Os cabelos estão brancos, mas a voz ficou mais intensa. A produção literária não é vasta, mas a escrita ganhou densidade. Quem pensa que a chegada dos 60 anos é sinônimo de aposentar as chuteiras está precisando se atualizar sobre os últimos acontecimentos do planeta pop, só para citar um exemplo dentre vários do universo artístico.

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"Bob Dylan está na crista da onda", afirma o jornalista Roberto Muggiatti, de 68 anos, tradutor de mais de 50 livros e autor de outros 13, muitos deles sobre rock e jazz. Dylan, de 65 anos, passou cinco anos sem gravar e, de repente, lançou um disco com título significativo: Modern Times, que arrancou elogios da crítica especializada e rendeu verdadeiros dossiês sobre o músico em revistas como a americana Rolling Stones e a inglesa Mojo.

Acostumado a unir habilidade artística e contestação nas músicas engajadas que compunha com Joan Baez, nos anos 60, Dylan não abandonou de vez a veia militante. O novo álbum expressa a visão do cantor sobre os "tempos modernos". As tragédias de responsabilidade humana, como o 11 de Setembro, ou meteorológicas, como o furacão Katrina, ganham menções indiretas, porém enfáticas.

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Na mundo da arte, o avanço da idade parece não ser empecilho para boas produções. Pelo contrário. O escritor potiguar Pablo Capistrano, de 32 anos, autor de Pequenas Catástrofes, fortemente influenciado por referências setentistas, compara os artistas ao vinho, que, como todos sabem, ganha mais corpo e sabor ao longo dos anos. "O trabalho artístico envolve os aspectos mental, espiritual e emocional. É diferente do esporte, por exemplo, em que o aspecto físico é mais relevante", afirma.

Não poderia haver melhor comparação que o vinho para esse rol de artistas sobreviventes dos loucos anos 60, que seguiam à risca a célebre frase do grupo The Who, "quero morrer antes de ficar velho". Embalados por sexo, drogas e rock-and-roll, esta geração viveu intensamente (e sem tempo de temer a morte) a liberação sexual, o movimento hippie, a contracultura e, no caso do Brasil e de outros países latino-americanos, a resistência à ditadura. Para Capistrano, a produção atual de dinossauros como Paul McCartney, Patti Smith e Ozzy Osbourne é positiva, mas contradiz o que essa geração preconizava. "A autocrítica que esses artistas tiveram de fazer para seguir em frente deve ter sido muito dolorosa", reflete. Mugiatti prefere atribuir essa retomada ao "acaso" e a "fatos da vida". "John Lennon não teve a chance de mostrar seu vigor aos 60 anos, ao contrário de Paul McCartney. Na verdade, o que segura essas pessoas é a arte", opina.

Realmente, pode-se dizer que a arte salvou a vida da roqueira Patti Smith, que esteve recentemente no Brasil para uma temporada de shows ao lado de garotões como os integrantes moderninhos do Yeah Yeah Yeahs e dos nem-tão-novos-assim Beastie Boys. Ela participou do surgimento do punk rock em Nova Iorque, em meados dos anos 70. Viveu a efervescência cultural da cidade ao lado do fotógrafo bissexual Robert Mapplethorpe, com quem foi casada. Após lançar quatro álbuns – entre eles os antológicos Horses (1975) e Radio Ethiopia (1976) – casou-se com o guitarrista Fred "Sonic" Smith, da banda MC5, e passou 15 anos vivendo num subúrbio de Detroit, criando os dois filhos e curtindo a vida doméstica. Em 1994, após a perda do marido, do irmão Todd, do amigo Mapplethorpe e dos pais, encontrou na volta aos palcos a força para se recuperar.

Foi recebida calorosamente pelos fãs e por um público jovem, que até há pouco tempo nunca tinham ouvido falar nela. "Estou ficando velha e meu cabelo está grisalho. Mas com certeza minha voz está mais forte agora. Acho que estou mais confiante, saudável e, obviamente, a tecnologia de som está mais desenvolvida. Quando ficamos velhos, perdemos algumas coisas e ganhamos outras. Eu hoje sei que tenho muito mais confiança e gosto para me comunicar com as pessoas", declarou a cantora em entrevista concedida ao Caderno G, pouco antes de tocar no TIM Festival, no mês passado.