Alejandro González Iñárritu recrutou um grande elenco de estrelas para sua comédia de humor negro Birdman, favorita ao Oscar de melhor filme. Iñárritu é autor de dramas elogiados, como 21 Gramas, Babel e Biutiful, e admite que, ao fazer Birdman, saiu da própria zona de conforto e adentrou território inexplorado. E adorou cada minuto da experiência. Confira a entrevista:
Quando você teve a ideia para o filme?
Há uns cinco anos, estava entretido com a ideia de um cara que luta com o próprio ego no espelho, com a própria imagem. Era um personagem de outro projeto que eu estava desenvolvendo. Então, a ideia de fazer uma coisa com o ego foi o princípio.
Como isso resultou no personagem?
Convidei o Nicolás Giacobone, o Armando Bo e o Alexander Dinelaris, que é meu amigo. Encontrei-me com eles em Nova York. Contei a eles a premissa básica, o que eu queria fazer, e eles gostaram, então começamos a trabalhar juntos. Tivemos reuniões em Nova York, às vezes no México, às vezes em Los Angeles, várias vezes, durante períodos, e usamos muito o Skype. Foi um processo longo, mas muito bom. Acho que foi uma das parcerias de autoria mais excitantes que já tive. Foi realmente muito bom, sem problemas de ego. A gente só se preocupou em escrever. Rimos muito. Foi absolutamente fantástico.
Quando teve a ideia do Birdman como alter ego de Riggan Thomson?
Acho que houve um momento em que brincamos com a ideia de ele ser um ator antigo, com uma voz de alter ego de teatro, mas, por algum motivo, o resultado pareceu antiquado. O Alexander Dinelaris escreveu algumas peças de teatro independente, e acho que ele, o Nicolas e o Armando não gostaram da ideia, então um dia, de repente, pensei que esse alter ego deveria ser o Birdman, um super-herói. Quando fiz essa descoberta, já tínhamos um rascunho com a voz antiga, mas eu gostei disso porque, de certa forma, remete à época que estamos vivendo. A voz realmente transmite o que estamos enfrentado atualmente, que é toda essa bela porcaria de entretenimento corporativo mundial, e acho que aquele foi um belo relacionamento para todos nós. Ficamos muito empolgados. Foi exatamente nesse momento que pensei: 'Ah, tudo bem'. A maneira com que encontramos aquela voz é que foi importante para que o resultado fosse um pouco mais contemporâneo.
Quais eram os temas deste projeto no seu ponto de vista?
Acho que, quando se é um artista, a única responsabilidade é conversar sobre as circunstâncias, ou o contexto, de certa forma, e ser honesto quanto a isso. Através das circunstâncias e do contexto em que eu tenho vivido, senti-me confortável e desconfortável para falar sobre ego. Para mim, foi uma maneira de explorar aquele território, que pode ser fascinante, pode ser constrangedor, pode ser muito contraditório. O que eu quero dizer é que, para mim, foi uma forma de falar sobre o que eu vivi. Mas, durante esse tempo todo, o grande desafio do que eu e todos nós estávamos tentando fazer foi manter muita sinceridade na voz do personagem.
Esse filme não é realmente sobre o trabalho de um ator. Você concorda?
Tive medo de que alguém pensasse que é um filme sobre o processo de interpretação do ator, que, sinceramente, não me interessa nem um pouco. Atores são as figuras mais escolhidas para representar o ego, mas acho que todo ser humano tem ego; em sua maioria políticos, malditos diretores de empresas e ditadores. O mundo está se tornando vítima do ego do espírito humano, e acho que qualquer pessoa, qualquer criança, pode se tornar vítima do próprio ego. Espero que todo mundo saiba absorver essa ideia, de que o ego é perigoso, pois pode nos dar força e nos matar em um segundo e, se lhe dermos poder, é um terror. Pode ser insano.
Por que Michael Keaton era o ator certo para esse papel?
O motivo por que o Michael conseguiu interpretar esse papel da forma com que o interpretou, ou seja, despido de tudo fisicamente e emocionalmente, é que ele está acima de tudo isso. Nunca vi um ator mais sem vaidade do que ele. É uma das pessoas mais autoconfiantes que já conheci. Ele não tem medo do que as pessoas vão dizer. Ele não deixa ninguém dizer quem ele é. Foi por isso que ele conseguiu: porque ele consegue olhar para tudo isso de cima e rir, e realmente explorar a situação sem nenhum envolvimento pessoal, e isso foi fascinante.
O envolvimento dele com os filmes do Batman teve alguma influência na sua decisão?
Sim. Ele sempre foi um candidato forte, então pensei: 'É perfeito'. Não só por causa da autoridade e do passado que ele tem, mas também porque ele é um dos poucos atores que realmente conseguem passar da comédia para o drama em um segundo, e isso é muito difícil. E ter carisma é difícil! Ser um sujeito desagradável, como é o personagem que ele interpreta e, ainda assim, ter carisma, é difícil.
Qual foi o motivo das tomadas tão longas que você usou no filme? Dá a impressão de ser uma única tomada, e deve ter exigido muito planejamento...
Eu quis fazer assim desde que tive a ideia toda. Queria que fosse o ponto de vista do personagem. Queria que as pessoas sentissem essa experiência tortuosa, claustrofóbica e inevitável do encontro dele com a própria mediocridade. Eu queria isso, e a melhor maneira de fazer foi com a câmera posicionada radicalmente no ponto de vista dele. Então eu tinha a ideia, o conceito, mas fazer acontecer é muito difícil. Tivemos que aprender todo o processo a partir do zero, porque eu nunca havia trabalhado desse jeito. Foi uma experiência aterrorizante, irresponsável. Pensei que estava fazendo um filme muito experimental, porque o desafio era não termos um espaço e fragmentação do tempo, que é a verdadeira natureza do filme, foi assim que eu fiz a vida toda, e nunca precisei contar isso tanto quanto agora. Sem essas coisas, é como escrever texto sem pontos nem vírgulas. Sem essas ferramentas divisórias, é muito difícil encontrar o ritmo interno, a congruência e as ligaduras, daí eu tenho que moldar e encontrar a realidade por meio do ensaio, da prática. Tudo foi concebido, imaginado antecipadamente.
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