido. Isso se torna evidente com o retorno de Caio.

Fotografado por Lula Carvalho (filho do cineasta e diretor de fotografia Walter Carvalho), Feliz Natal foi rodado em formato cinemascope, ocupando toda a extensão da tela, e faz uso quase contínuo de planos fechados e closes dos personagens, o que gera um certo incômodo no espectador, forçado a ver os personagens muito de perto, quase demais.

Indagado pela reportagem a respeito dessa opção estética, Selton disse que sua intenção foi ressaltar a solidão dos personagens, investigá-los em sua dor e incapacidade de comunicação.

"Sei que fiz um filme imperfeito, com qualidades e defeitos. Mas é o longa que eu desejei fazer. Isso não quer dizer que tudo que eu fizer terá esse tom. Não me limito como ator e não vou me limitar como diretor", diz, citando como influências o cinema argentino de hoje, focado em personagens da classe média e feito por cineastas como Lucrécia Martel e Pablo Trapero.

Sessão da Tarde

Aos 42 anos, Malu pensa que, sem saber, se preparou para virar diretora desde a infância. "Assisti aos clássicos do cinema na Sessão da Tarde, sempre quis saber como os filmes eram feitos, mas também via, da mesma forma, as novelas, os programas de que gostava. Quando cheguei à adolescência, o caminho que encontrei foi cursar o Tablado [escola teatral criada no Rio de Janeiro por Maria Clara Machado]. Nenhuma menina pensava em ser diretora. Fui ser atriz", conta.

Estimulada pelo documentarista João Moreira Salles (Santiago), Malu transformou em filme sua experiência trabalhando com jovens cariocas carentes e em situação de risco que buscam uma saída da criminalidade por meio da música.

Como não tinha experiência por trás das câmaras, Malu recorreu à diretora Mini Kerti, sócia da produtora Conspiração Filmes. A união deu certo. "Não saberia dizer o quanto foi decidido por mim e o quanto foi resultado das escolhas da Minie. Não sou controladora. Negocio bem as concessões", diz. "Depois de fazer o filme, fiz o caminho inverso: fui estudar cinema. Fazer cursos, aprender mais teoria. Cheguei à conclusão que é isso que desejo fazer da vida. Dirigir."

O editor do Caderno G viajou a convite da organização da Mostra.

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]