O Festival de Teatro de Curitiba terminou sua edição de 2006 com um sinal de alerta. Representantes da imprensa de todo o Brasil redigiram um manifesto pedindo mudanças no formato da mostra paralela, o Fringe, responsável por mais de 90% dos espetáculos apresentados a cada ano no festival. De acordo com o documento, a mostra está inchada e contém muitas montagens de baixa qualidade, diminuindo o interesse pelo conjunto do que é exibido. O documento foi entregue à organização do evento na sexta-feira.

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"Há uma certa sensação de frustração", afirma Valmir Santos, repórter da Folha de S. Paulo e um dos signatários do manifesto. "O público fica frustrado, os artistas também. E até a imprensa sai frustrada", diz. No documento, os 17 jornalistas que assinam o texto apontam não só o possível "esgotamento" do formato atual como dizem que neste ano, ao contrário do que acontecia em edições anteriores, não foi possível para a crítica encontrar no Fringe um espetáculo que se destacasse, que merecesse atenção especial. Nenhuma montagem reunia qualidades para tanto.

O Fringe foi criado em 1998, seis anos depois da Mostra de Teatro Contemporâneo. Contava com 32 peças. Enquanto a mostra mais antiga traz espetáculos de fama consolidada, feitos por companhias de renome, o Fringe nasceu como um espaço democrático. Não há curadoria nem qualquer tipo de seleção prévia: desde que respeitem exigências mínimas de profissionalismo, todos os espetáculos são incluídos na grade.

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"O problema é que são 200 peças mas só umas 40 valem ser assistidas", afirma Beth Néspoli, crítica de teatro de O Estado de S. Paulo e outra signatária do manifesto. Segundo ela, mesmo nos anos em que os jornalistas conseguiram apontar grandes destaques no Fringe, como Por Elise e Hysteria (na edição de 2005), isso não era um aval a toda a mostra paralela. "Tem coisas que chegam ao festival e que são simplesmente toscas", comenta. Ela aponta o espetáculo carioca Anti Cabaré da Cia. como um exemplo de espetáculo que não poderia estar um evento deste porte.

Vítor Aronis, diretor do festival, recebeu o documento elaborado pelos jornalistas, mas ainda não deu uma resposta oficial sobre o pedido de diminuição do Fringe. Segundo ele, essa é uma crítica recorrente – embora seja a primeira vez em que ela tenha sido formalizada. "Não acredito que reduzir o Fringe seja uma boa idéia", afirma Aronis. Apesar disso, ele acredita que ainda seja necessário pensar mais sobre o assunto e discutir a proposta dos jornalistas com mais gente.

Gralha Azul

Pela primeira vez incorporado à programação do Festival de Teatro de Curitiba, o Troféu Gralha Azul foi entregue na noite de sábado, em uma festa no Clube Concórdia. A grande vencedora da noite foi Capitu – Memória Editada, dirigida e escrita por Edson Bueno. Baseada no romance Dom Casmurro, de Machado de Assis, a montagem levou os prêmios de melhor espetáculo adulto, melhor texto e direção. Entre as infantis, a vencedora foi O Cirandeiro, da Almazen Teatro de Bonecos, dirigida por Gil Gabriel.

Para Edson Bueno, o prêmio teve gosto especial por ter sido a primeira vez em 26 anos de existência do troféu que um júri nacional participou da escolha da melhor peça. "Isso dá a sensação de que você realmente fez um espetáculo muito bom", diz.

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Bueno, que neste ano participou do Fringe com a estréia Toda Nudez Será Castigada, aproveitou para corroborar o manifesto dos jornalistas. "O Fringe está mesmo grande demais. Nós mesmos, que somos os maiores interessados em acompanhar o festival, não sabemos o que ver, de tanta peça que entra na mostra", afirma. Além disso, segundo ele, a presença de muitos espetáculos – alguns sem a qualidade desejada, de acordo com o diretor – acaba tirando a visibilidade dos trabalhos mais bem feitos. "Eu estava com um texto do Nelson Rodrigues, por exemplo, e tive pouca atenção da crítica, porque a peça cai nesse balaio gigante", comenta.

Capitu, como parte do prêmio, terá direito a uma nova temporada no Teatro José Maria Santos a partir da semana que vem. Leia ao lado a lista completa de premiados.