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"Meu andar inteiro é de passos marcados/ O andar cansado de quem vive só/ Levantar o pó dos velhos caminhos/ Em minha garganta o nó/ De viver sozinho/ Meu peito inteiro é choro desprezado". Sem ouvir a música que embala os versos, ninguém diria que se trata de uma banda de punk-rock. Mas essa é justamente a fórmula do Pelebrói Não Sei?, um dos grupos mais populares do cenário musical curitibano. Ativo nos palcos locais desde 1997, o quarteto combina a urgência e o senso de humor punk com textos acima da média. "Culpa" do vocalista Oneide DeeDiedrich, um psicólogo que não consegue ficar longe do mundo do rock.

Quando não está clinicando, Oneide canta as neuroses universais sobre bases simples e barulhentas, já registradas em três CDs (o mais recente, Aos Farsantes com Carinho, chegou há pouco às lojas). Natural de Toledo – mas criado em Foz do Iguaçu e na cidade paraguaia de Santa Rosa –, o cantor/doutor de 31 anos falou sobre a banda e suas próprias neuras com a reportagem do Caderno G. Confira a seguir o melhor do bate-papo.

O Pelebrói Não Sei? tem um público fiel e relativamente grande para uma banda local que toca repertório próprio. O que há de diferente na comunicação que vocês estabelecem com os fãs?

Oneide DeeDiedrich – O que rola nos shows é algo da ordem de uma comunhão. É uma coisa de conquistar quem está parado. Eu olho no olho, chamo para perto. Sempre penso em como entrar em contato com aquela galera que está ali. Além disso, há a questão de a gente lidar com coisas neuróticas que todo mundo passa. Outro ponto é você ser autêntico. Eu não preciso dessa distância entre o público e o músico. Não preciso me esconder atrás do palco antes de tocar. Esse é um clichê do rockstar, mas eu vejo bandas que estão há dois meses por aí e já querem comprar um avião. Talvez a gente seja diferente porque veio do interior, onde todo mundo recebe você bem, quer que você participe das coisas. No interior, ninguém admite ser incompreendido, então chega junto do outro para explicar direito qual é sua idéia.

Também chama a atenção o fato de que o público é bem variado...

Você deve ouvir vários tipos de música, não pode ser restritivo. O que é restritivo tende a morrer. Porque o público, com o tempo, vai saindo, vai fazendo outras coisas. Vira crente, casa, muda de cidade... Se você se restringir a um tipo de gente, de franja, de tênis, uma hora isso acaba. A idéia é mostrar o som para quem normalmente não iria ao nosso show. Por isso a gente sempre se meteu a tocar com qualquer tipo de banda.

Você já chegou a dizer que o seu discurso é a psicanálise. Explique melhor.

Depois de um tempo fazendo análise, freqüentando seminários e grupos de estudo, você passa a ver as coisas a partir desse filtro. Nesse terceiro CD, as letras já têm algumas coisas teóricas. Por exemplo: antes de gravar o disco, passei um ano e pouco estudando o seminário da Transferência, do Lacan (Jacques Lacan, psicanalista francês que fez uma releitura do trabalho de Freud). É um seminário sobre o amor, e isso me levou a escrever a letra de "Sobre o Amor e Não Existir", que traz uma visão psicanalítica.

Falando assim, até parece que se trata de uma banda "cabeça". Mas o humor é um elemento importante no conceito do Pelebrói, não?

O humor mais cínico é um ponto muito forte na convivência da banda, no jeito de a gente tirar um sarro da cara do outro. E as letras têm aquela coisa do sorriso amarelo, meio constrangedor. Algumas são mais agressivas, mas é tudo muito velado. Como a música "Requiém para Doris". É sobre abandono e suicídio, mas não deixa de ser engraçada. Também é um jeito de questionar a nossa mediocridade, uma forma vazia de viver...

Você já teve algum paciente que virou fã, e vice-versa?

Eu evito ao máximo essa ligação. Mas era um problema muito maior para mim, hoje não é mais. Foram muitas horas de análise para trabalhar essa divisão entre roqueiro e psicanalista. Era um ponto neurótico meu. Eu pensava: "E quando as duas coisas se encontrarem?". E acabaram se encontrando. Teve uma ocasião em quem fui tocar num bar e encontrei uma paciente. Fiz o show totalmente constrangido e, na semana seguinte, achei que ela não voltaria ao consultório. Mas voltou e disse que gostou muito, que aquilo até foi positivo para ela. Disse também que imaginava que eu poderia ser qualquer coisa, até padre, menos roqueiro.

O que, especificamente, angustiava você?

A angústia estava naquele ideal que você tem de si mesmo. Eu estava numa de "ter de ser". E "ter de ser" arrebenta qualquer um. Era uma questão de "ou você é isso, ou você é aquilo". Hoje penso que posso ser psicólogo, posso ser músico. Isso agrega valor, ao invés de tirar.

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