Digam o que quiserem, mas existe um modo de ser curitibano, ou melhor, um modo curitibano de ser, adotado inclusive por pessoas que não nasceram na cidade, mas nela vivem. O que antes era apenas uma impressão, um palpite sobre as características que definem o habitante da capital paranaense em relação a hábitos e preferências culturais, agora virou estatística.
O Caderno G elaborou sete perguntas a fim de traçar um perfil ou talvez uma silhueta dos consumidores de bens culturais que vivem em Curitiba. O questionário foi aplicado pelo instituto Paraná Pesquisas entre os dias 15 e 17 deste mês. Setecentas pessoas participaram. O resultado justifica o título desta matéria pois a vida cultural que existe é minúscula. Um microorganismo.
Basta dizer que sete de cada dez pessoas que vivem em solo curitibano não freqüentou nenhum evento cultural nem sequer um cineminha nos últimos três meses. São 90 dias sem arredar os pés de casa, aliás, o local preferido dos entrevistados.
Quando dispõe de tempo livre, quase 50% preferem assistir a um DVD no sofá da sala (ou na cama, dependendo de onde a aparelhagem estiver instalada) do que ir ao cinema (26%), ou a um show (14%). Exposições, teatro e circo, nessa ordem, também perdem para o que pode ser definido como "diversão indoor", ou dentro de ambientes fechados.
Míseros 1,5% gostam de ver televisão quando não têm o que fazer dado que se imaginava maior e que revelava uma certa intolerância à programação dos canais (abertos e pagos, a pesquisa não diferencia uns dos outros).
Ver que 22% optam por ler livros é algo extraordinário. Isso significa, em tese, que Curitiba tem qualquer coisa como 400 mil leitores. E não é de gibi, não. É de livro. Um número impressionante em um país de não-leitores, com mais editoras que livrarias e todo o blablablá que se ouve há tempos.
Faz-me rir
A julgar pelos dados levantados na pesquisa, dinheiro o popular "faz-me rir" é um fator determinante para o consumo de bens culturais. Para não dizer o fator determinante.
Na escolha do que fazer, o que mais influencia o público é o preço do evento, seja ele qual for fato apontado por 41% dos entrevistados. O apelo do que se pretende ver vem em seguida, com 34%. Conforto e localização estão quase empatados, com 27% e 24%. É o equivalente a dizer que, em Curitiba, quase não se sai de casa, mas quando alguém resolve sair, quer tudo fácil. Mamão com açúcar.
Essa postura se confirma no item "O que o ajudaria a ter uma vida cultural mais intensa?". No topo da lista, ele de novo: dinheiro (ingressos mais baratos), seguido do supervalorizado conforto (espaços mais próximos de sua casa). Lá em baixo, no fim da lista, aparecem 3,2% de indiferentes, indivíduos para os quais não há nada que possa levá-los a cogitar uma ida ao teatro no fim de semana. O teatro aqui, é só exemplo. Essas pessoas admitem não se interessar por coisa nenhuma.
Orçamento
A maior discrepância entre respostas aparece na questão sobre a possibilidade de se contabilizar a cultura e a diversão no orçamento do mês. Colocar na lista de despesas "Luz", "Água", "Telefone" e "Duas entradas para o show da banda tal". Ou ainda "Tantos reais para torrar na livraria".
Em um massacre, 76% responderam que "gastam na medida do possível". Diante das dificuldades enfrentadas pela classe média brasileira maioria no público que consome produtos culturais , com seu poder aquisitivo reduzindo ano a ano, dizer que "gasta na medida do possível" é quase como admitir que não gasta nunca. Ou raramente (daí os 90 dias sem freqüentar eventos).
Na mesma questão, 12% disseram "contabilizar" os gastos com cultura e lazer, e 11,3% responderam na lata que não gastam nada, nem um centavo, em cultura.
Isso confirma a noção de que produtos culturais, normalmente relacionados à idéia de diversão, são os primeiros sacrificados quando o dinheiro acaba. O problema é que se vive em um país onde a grana evapora com freqüência.
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