Há quem cobre do cineasta norte-americano Quentin Tarantino "conteúdo", "reflexão". Trata-se de uma demanda conservadora: o diretor de Pulp Fiction Tempo de Violência e Bastardos Inglórios tem muito a dizer, mas, para compreendê-lo, é preciso analisar sua obra formalmente.
Se o diretor não tem, aparentemente, o desejo de discutir as mazelas do mundo, questões existenciais ou a relação entre os seres humanos, seu cinema exuberante, verborrágico e embotado de sentidos, revela um criador inquieto, disposto a falar de cinema e de cultura pop. Só não vê (e ouve) quem não quer.
Bastardos Inglórios, que chega nesta semana às locadoras, é uma obra-prima da metalinguagem. "Comete" o delito de reescrever a história da Segunda Guerra Mundial, valendo-se de um delírio magistralmente executado. Fala do cinema como força redentora, espaço do impossível ele é capaz de matar Adolf Hitler, de derrubar o Terceiro Reich. E pelas mãos de um pelotão de oficiais judeus que jamais existiu, cuja missão é assassinar e arrancar o couro cabeludo de nazistas. No comando, o fanfarrão tenente Aldo Raine (Brad Pitt, em atuação impagável).
Épicos
Na fórmula dessa fantasia ele mistura os épicos de montanha de Pabst e estrelados por Leni Riefenstahl, a diretora do documentário nazista O Triunfo da Vontade. Também recorre aos westerns spaghetti de Sergio Leone, presente na trilha sonora, recheada de temas de Ennio Morricone, e nas cenas de ação e violência, gráficas, estetizadas e coreografadas com o uso de câmera lenta, de sangue falso e farto. Também revisita o cinema noir de Jacques Tourneur, diretor francês da primeira versão de Cat People, filme clássico homenageado tanto na figura vingativa e totalmente femme fatale da sobrevivente Shosanna Dreyfus (a revelação Mélanie Laurent) dentro da sala de projeção do cinema quanto no tema cantado por David Bowie, extraído da trilha do remake anos 80 de Paul Schrader, A Marca da Pantera.
Encarnação do mal
E o que dizer do coronel Hans Landa, personagem extraordinário, à altura do Vincent Vega de John Travolta, defendido com maestria pelo austríaco Christoph Waltz, favorito ao Oscar de coadjuvante? Ele é a encarnação do mal, da manipulação, mas ao mesmo tempo sedutor, o que o torna ainda mais aterrorizante.
Fato: Tarantino está melhor, mais maduro e mais surpreendente como criador. Ainda que seus longas sejam aparentes brincadeiras autorreferenciais sem consequência. Fez um dos grandes filmes de 2009.
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