"Não gosto de teatro". A afirmação em tom provocativo é do cineasta e diretor teatral Paulo Biscaia. Como toda a brincadeira tem um fundo de verdade, não é de surpreender que este seja um dos motivos que o fazem mesclar elementos de linguagens como cinema e história em quadrinhos à poética teatral de suas montagens. "Gosto de me colocar na posição da platéia. A maioria das peças está estagnada, é preciso reencontrar o teatro. Escolhi uma entre diversas maneiras de se fazer isso", explica.
Graphic, que estréia hoje no Teatro da Caixa, é um amadurecimento da pesquisa que Biscaia e sua companhia, a Vigor Mortis, iniciaram com a peça Morgue Story Sangue, Baiacu e Quadrinhos, que recebeu o Troféu Gralha Azul de 2004 em diversas categorias. Pouco depois, o diretor leu o livro Desvendando os Quadrinhos, de Scott McCloud, e percebeu inúmeras outras formas de ampliar ainda mais a percepção gráfica em suas peças.
Os três personagens de Graphic são artistas insatisfeitos com seu trabalho. Artie (leandrodanielcolombo, que assina assim mesmo, tudo junto e com minúsculas) desenha manuais de instruções, Becca (Carolina Fauquemont) é uma executiva de finanças que vive em meio a gráficos financeiros e Raf (Rafaella Marques) é uma artista de rua que trabalha com estêncil. O trio vai disputar uma vaga para o trabalho ideal: desenhista de quadrinhos de uma grande editora. A angústia e o desejo de conseguir o emprego dos sonhos são grandes a ponto de gerar conseqüências nefastas, como a morte de um dos personagens. O caso recente de uma estagiária de São Paulo que, para permanecer no emprego, matou duas pessoas, foi uma das inspiração do diretor.
Para entender o processo criativo de um desenhista em quadrinhos, a equipe participou de um curso com o quadrinhista local DW. "Queria que os atores compreendessem os conceitos desta linguagem, que tem seus próprios códigos. Foi como um japonês aprender português", brinca o diretor. Os personagens apropriaram-se dos traços de cinco artistas convidados: José Aguiar desenhou os manuais de inscrição de Artie, DW desenvolveu os gráficos financeiros de Becca e os especialistas em estêncil Juan Parada, Claúdio Celestino e Olho fizeram as obras de rua de Raf. Os desenhos são projetados em vídeos criados por Biscaia.
Para criar a atmosfera de opressão típica de um ambiente urbano, o cenógrafo Guilherme Santana criou uma cidade sem nome, que pode ser qualquer uma, em imagens projetadas nos vídeos. Para compor a trilha sonora, Biscaia escolheu as músicas "visuais" da banda Talking Heads, cujos integrantes já foram artistas plásticos.
Serviço: Graphic. Teatro da Caixa (R. Conselheiro Laurindo. 280), (41) 2118-5233. Texto, vídeos e direção de Paulo Biscaia Filho. Com a Companhia Vigor Mortis. Hoje, às 21 horas. Ingressos a R$ 10 e R$ 5 (funcionários e clientes da Caixa, estudantes e idosos). De quinta a sábado, às 21 horas, e domingo às 19 horas. Até 5 de novembro.
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