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Números

50 salas foi o número de cinemas brasileiros em que o filme estreou.

110,6 mil espectadores é o público acumulado por O Passado no Brasil.

Outubro de 2007. Em um momento no qual só se falava do filme-fenômeno Tropa de Elite, abriu-se espaço na mídia cultural brasileira para um outro longa-metragem com DNA nacional, embora falado em espanhol: O Passado. O mais recente trabalho de Hector Babenco, que vinha do enorme sucesso de Carandiru, responsável por levar 5 milhões de espectadores às salas de exibição, estreava cercado de expectativas. Tinha à frente do elenco um astro internacional em ascensão, o mexicano Gael García Bernal; havia sido escolhido como o título de abertura da 31.ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo; e ganhava páginas inteiras dos principais jornais e revistas do país, recebendo críticas quase todas bastante positivas. Nada disso, contudo, lhe garantiu seu sucesso comercial.

Em quase um mês de exibição, O Passado não é exatamente um fracasso de público. Fez, até a semana passada, 110,6 mil espectadores – uma cifra até razoável para os padrões do cinema brasileiro. Esse número, no entanto, empalidece diante do orçamento do filme, R$ 5,5 milhões, uma soma bastante significativa levando em conta que Carandiru, longa anterior de Babenco, custou perto de R$ 12 milhões (incluindo custos de divulgação e marketing), mas atraiu dez vezes mais pessoas.

Para se ter uma idéia, O Passado, em apenas sua quarta semana de exibição, apenas pode ser visto em Curitiba numa única sessão: às 17h30, no Cinesystem Cidade. E só. Qual seria, então, os motivos do relativo fracasso do filme, em vários aspectos superior a Carandiru?

O Caderno G conversou com críticos de cinema para discutir as razões por trás dessa relativa frieza com a qual O Passado foi recebido pelo público brasileiro. Para José Geraldo Couto, da Folha de São Paulo, que deu ao longa de Babenco a cotação de "ótimo", as expectativas em relação à produção talvez tenham sido otimistas demais, já que se trata de uma história intimista, falada em espanhol, sem final feliz ou fórmulas hollywoodianas, o que costuma prejudicar também a recepção de bons filmes argentinos (e de outras proveniências) que padecem desses mesmos "problemas".

O Passado, embora tenha sido beneficiado por prêmios de incentivo brasileiros, como o da Petrobrás, é uma história argentina. Baseado no romance do escritor Alan Pauls, conta a atormentada história de um casal, Rimini (Gael García Bernal) e Sofia (Analia Coycero), que se separa depois de 12 anos de união. Amigos de infância, os laços que os unem são profundos e, quando desatados, geram conseqüências distintas. Enquanto ele tenta dar continuidade a sua vida, envolvendo-se com outras mulheres, ela não supera a perda e se transforma em uma espécie de fantasma na vida de Rimini, o assombrando durante anos a fio, chegando a quase destrui-lo.

Segundo o gaúcho Marcus Mello, editor da revista especializada em cinema Teorema, "O Passado é um filme intimista, duro, impregnado por aquele sentimento de melancolia típico dos portenhos (habitantes de Buenos Aires), com o qual o espectador brasileiro está pouco habituado". Mello ressalta ainda que as platéias de cinema, são formadas em sua maioria por casais. "O fato de o filme ser um dos mais sombrios já feitos sobre o casamento e as suas dificuldades acaba tornando a sua visão uma experiência no mínimo incômoda para aquelas pessoas que saem de casa apenas em busca de diversão."

Público

Saber o que o público quer assistir é sempre um exercício de adivinhação, sobretudo quando o assunto é cinema nacional. Enquanto os blockbusters chegam ao mercado brasileiro escorados por campanhas de marketing milionárias, iniciadas meses antes do lançamento, produções mais modestas – e com maior valor artístico – dependem mais de fatores como boas críticas e boca-a-boca positivo.

O crítico carioca Rodrigo Fonseca, de O Globo, afirma que "o mercado cinematográfico está enfrentando uma reestruturação que nenhum analista (ou cineasta) entendeu direito. Não é só no Brasil. É no exterior também. Inclusive nos EUA". O filme de Babenco, no entender do jornalista, se integra à tradição dos melodramas que não costumam ser atrativos imediatos de platéia.

"As telenovelas, que seguem uma cartilha similar, esgotam um pouco o filão. No caso de O Passado, em suspeito que ele teve um desempenho coerente com a média de público dos filmes argentinos", supõe Fonseca, levantando a hipótese de que o longa de Babenco tenha sido lançado como um filme brasileiro de porte, com 50 cópias, mas se comportado no mercado como uma produção argentina, atraindo um (bom) público seleto.

A respeito do comportamento da platéia brasileira, José Geraldo Couto, reforçando a posição de Rodrigo Fonseca, diz que é muito difícil saber de antemão o que as pessoas querem. "Por exemplo, quando o longa Cidade dos Homens não obteve o sucesso esperado, uma das explicações aventadas foi a de que o público estava cansado de filmes de violência ambientados na favela. Mas depois veio Tropa de Elite e desmontou essa tese", argumenta.

A instabilidade do mercado cinematográfico atual também é apontada por Marcus Mello, da Teorema. Ele lista alguns fatores conjunturais que podem colaborar para o fracasso de um filme: a violência urbana, que mantém as pessoas dentro de casa, o preço dos ingressos e a expansão do mercado de DVD.

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